Encontros em hotéis e um pequeno almoço decisivo: como Meloni e Macron convenceram Orbán a aceitar a nova ajuda europeia à Ucrânia

CNN Portugal , BCE
2 fev, 18:50
Viktor Orbán

Giorgia Meloni e Emmanuel Macron foram os rostos que fizeram "a ponte" entre os interesses do primeiro-ministro húngaro e as responsabilidades europeias, à luz da ajuda internacional para garantir a defesa da Ucrânia contra a invasão russa

Conversas de longas horas por telefone, encontros em hotéis, almoços e até pequenos-almoços. Foi preciso tudo isto, durante meses, para que os líderes europeus conseguissem convencer o primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, a concordar com o envio de um novo pacote de ajuda de 50 mil milhões de euros para a Ucrânia, segundo o POLITICO.

A primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni, terá sido a 'mediadora' entre os interesses de Orbán e as cedências (e não cedências) de Bruxelas. Afinal, os dois chefes de governo têm uma relação de amizade de longa data, pelo que os líderes europeus confiaram na primeira-ministra para fazer "a ponte" das conversações de parte a parte.

De acordo com fontes próximas do gabinete da primeira-ministra italiana, que falaram com o POLITICO sob a condição de anonimato, Giorgia Meloni começou este "trabalho diplomático" há meses, agendando reuniões entre vários ministros e funcionários europeus ainda antes de dezembro, altura em que Orbán já se mostrava inflexível para aceitar o envio deste novo apoio. Ao longo desta semana, antes da cimeira em Bruxelas na quinta-feira, Meloni intensificou o seu trabalho como mediadora entre as partes, conversando com Viktor Orbán por telefone e inclusive encontrando-se com ele num hotel em Bruxelas para uma conversa de uma hora.

Na véspera da cimeira, as delegações italiana e húngara trabalharam durante toda a madrugada para garantir que Orbán concordava com o novo apoio a Kiev e na manhã de quinta-feira Meloni e Orbán voltaram a encontrar-se horas antes da cimeira.

Viktor Orbán deu luz verde à aprovação de um novo apoio financeiro da UE destinado à Ucrânia (AP)

O primeiro-ministro húngaro acabou por ceder nessa manhã, durante um pequeno-almoço que contou não só com a presença de Meloni mas também com a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, o chanceler alemão, Olaf Scholz, e o presidente francês Emmanuel Macron.

A presença de Emmanuel Macron nessa reunião não é por acaso. É que, segundo fontes citadas pelo POLITICO, também ele desempenhou um "papel fundamental" nas negociações com a Hungria. Na véspera da cimeira em Bruxelas, por exemplo, Macron também se encontrou com Viktor Orbán, depois de ter passado semanas a tentar convencer o primeiro-ministro húngaro, inclusive num almoço no Palácio do Eliseu, no início de janeiro.

“Ele nunca quis antagonizar Orbán, mas sim convencê-lo a entrar no jogo. Foi essa a abordagem que resultou", disse uma fonte próxima do presidente francês, citada pelo mesmo jornal.

Ora, foram estas "operações de charme" (como as descreve o POLITICO) que permitiram ao presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, abrir a cimeira de quinta-feira com o tão esperado anúncio sobre um acordo entre os 27 para enviar o novo pacote de ajuda à Ucrânia. Charles Michel saltou as habituais formalidades destes anúncios para expor rapidamente os pormenores do acordo alcançado com Viktor Orbán, incluindo as cedências que foram feitas à Hungria, nomeadamente a garantia de que este pacote de ajuda seria revisto dentro de dois anos.

Hungria diz que UE lhe deu garantias, Von der Leyen desmente

Na Hungria, segundo o POLITICO, este acordo foi interpretado como uma vitória para Orbán. O diretor político do primeiro-ministro húngaro, Balázs Órban (que, apesar do apelido, não tem qualquer grau de parentesco com o chefe do executivo), afirmou que Budapeste conseguiu o que queria nesta cimeira. “No final do primeiro ano, a ajuda à Ucrânia deve ser renegociada e, no final do segundo ano, todo o acordo será reavaliado no contexto do orçamento da UE para o próximo período”, escreveu Balázs Órban na rede social X.

Após a cimeira, o primeiro-ministro húngaro justificou o levantamento o veto à ajuda destinada à Ucrânia com o facto de lhe terem sido dadas garantias de que serão descongelados fundos atribuídos a Budapeste.

“Receávamos que os fundos devidos aos húngaros e atualmente congelados pela Comissão Europeia fossem parar à Ucrânia”, afirmou Orbán num vídeo publicado nas redes sociais. “Recebemos uma garantia” de que isso não aconteceria, acrescentou, sem dar mais pormenores.

Mais tarde, Ursula von der Leyen assegurou que não deu garantias à Hungria de que os fundos comunitários suspensos a Budapeste por desrespeitar o Estado de direito seriam desbloqueados, dado o retrocesso húngaro para apoio financeiro à Ucrânia.

"A história é muito simples: há leis sobre os fundos de coesão, há leis sobre o Fundo de Recuperação e há uma lei sobre o mecanismo de condicionalidade e essas leis não têm nada a ver com o mecanismo para a Ucrânia e a revisão intercalar [do orçamento da UE]", declarou Ursula von der Leyen.

Em todo o caso, diplomatas e funcionários da UE disseram ao POLITICO que Viktor Orbán não tinha outra alternativa senão "ceder para evitar uma crise política de grandes proporções". Tanto que, antes da cimeira em Bruxelas, os líderes europeus não pouparam nas críticas à Hungria.

"A Hungria precisa da Europa. Ele [Viktor Orbán] também deve procurar o que significa para a Hungria estar na Europa”, declarou o primeiro-ministro da Estónia Kaja Kallas, antes da cimeira.

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