Seis mil menores mortos em dois meses, milhares sem família e sem escola: “Ser criança em Gaza é uma situação complicada”

9 dez 2023, 15:10

Bill van Esveld é especialista em temas relacionados com o conflito israelo-palestiniano na Human Rights Watch. Em entrevista à CNN Portugal, disse que, para além dos milhares de crianças mortas, é preciso começar a pensar como vão viver outros milhares sem família e sem escola. A organização de defesa dos Direitos Humanos concorda com o Secretário-geral da ONU quando este fala num “caos humanitário” e diz que há gerações de palestinianos a crescer com traumas para a vida

O Fundo das Nações Unidas para as Crianças diz que o Território Palestiniano da Faixa de Gaza é dos piores lugares do mundo para ser-se criança. Desde o início dos bombardeamentos de Israel sobre a Faixa de Gaza, em outubro, até à primeira semana de dezembro, morreram mais de seis mil menores, incluindo recém-nascidos nos hospitais atingidos pelo exército de Israel.

Entre as várias organizações internacionais que acusam o exército israelita de nada fazer para poupar os civis ao sofrimento, está a Human Rights Watch, com sede em Nova Iorque, com grupos nas principais zonas de conflito do planeta.

A CNN Portugal conservou com um dos especialistas no conflito israelo-palestiniano sobre os últimos desenvolvimentos em Gaza. Bill van Esveld conhece bem as carências com que vive uma população extremamente jovem e sem recursos.

Recém-nascidos mortos no Hospital al-Nasser

A situação dos palestinianos em Gaza piora sempre que há um conflito entre o Hamas, no poder desde 2006 no território, e o exército de Israel, diz van Esveld:

“Morre uma criança de 10 em 10 minutos desde que este conflito começou, dia sete de outubro”, explica à CNN Portugal.

“Houve um acidente com quatro bebés prematuros no Hospital al-Nasser, ligados a máquinas de oxigénio. Esse hospital foi forçado a evacuar. O pessoal diz ter dito ao exército de Israel que havia quatro bebé e que não os poderiam levar”, conta Bill van Esveld.

De acordo com o perito da Human Rights Watch, o exército de Israel terá concordado em proteger os recém-nascidos. No entanto, o pessoal do hospital al-Nasser voltou às instalações dia 28 de novembro. Encontraram os corpos dos bebés. Estavam mortos e em decomposição.

Gaza é o pior sítio para ser-se criança no mundo inteiro

Van Esveld conta que as deslocações ao terreno, tanto em Gaza como na Cisjordânia lhe permitiram chegar à conclusão de que as crianças e os adolescentes palestinianas enfrentam traumas que deverão permanecer no imaginário coletivo durante gerações.

“É uma situação incrivelmente complicada, ser uma criança em Gaza. Imagine que nasceu em 2008. Desde essa altura, houve uma escalada importante nas hostilidades em 2008 e em 2009. Outra em 2012 e outra em 2014,” conta o perito da Human Rights Watch.

“E, agora, temos esta situação. A UNICEF fez um estudo, no qual concluiu que uma em cada três crianças vive com traumas relacionados com o conflito.”

Van Esveld refere ainda que a organização Save the Children referiu, em 2022, que 80% das crianças em Gaza sofria de stress pós-traumático e que três em cada cinco já teria pensado em suicidar-se.

Israel culpa o Hamas pela morte de crianças em Gaza

O Governo de Telavive insiste em que as mortes civis são culpa dos islamistas do Hamas e do braço armado das Brigadas de al-Qassam, que usam crianças e a população palestiniana como escudos humanos. Mas o perito da Human Rights Watch disse à CNN Portugal que as coisas não são bem assim.

“O Hamas deveria tomar precauções para proteger os civis, coisa que não faz,” reconhece Bill van Esveld.

“Mas, quando à acusação de que impedem as pessoas de fugir, quanto a isso, não temos provas. Por isso, se o Hamas está a obrigar as pessoas a ficar em determinados lugares. Está a fazer um trabalho muito pouco eficaz”, continua.

Para o especialista da Human Rights Watch, há, por outro lado, provas de que Israel usa os palestinianos como escudos humanos, tanto na Faixa de Gaza, quanto na Cisjordânia, em situações de conflito com grupos armados.

“Temos visto casos de utilização de civis como escudos humanos por parte de membros das tropas de Israel. Forçam os palestinianos a caminhar à frente deles enquanto caminham atrás, de armas apontadas, para protegerem os soldados dos ataques. E isso constitui um crime de guerra, a utilização de escudos humanos.”

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