Sobre o pedido de demissão feito por Israel, o ministro português recusou "valorizar excessivamente". "É um comentário emocional que não tem qualquer tipo de fundamentação", considera
Portugal “compreende e acompanha” a posição do secretário-geral das Nações Unidas sobre o conflito entre Israel e o Hamas, que motivou um pedido de demissão de António Guterres por Telavive, disse esta quarta-feira à Lusa o ministro dos Negócios Estrangeiros.
“Compreendemos e acompanhamos inteiramente a posição de António Guterres, que foi inequívoco quando condenou o terrorismo do Hamas, que é absolutamente inaceitável. Foi absolutamente cristalino na análise que fez”, afirmou à Lusa João Gomes Cravinho, que lamentou esta polémica entre o Governo de Israel e o secretário-geral da ONU.
Para o Governo português, “não há forma nenhuma de dizer que António Guterres está de alguma maneira a desculpabilizar o terrorismo”.
Tal, acrescentou o chefe da diplomacia portuguesa, “é um erro absoluto que não se pode deixar passar em branco”.
O embaixador israelita junto das Nações Unidas (ONU), Gilad Erdan, pediu na terça-feira ao secretário-geral da organização, António Guterres, que se demita "imediatamente" após este ter dito que os ataques do grupo islamita Hamas "não aconteceram do nada".
"O secretário-geral da ONU, que demonstra compreensão pela campanha de assassínio em massa de crianças, mulheres e idosos, não está apto para liderar a ONU. Peço-lhe que renuncie imediatamente", escreveu o diplomata na rede social X (antigo Twitter).
"Não há qualquer justificação ou sentido em falar com aqueles que demonstram compaixão pelas mais terríveis atrocidades cometidas contra os cidadãos de Israel e o povo judeu. Simplesmente não há palavras", acrescentou.
Momentos antes, na abertura de uma reunião do Conselho de Segurança da ONU dedicada à atual situação no Médio Oriente, Guterres condenou inequivocamente os "atos de terror" e "sem precedentes" de 7 de outubro perpetrados pelo grupo islamita Hamas em Israel, salientando que "nada pode justificar o assassínio, o ataque e o rapto deliberados de civis".
Sobre o pedido de demissão feito por Telavive, o ministro português recusou "valorizar excessivamente".
"É um comentário emocional que não tem qualquer tipo de fundamentação", considerou.
Gomes Cravinho comentou que Guterres “tem sido a voz da consciência internacional” sobre a “situação humanitária profundamente preocupante” em Gaza, que “precisa de respostas imediatas”.
O secretário-geral da ONU, acrescentou, “tem toda a razão em dizer que é também necessário olhar para os problemas de fundo no Médio Oriente”.
“É necessário olhar para tudo aquilo que se tem passado ao longo das décadas, porque esta trágica situação, esta terrível crise, tem de constituir também uma oportunidade para uma nova abordagem face ao Médio Oriente. Temos de ter uma maneira de transformar aquilo que é uma situação trágica numa situação de esperança”, destacou o ministro português.
Por outro lado, salientou que o “fortíssimo impacto emocional” do ataque do Hamas em 7 de outubro, que as autoridades israelitas dizem ter causado a morte de cerca de 1.400 pessoas, além de mais de 200 reféns, “pode não ser o melhor conselheiro” no momento da resposta.
“É preciso reagir de uma forma muito racional, muito fria, o que pode ser extremamente difícil. Há uma grande responsabilidade por parte dos decisores políticos, em Israel, mas também internacionais, de não permitir que se cometam erros que depois tornem mais difícil uma solução de médio e longo prazo” para o conflito, referiu ainda Gomes Cravinho.
O Hamas atacou Israel de surpresa em 7 de outubro, provocando, segundo fontes israelitas, mais de 1.400 mortos, na sua maioria civis, e raptou cerca de 220 pessoas que levou como reféns para a Faixa de Gaza.
Desde então, Israel tem bombardeado a Faixa de Gaza sem interrupção e impôs um bloqueio de água, medicamentos e combustível no território, controlado pelo Hamas desde 2007.
Segundo o Ministério da Saúde do enclave palestiniano, mais de 5.800 pessoas foram mortas por ataques israelitas na Faixa de Gaza, a maioria delas civis, incluindo quase 2.400 crianças.