Os misteriosos símbolos esculpidos encontrados nos desertos do Qatar

CNN , Dimitris Sideridis
11 dez 2021, 16:00

Cerca de 900 pinturas rupestres esculpidas na pedra há séculos foram encontradas num canto remoto da costa nordeste do Qatar.

Alguns destacam-se da rocha macia como répteis a apanhar banhos de sol. Outros são misteriosas depressões que se assemelham a um antigo jogo de tabuleiro jogado em todo o mundo. E uns quantos são completamente intrigantes.

Num canto remoto e varrido pelo vento da costa nordeste do Qatar, entre as dunas de areia de um deserto árido, situa-se Al Jassasiya, o maior e mais importante sítio de arte rupestre do Golfo.

Aqui, pessoas de há séculos usaram uma série de afloramentos de calcário de baixo-relevo como tela, na qual esculpiram símbolos, motivos e objetos que observavam no seu ambiente.

Globalmente, os arqueólogos descobriram cerca 900 gravuras rupestres, ou "petróglifos", em Al Jassasiya. São sobretudo covinhas enigmáticas organizadas em variados padrões, incluindo filas e rosetas, mas também representações vistosas de barcos à vela, normalmente vistas de cima, mas também representadas em perfil linear, entre outros símbolos e sinais.

"Apesar de a arte rupestre ser comum na Península Arábica, algumas das gravuras de Al Jassasiya são únicas e não se encontram em mais nenhum local," Ferhan Sakal, diretor da Gestão de Escavações e Sítios dos Museus do Qatar, disse à CNN, referindo-se aos petróglifos de navios vistos do ponto de vista aéreo.

"Estas gravuras representam competências de alto nível de criatividade e observação por parte dos artistas que as fizeram", declarou. "Também pensamento abstrato, uma vez que não podiam ver de cima o dhow (um navio tradicional)".

Covinhas

Os peritos dizem que as gravuras rupestres de Al Jassasiya são características do local

Existem cerca de 12 sítios de petróglifos assinaláveis no Qatar, situados sobretudo nas costas do país, apesar de algumas gravuras poderem ser vistas no centro de Al Bidda Par, em Doha com vista para o Corniche, um popular passeio marítimo.

Al Jassasiya, a cerca de uma hora a norte da ultramoderna capital do Qatar e próximo do antigo porto de pérolas de Al Huwaila, foi descoberto em 1957. Durante mais de seis semanas no fim de 1973 e início de 1974, uma equipa dinamarquesa liderada pelo arqueólogo Holger Kapel e pelo seu filho Hans Kapel levaram a cabo um estudo em que penosamente catalogaram todo o local com fotografias e desenhos.

De todas as figuras individuais e composições documentadas, mais de um terço consiste em covinhas com várias configurações, formas e tamanhos.

O padrão mais proeminente envolve duas filas paralelas de sete buracos, levando alguns a acreditar que era usados para jogar Mancala, um jogo de tabuleiro popular em muitas regiões do mundo desde a Antiguidade, no qual dois jogadores colocam números ímpares e pares de pequenas pedras nos buracos.

Outros contestam esta teoria, apontando para o facto de alguns do buracos em Al Jassasiya serem demasiado pequenos para albergar as pedras, e alguns encontram-se em colinas, uma escolha pouco prática que faria com que as pedras rolassem para fora dos buracos.

Outras hipóteses incluem a ideia de que as covinhas eram usadas de algum modo em adivinhações; ou para escolha e armazenamento de pérolas, ou como sistema para calcular o tempo e as marés.

Teoria do jogo

A área contém cerca de 900 gravuras

Portanto, para que serviam realmente e o que significam?

"É muito difícil responder," reconhece Sakal, que também não acredita na teoria do jogo de tabuleiro. "Não temos pistas diretas sobre os motivos usados em Al Jassasiya", declarou.

"Na minha opinião, podem ter um significado e uma função rituais muito antigas e, portanto, sem explicação em termos etnográficos."

Mas o quão antigos? "Não sabemos realmente", admitiu Sakal, explicando que os petróglifos, e a arte rupestre em geral, continuam a constituir um desafio.

"Há hipóteses imaginárias sobre a idade, que vão desde o Neolítico ao fim dos impérios islâmicos," acrescentou. "Pessoalmente, acho que as gravuras não foram todas feitas ao mesmo tempo."

Há uma década, um estudo científico de nove petróglifos de Al Jassasiya não encontrou provas de terem mais do que umas centenas de anos, mas os investigadores concluíram que são precisos mais estudos, incluindo o desenvolvimento de novas técnicas específicas para gravuras em calcário.

Apesar de os peritos não poderem afirmar quando foram criados os petróglifos de Al Jassasiya, nem quem foram os autores, todos concordam que os mais fascinantes e invulgares do local são os dos barcos.

As teorias divergem quanto à idade dos petróglifos

Estas criações fornecem informações importantes sobre os tipos de embarcações usados tanto na indústria das pescas quanto na das pérolas, ambas florescentes (durante séculos, os pilares da economia do Qatar), bem como os seus vários elementos.

A maioria dos barcos vistos de cima tinha a forma de peixe com popas pontiagudas e filas de remos esculpidos com uma ferramenta de metal aguçada.

Contêm vários pormenores, como vigas cruzadas e orifícios mostrando provavelmente a localização de mastros e traves.

Nalguns casos, uma longa linha da popa retrata uma corda que termina numa âncora tradicional árabe (âncora de pedra triangular com dois orifícios) ou uma europeia (âncora de metal com uma haste e dois braços curvos, usada inicialmente na região há sete séculos).

Viagem para o além

Subsiste o mistério em relação ao objetivo de algumas gravuras

"Nalgumas embarcações os remos não estão paralelos, como teriam de estar quando usados para remar, mas a apontar para várias direções", escreveram Frances Gillespie e Faisal Abdulla Al-Naimi em "Hidden in the Sands: Uncovering Qatar's Past." (“Escondidos nas Areias: Descobrindo o Passado do Qatar”).

"Seria esse o aspeto que deveriam ter quando os bacos estavam ancorados nos bancos de pérolas e os remos eram deixados no sítio para os mergulhadores se apoiarem e descansarem sempre que voltavam à superfície."

Peritos dizem que só podem especular quanto ao motivo para haver uma tão grande concentração de gravuras com embarcações em Al Jassasiya, quando se compara com outros locais costeiros com petróglifos do Qatar.

"Os barcos tinham um papel fulcral nas crenças dos povos antigos, que os viam como um meio simbólico de trânsito deste mundo para o além," revelaram Gillespie e Al-Naimi.

"Tanto os Babilónios quanto os Egípcios antigos acreditavam que os mortos iam para o além numa embarcação. A mitologia grega falava do barqueiro Caronte, que levava as almas dos mortos pelo Rio Estige até ao Mundo dos Mortos. É possível que as gravuras mais antigas sejam ecos de uma memória popular que remonta a tempos pré-históricos."

Seja qual for o motivo, os visitantes devem recordar-se de levar água com eles e de usar um chapéu e protetor solar quando deambularem entre as gravuras a tentar perceber o seu significado.

O local vedado não tem zonas de sombra, por isso, as melhores alturas para os visitar são o nascer e o pôr-do-sol. Al Jassasiya situa-se a sul da popular Praia Azerbaijani Beach, por isso uma excursão ao sítio pode ser combinada com um dia relaxante junto ao mar.
 

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