Casa Pia - Passado e presente dos «gansos»

24 nov 2000, 04:37

Taça de Portugal (4ª eliminatória) Chainho, Calado e Rui Borges já passaram por lá, há não muito tempo. Cândido de Oliveira e Ricardo Ornelas também. Mas, isso sim, há muitos e muitos anos, quando o clube ajudou a escrever as primeiras páginas da história do futebol português. A viagem à Madeira, para defrontar o Marítimo, traz o Casa Pia de volta a uma notoriedade a que já não estava muito habituado.

O Casa Pia Atlético Clube completou em Junho 80 anos. Fundado a 3 de Junho de 1920 por ex-alunos da Casa Pia de Lisboa, o clube já teve os seus momentos de glória e a história dos primeiros anos é motivo de orgulho: o Casa Pia venceu o campeonato distrital de Lisboa e a Taça da Associação; foi a primeira equipa portuguesa a jogar em Paris, no Torneio Internacional da cidade e tem um curioso palmarés em inaugurações de estádios ¿ em 1921 o campo de jogos do Sevilha F.C. e do Vitória de Setúbal, e em 1925 o Estádio das Amoreiras, prestigiando o terreno do Benfica. 

Apesar da partipação no I Campeonato Nacional da I Divisão, (a única) na época 38/39, ao lado do Benfica, do Sporting e do Belenenses, o Casa Pia andou nos últimos anos entre a II e a III divisões, tendo subido este ano à II B. 

O sorteio da Taça, que lhes destinou uma viagem à Madeira, fez com que os gansos voltassem a ser tema de actualidade. Maisfutebol foi visitar este histórico lisboeta, procurando trazer passado e presente para a mesa. 

O ganso como imagem de marca 

Não parou de chover o dia todo, e o encontro com Carlos Borges, director do Departamento de Futebol é na «sala multi-usos», mesmo ao lado dos balneários. A sala está decorada com motivos clássicos: taças, primeiras páginas de jornais emolduradas, e fotografias de grandes glórias do clube, como Ricardo Ornelas e Cândido de Oliveira. 

Os gansos orgulham-se principalmente da história e tradição que representam. Mas primeiro, porquê gansos? « É a denominação pela qual eram conhecidos os casapianos», explica Carlos Borges, «nas comemorações da Casa Pia, a 3 de Julho.

Marchávamos [os alunos] em Belém, de boné e farda azul, bem direitos e as pessoas diziam: lá vão eles garbosos e altos, parecem uns gansos...» 

O nome acabou por ser adoptado por todos os casapianos e tornou-se o símbolo do clube. «Desde o ano passado incluímos o ganso nas nossas camisolas, é a nossa imagem de marca». 

O Casa Pia aposta sobretudo na formação. Além de várias modalidades, tem todas as categorias no futebol, desde iniciados a veteranos. Das camadas jovens saíram grandes nomes nos últimos anos, como Calado, para o Benfica, Chainho, agora no F.C. Porto, Rui Borges, que foi para o Alverca, (os três com duas épocas nos seniores) e mais recentemente Semedo, «um verdadeiro ganso, aluno da Casa Pia», que está no Estrela da Amadora.

Carlos Borges reforça o ponto da escola de jogadores:«há um protocolo com a Casa Pia de Lisboa, em que nós damos formação aos quatro mil e quinhentos alunos, nas várias modalidades. Daqui a três ou quatro anos queremos ter um grande número de jogadores nos seniores vindos das camadas jovens, tendo sido alunos da Casa Pia: é uma tradição que queremos recuperar», revela. 

A tradição e sonhos para um grande complexo desportivo  

Para manter a tradição, é preciso dinheiro. O Casa Pia tem um orçamento de 45 mil contos, reunindo as quotas (3 mil sócios e uma média de 500 escudos) que aumentaram este ano depois de uma década, a percentagem do aluguer do espaço de uma bomba de gasolina ao lado do estádio e, claro, a publicidade.  

Há três categorias de sócios: os efectivos, que foram casapianos, os verdadeiros «gansos»; os especiais, filhos de casapianos, os herdeiros; e os auxiliares, que nunca passaram pela instituição mas que «sentem» o Casa Pia. De assinalar que só um casapiano pode ser presidente do Casa Pia. 

A novidade, em relação ao futuro próximo, é a construção de um edifício de escritórios, ao lado do estádio, cujo aluguer vai gerar também receitas. «Há planos para a construção de um centro de estágios, um court de tenis, um campo futebol de praia (está na moda), uma piscina... isto são tudo projectos que nós queremos concretizar, mas estamos à espera de parceiros», explica Carlos Borges. 

Duas viagens à Madeira em oito dias 

Curiosamente, o clube jogou também na Madeira a semana passada para o campeonato (vitória sobre o Camacha, por 3-1). Uma segunda deslocação será comportável? «É curioso, mas recebemos menos dinheiro da Federação para a Taça do que para o campeonato. Por exemplo, na viagem para jogadores, treinadores, e pessoal administrativo que na nossa equipa são 21 pessoas, eles [Federação] só dão subsídio para 20...», refere Carlos Borges.  

No plano desportivo, o embate com o Marítimo não desperta, obviamente, grandes preocupações no clube: «É mais um jogo, e vamos encará-lo como o fizemos com o Guimarães, o ano passado [o Casa Pia foi eliminado na quinta eliminatória]. Vamos manter o nosso sistema, um futebol de ataque. Há três resultados possíveis...vamos tentar fazer um bom jogo», garante Carlos Borges. 

A seta da vitória 

A chuva que teima em não parar, ameaça os treinos. O campo já está alagado, mas os seniores têm de treinar na mesma. Os infantis e os iniciados são dispensados.

Finalmente, a bola começa a saltar às 19.10 h. O tempo não mudou, por isso a sessão é limitada a corrida entre poças no relvado e a pista que mais parece uma piscina. O trabalho físico é privilegiado e os guarda-redes treinam à parte.  

Entra em cena Ricardo Gameiro. Os iniciados não treinaram e Ricardo aproveitou para ver o treino do seniores «Isto vai sair no jornal?», pergunta interessado. «Eu jogo a médio-centro e o meu jogador preferido é o Geraldino, mete muitos golos!» 

O treino acaba perto das 20 h, com todos a desejar um banho quente. Parou de chover, mas o incómodo continua. 

E onde estudas, Ricardo? «Na escola S. Julião da Barra. Às terças e quintas treinamos na Casa Pia no Restelo e às quartas e sextas, aqui [Pina Manique]».

Gostava de jogar num clube grande, claro, talvez o Benfica, ou porque não o Sporting, por onde já passou Figo, «o meu jogador preferido. Ele é o melhor jogador do mundo». 

O balneário está decorado com posters e fotos de glórias e equipas passadas, para dar alento e coragem. Mas mesmo antes de entrar no relvado, há uma seta que o aponta e um mensagem que não podia ser mais explícita: «Gansos, é este o caminho da vitória». 

Textos 

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