Redes sociais. “Não há maior ato de coragem do que um jovem dar a cara pelas suas opiniões políticas”. Gaspar Macedo tem 23 anos e dedica os dias a falar do Governo e da oposição

CNN Portugal , CNC
10 set 2023, 18:00
Gaspar Macedo

Gaspar Macedo começou a fazer vídeos sobre política há 6 meses e tem mais de 100 mil seguidores só no Instagram. Diz que António Costa é o responsável pela estagnação do país, considera que Luís Montenegro não é a imagem da mudança e pede aos jovens para serem mais ativos na defesa do futuro

Gaspar Macedo é um jovem de 23 anos que usa as redes sociais para falar sobre política. Tem 114 mil seguidores no Instagram e mais de 80 mil no TikTok. É também comentador da CNN Portugal. “Não escolhi interessar-me por política, a política é que me entrou pela casa adentro”, conta, garantindo que, apesar ser do PSD, não sente necessidade de perder a sua identidade pessoal, nem de estar de acordo com todas as ideologias políticas do partido.

À CNN Portugal Gaspar Macedo explica porque decidiu dedicar-se a esta área e como prepara as suas intervenções para os milhares de seguidores que tem vindo a acumular.

Como surgiu esta ideia de postar conteúdo sobre política nas redes sociais?
Não foi por uma questão pessoal ou, como muita gente que se mete nas redes sociais, por ambição de fazer algum dinheiro, mas sim por um sentido de missão. Até porque acho que há imensa gente neste país que depende e é afetada diretamente por decisões políticas, mas que escolhe ficar de fora do mundo político. Ou seja, escolhe não participar na política. 

Está a referir-se a quem?
Refiro-me a portugueses que emigram, a jovens que não conseguem sair de casa dos pais e que recebem pouco e até a pessoas do interior. Todas elas se metem de fora das decisões políticas e sentem que o país, como nós o conhecemos hoje, está estagnado e que não há outro caminho. 
Quero, e foi por isso que comecei a fazer este tipo de conteúdo, explicar às pessoas que nada tem de ser assim para sempre. Acho que o que falta ao país e à população é ter esperança, ter ambição e acreditar que podemos sair da situação atual.

O que quer dizer é que é preciso ter mais proatividade?
Exatamente, mas a palavra certa é ambição. Não sei se foi consequência do que aconteceu nos últimos 20 anos, mas ter ambição é mal visto em Portugal. 
Olha-se com cinismo para a política. Antigamente, as pessoas confiavam nos seus políticos; agora, quando pensam num político, pensam mais num problema do que numa solução. 

Porque é que acha que se pensa assim?
Acredito que a principal razão para se pensar assim é o facto de a política se parecer cada vez menos com as pessoas. Veem sempre os mesmos intervenientes e sentem que a política não é parecida com elas.
Eu, que não venho de famílias avantajadas, que não tenho ligações nenhumas políticas, e que cresci com pais que faziam parte desse grupo que acreditava que a política não tinha nada para lhes oferecer, dou a cara. É isso que acho que os jovens precisam de fazer. Não há maior ato de coragem do que um jovem dar a cara pelas suas opiniões políticas. Mas há muito cinismo, pois muita gente que é afetada diretamente pensa: “Não vale a pena”.

Têm uma atitude derrotista?
Exato. Os jovens devem falar porque muitas vezes a perceção que se cria é que a única forma de ter sucesso neste país é através de contactos. Eu quero contrariar essa ideia.

Quando é que começou a publicar este tipo de conteúdo nas redes sociais?
Só comecei há seis meses e estou tão ou mais surpreendido que muitos em relação à quantidade de pessoas que alcancei. Recebo mensagens de pessoas que estão em Cabo Verde, portugueses que foram para lá, e eles próprios dizem que há cidadãos cabo-verdianos que me conhecem.

Não tinha ideia de que ia conseguir alcançar tanta gente? 
Não.

Houve algum momento decisivo que o fez tomar a decisão de apostar em conteúdos sobre política? 
Não foi um momento ou um dia em concreto, mas posso dizer que sinto que o país é capaz de muito mais do que aquilo que tem feito.
Não identifico atualmente em quem está a governar a capacidade e a vontade de mudar o país para melhorar a vida das pessoas. Então, depois de nas últimas eleições legislativas, ter sido dada uma maioria absoluta a quem está a governar, tive a necessidade de fazer uma reflexão muito grande. “Será que é mesmo isto que as pessoas querem? Ou será que é porque as pessoas não se identificam do outro lado?”

E foi isso que o levou a avançar no Instagram e no TikTok com estes conteúdos?
Sim, aí decidi: “Vou deixar de murmurar para mim próprio, vou deixar de falar com os meus amigos e mostrar-lhes o quão descontente estou e vou dar a cara”.
Acho que é isso que se deve fazer e aconselho todos os jovens a dar a cara, nomeadamente em casa, mobilizando a família para ir votar, convencer aqueles familiares que dizem que não votam. É necessário fazer alguma coisa.  Eu fiz a minha reflexão e passei a “dar a cara”, até porque acredito que, embora haja uma maioria absoluta, não é isto que Portugal realmente quer.
As pessoas estão à espera de uma mensagem que as mobilize. Tem de existir uma mensagem clara de mudança, uma mensagem forte, ou então as pessoas vão preferir sempre o status quo.

Recebe alguma recompensa financeira pelos seus vídeos?
Não recebo nada. Aliás, até perco porque muitas vezes convidam-me para gravar podcasts em Lisboa e, como sou do Porto, isso tem um custo. Não ganho nada, perco dinheiro até.

Faz algum tipo de investigação antes de começar a gravar os vídeos?
Claro. Obrigo-me a ter os factos do meu lado, portanto, faço sempre esse estudo. As conversas, geralmente, não são planeadas, mas desde muito novo que tenho um interesse por política, portanto, acompanho e leio.
Há muita gente que pega nas suas posições políticas e nas suas ideologias e tenta procurar os factos que lhe interessam. Eu gosto de olhar para os factos e só depois é que tiro as minhas elações e falo. Não é por conveniência.

E como é que funciona todo o processo por detrás das câmaras?  
Há a investigação nos dias antes. Normalmente, gravo o podcast de duas em duas semanas. E nessas duas semanas, investigo. Vejo o que é que se passa no país e nas comunidades e depois é só vestir uma camisola e sentar-me à frente da câmara a falar com dois colegas meus ou, às vezes, até com outras pessoas. 
Geralmente, é com dois colegas. Um deles é  imigrante brasileiro e o outro é um português que esteve emigrado. São o tipo de pessoas que eu acho que falta dar voz aqui em Portugal. Falo com eles e é uma conversa muito orgânica. 

Escolhe os temas que vão abordar?
Sim, há sempre três temáticas definidas sobre as quais vamos falando. Às vezes acontece uns terem uma opinião mais extrema para um lado, outros mais extrema para o outro, mas é aí que está o valor destas discussões. Muitas vezes, quando se ouvem opiniões mais extremas, a tendência que temos é de as ignorar ou de as descartar, mas prefiro falar com essas pessoas e tentar perceber o ponto de vista delas.

Tem objetivos para cada vídeo? Ou seja, para cada episódio do podcast traça meta relativas ao número de pessoas que vão ver ou  ouvir?
Não, quando comecei foi sem essa intenção. Contava ter, até ao final do ano, cerca de dez mil seguidores no Instagram, mas isso foi uma previsão muito abaixo daquilo que realmente aconteceu.
A minha preocupação é, acima de tudo, aumentar a qualidade do discurso e a qualidade do conteúdo. É só isso que quero fazer. Não tenho objetivos traçados. Acho que essa é a forma errada de olhar para a coisa. Quem se tenta meter no mundo da comunicação espera logo resultados imediatos, mas eu acredito que a consistência é mais importante. Uma pessoa pode gravar um podcast e ter 500 visualizações. Aliás, já fiz podcasts e tive 20 visualizações, mas a consistência é que cria audiência. Essa é a chave- as pessoas serem consistentes.

À medida que ganhou visibilidade, que mudanças é que sentiu na sua vida?
Às vezes, estou a passar na rua ou a entrar no café e tenho pessoas que me conhecem e fico muito grato por isso. Especialmente agora no verão, que é quando muitos imigrantes voltam para passar férias, que me dizem: “Sentimos que estamos lá fora e que ninguém nos ouve”. Até o próprio sistema eleitoral está desenhado para terem pouca representação política. Mas ter gente que me diz a mim, um jovem de 23 anos, que compartilha da mesma esperança, deixa-me emocionado. 

As pessoas falam consigo para discutir pontos de vista ou as suas opiniões políticas?
Sim. Às vezes, até demasiado. Quando vou sair à noite e estou em discotecas, há jovens que vêm ter comigo e começam a  falar de política. Está a música a dar aos berros e falam comigo, e gosto quando me dizem: “Não sou da tua opinião, mas gosto do que publicas”.

Gosta quando as pessoas falam consigo por terem opiniões diferentes?
Sim, porque acho que as pessoas estão demasiado habituadas a olhar para a política como uma luta de boxe.
Nas redes sociais, como tiram a cara ao ser humano da equação, ainda é mais fácil andarmos a ridicularizar o adversário político.

O que conclui dos vários contatos que tem na rua?
A maior parte da população é moderada. As pessoas quando falam comigo na rua, fazem-no de forma moderada, tentando procurar um espaço comum. Acho que é isso que falta na política. As pessoas estão fartas de conflito.
Os partidos precisam de se unir para começar a olhar, por exemplo, para a crise de saúde mental como uma verdadeira crise. Não é sustentável continuarmos a viver num país onde para ter acesso a cuidados de saúde mental de qualidade ou se é rico ou tem de se esperar um ano por uma consulta no Serviço Nacional de Saúde. Esta crise na saúde mental é uma das coisas em que a política pode ter tanta influência e são necessárias iniciativas, se não vierem do governo, têm, pelo menos, de vir das câmaras municipais.

Nas redes sociais recebe muitos comentários negativos devido ao conteúdo que publica?
Qualquer coisa que se faça vai ter sempre uma reação contra, mas tento sempre não me focar nisso. Há quem escolha fazê-lo, até porque é uma forma de criar polémicas e de ganhar visibilidade, mas eu nunca vou por aí porque quero que a minha mensagem seja positiva e de esperança.

Mas não o afeta?
O tipo de comentários que realmente me afeta é quando pegam no facto de eu ser jovem para invalidar aquilo que estou a dizer. Isso chateia-me, porque está sempre a dizer-se que é preciso ideias novas e pessoas novas na política, mas depois todos os jovens que conheço que se envolvem na política, até mesmo os que são eleitos para cargos, sofrem sempre com esse paternalismo crónico do país.

Os jovens devem começar a envolver-se na política mais cedo?
Sim e prende-se com o facto de existir este paternalismo crónico. Vivemos num país onde quem é jovem, nasce com mochilas de dívidas às costas: mochilas de dívidas financeiras, de dívidas ambientais, etc. Se esperam que nós jovens agarremos no país, porque é que não podemos começar logo a participar das decisões que se tomam? 
Se vamos tomar conta do país, temos de começar já a participar nas decisões políticas de Portugal.

Acredita que os militantes dos partidos perdem a sua identidade quando entram para as cúpulas partidárias?
Estou num partido há pouco tempo. Estou num partido, mas não sou do partido. Há aqui uma grande diferença e é importante fazer esta distinção. Há muita gente que entra para um partido ou para uma organização e que perde a sua identidade e fica muito dependente, também por ambições pessoais, daquilo que o partido quer, da ideologia. Portanto, sim.

Sente que por ser do PSD é obrigado a defender todos os ideais desse mesmo partido?
Não, aliás sou totalmente contra isso. Pior do que pessoas que são paus mandados ou rebanhos que seguem o pastor, são as que não defendem nada em concreto ou que pouco falam por calculismo, para não irritar o partido. Ficam ali naquela mensagem ambígua. 
Há muita gente que tem influência que antes de falar tem sempre a necessidade de consultar as cúpulas dos partidos. Sou contra isso. Temos de ter a nossa própria identidade.

As redes sociais facilitam a divulgação da mensagem política?
Sim. As redes sociais hoje em dia têm poder. O poder da mobilização. Antes, para falar de política, tinhas de ser escolhido pelas cúpulas partidárias ou estar nas cúpulas partidárias. 
Hoje, posso ser militante de base, livre do meu partido e ter muitas pessoas a ouvir aquilo que digo, sendo que a maioria delas nem sequer do meu partido é.

O que pensa dos atuais partidos? Estão envelhecidos?
Nos partidos está representado um país em que atualmente protege muito as hierarquias excessivas de: “Eu estou aqui há 40 anos e, portanto, tenho mais voz. Tenho mais direitos”. E a tendência que se cria é a de fechar os partidos de propósito para serem mais fáceis de controlar. Depois, isso é mau porque os líderes partidários têm mais incentivo de falar para dentro dos partidos para os poder controlar.

Gostava de ser nomeado para algum cargo político?
A política do poder local é muito interessante. Acredito que tem muita influência na vida das pessoas, por isso se um dia fosse candidato a qualquer cargo, gostaria de ser candidato a um cargo do poder local. E se isso acontecesse nunca faria uma campanha interna no meu partido a falar para os 50 militantes do partido. Falava para fora, para o município, para a comunidade.

Existe alguma pessoa que admire muito na política portuguesa? 
Sim, Francisco Sá Carneiro. 

Qual a sua opinião sobre o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa? 
Acho que o Presidente da República é, acima de tudo, um inovador e respeito muito isso. É da mesma família política que eu, portanto, há coisas com que me identifico. O que não me identifico é com o seu estilo demasiado interventivo. Mas reconheço muito a capacidade que teve de se aproximar do povo. Portanto, a opinião que tenho é complexa. 

E o que acha do atual primeiro-ministro? 
Acho que António Costa é um entrave a que se faça qualquer tipo de reforma no país. Ele permite a estagnação de Portugal e impede as reformas que são necessárias. É basicamente o garante do status quo. No entanto, o partido socialista tem gente muito capaz. 

E quando ao partido a que pertence? O que pensa acerca de Luís Montenegro, líder do PSD?
Acho que tem a tarefa ingrata, que Rui Rio também teve, de estar a ocupar um cargo que, no fundo, ainda tem a sombra do verdadeiro líder da direita, Pedro Passos Coelho. Acredito que Montenegro tem, por si só, uma incapacidade de afirmação enquanto líder do PSD: as pessoas não lhe reconhecem as ideias. Perante o primeiro-ministro, que garante o status quo, as pessoas querem alguém em quem possam ver mudança e Luís Montenegro não tem essa capacidade. Não protagoniza isso.

Nos últimos tempos assistiu-se a momentos de alguma tensão entre Marcelo Rebelo de Sousa e António Costa. Qual é a sua visão sobre o ambiente entre estes dois importantes intervenientes políticos? 
Já estava na altura de o Presidente da República começar a manifestar-se em relação aquilo que tem sido a ação do Governo. Portanto, vejo com bons olhos essa tensão entre os dois. Especialmente, porque o Presidente da República realmente está a tentar fazer um contraponto ao primeiro-ministro. É bom que Marcelo Rebelo de Sousa continue a colocar o governo em xeque. Nisso estou completamente do lado do Presidente.

Existe algum político internacional que admire? 
Sou um grande admirador do Robert Kennedy, que foi o irmão do Presidente dos Estados Unidos. Foi o tipo de político que admiro muito, porque não era calculista e tentou criar um consenso. 
Também aprecio muito o Emmanuel Macron, o Presidente francês. Não é que concorde com todas as suas decisões ou ideologias, mas gosto especialmente da sua forma de estar.

Qual foi o episódio político mais relevante para si?
O mais relevante, nos últimos anos, foi o dia em que António Costa tomou posse como primeiro-ministro; o dia em que se formalizou a geringonça, porque isso teve muito impacto no país. Ainda hoje é importante, principalmente à direita, que ainda funciona muito em função desse trauma. 

Que tipo de livro gosta?
Gosto muito de ler biografias. A que mais gostei de ler foi a do Winston Churchill. Mas também adoro ler os livros do Slavoj Žižek. 

Que conselhos tem para quem quer falar nas redes sociais sobre temas da atualidade política?
Tenho uma aspiração e um conselho. A aspiração que partilho é a de que na mensagem que querem transmitir tentem sempre pensar que há alguém do outro lado.
Já o conselho, é serem sempre genuínos. Não calculem muito a vossa mensagem. Mas acima de tudo, é fundamental começarmos a agir e a partilhar a nossa opinião.

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