Muitas polémicas e uma insólita acusação de atentado ao pudor: Bruno Paixão, o ex-árbitro pago por empresa do ‘saco azul’ do Benfica

14 fev 2022, 19:00
V. Guimarães vs Sporting (Hugo Delgado/Lusa)

As perícias financeiras da Polícia Judiciária (PJ) e do Ministério Público à empresa informática que terá servido de ‘saco azul’ ao Benfica, pela forma como recebeu 1,9 milhões de euros do clube por serviços de consultoria fictícios, encontraram por ali pagamentos de milhares de euros ao árbitro Bruno Paixão, conforme apurou a TVI (do mesmo grupo da CNN Portugal). E os indícios no processo são de corrupção desportiva – uma forma encapotada de o Benfica subornar um árbitro. Se ficar provado, o Benfica pode descer de divisão. Mas quem é Bruno Paixão?

“Aguentei sobre mim próprio, no meu silêncio, as críticas, as difamações, as provocações, acima de tudo quis sempre ser o mais justo possível, falhei muitas vezes, mas nunca o fiz de forma premeditada”, foram as palavras escolhidas por Bruno Paixão no dia do adeus ao futebol num texto publicado no Facebook. Para trás ficaram mais de 239 jogos na principal liga do futebol nacional apitados pelo árbitro setubalense, que chegou mesmo a ter insígnias da FIFA.

Da primeira liga despediu-se no dia 15 de abril de 2018, com um dérbi entre o antigo Belenenses e o Sporting. A vitória foi o lado dos leões, para felicidade de Jorge Jesus, treinador na altura, com o marcador a fixar-se nos 3-4 ao minuto 90. Um adeus à principal competição do futebol nacional conturbado: três penáltis, um golo invalidado ao Sporting por fora de jogo, nove cartões amarelos exibidos e duas expulsões para a equipa da casa.

Na Liga dos Campeões, Bruno Paixão arbitrou apenas um jogo da fase de grupos da competição. Estávamos a 24 de outubro de 2010, quando o português apitou o Valência contra o Bursaspor, que terminou 6-1 para os espanhóis.

Numa carreira de altos e baixos, Bruno Paixão foi por alguns anos o árbitro com mais jogos e que estava há mais anos na primeira liga de futebol profissional em Portugal. Mas, com o passar dos anos, acabou por perder as insígnias da FIFA, deixando de ser chamado para os jogos das competições internacionais, e na última fase da carreira já praticamente só estava presente nos jogos relevantes no papel de vídeoárbitro.

Em 2016, antes de um Moreirense-Sporting, que tinha como árbitro Bruno Paixão, o antigo colega de profissão Pedro Henriques traçou o perfil do profissional, lembrando que nem sempre era um árbitro “consensual”. ”É um nome que nem sempre é consensual. É um nome que muitas vezes suscita nos adeptos algumas dúvidas, até muitas críticas, mas é um árbitro muito experiente”, disse Pedro Henriques à TVI24.

Bruno Paixão chegou a ser visto como uma das promessas da arbitragem nacional, mas após 33 anos de carreira abandonou o futebol com a certeza que “nunca teve uma imprensa amiga”, como assinalou na despedida. “Fui durante toda a carreira massacrado por um jogo em que errei muitas vezes, tinha 23 anos e arbitrava jogos da Primeira Liga Portuguesa de Futebol Profissional”, expunha Bruno Paixão. O jogo em causa em um Campomaiorense-FC Porto.

"No momento da despedida, não posso deixar de pedir desculpa por todos os erros que possa ter cometido e prejudicado profissionais de Futebol", referia Paixão na mensagem de despedida.

Para lá das desculpas pelos jogos que geraram polémica, Bruno Paixão lembrava que pendurava o apito sem ter “nenhum caso pendente na justiça". Enaltecia ainda ter atingido "as insígnias da FIFA com muito suor, sangue e lágrimas", algo que acabou por perder ainda no ativo.

Bruno Paixão deixa de ser internacional por "culpa" de um Gil Vicente - Sporting

Em 2012, Bruno Paixão ficava fora da lista de árbitros internacionais enviada pela Federação Portuguesa de Futebol à FIFA. Bruno Paixão acabou por contestar e recorrer da decisão para o Tribunal Administrativo de Lisboa.

Em causa parecia estar a nota de avaliação do Gil Vicente-Sporting da época anterior. Isto porque um árbitro perde as insígnias da FIFA quando em dois anos consecutivos fica abaixo do 12º lugar na classificação da época anterior da respetiva Federação.

Ora, Bruno Paixão tinha terminado a época 2011/12 no 14.º lugar, depois de na temporada anterior ter ficado no 17.º posto. Por isso, o árbitro de Setúbal recorreu do 14º, contestando a descida da nota do jogo Gil Vicente-Sporting (2-0), que aconteceu após os leões eliminarem o Man. City na Europa e em que Paixão foi acusado de prejudicar a equipa de Alvalade com um penálti contra mal assinalado.

O Sporting recorreu da avaliação do observador e o Conselho Técnico da Comissão de Arbitragem decidiu baixar a nota do árbitro de 3,4 para 2 valores. Esta alteração acabou por ter implicação na classificação do árbitro, que baixou de 8.º para 14.º lugar.

Bruno Paixão não voltou a apitar jogos internacionais. O último foi mesmo um Levski Sofia-FK Saravejo (1-0), no dia 19 de julho de 2021, a contar para a fase de qualificação da Liga Europa.

Paixão fica fora de um Benfica-Belenenses por erros de arbitragem nas jornadas anteriores

Em 2015, antes da 15.ª jornada do campeonato, o presidente da comissão de arbitragem da Liga manifestou-se preocupado com os erros de arbitragem que se tinham vindo a verificado nas competições profissionais. Luís Guilherme apelou a uma reflexão séria de todos os intervenientes, num dia em que a Liga prosseguiu a política de excluir do sorteio os juízes mais polémicos da ronda anterior. Desta vez ficava de fora Bruno Paixão, o árbitro do Benfica-Belenenses.

"Estamos muito preocupados com alguns erros que têm sido cometidos", afirmou o dirigente, acrescentando que o assunto está a ser debatido com os envolvidos, os quais, diz, "também não estão contentes".

Nessa lógica, o árbitro Bruno Paixão foi excluído do sorteio da 15ª jornada. A partida da Luz ficou marcada por vários momentos polémicos, entre os quais uma falta não assinalada de Simão sobre Wilson, num lance que antecede o penálti que resulta no único golo dos encarnados e desencadeia a expulsão de dois jogadores do clube do Restelo.

A exclusão do sorteio pretendia suscitar nos árbitros "alguma reflexão". Luís Guilherme explicava, na altura, a medida numa comparação com a gestão de uma equipa de futebol: "Quem não está em boa forma tem de reflectir uns tempos e voltar quando puder ser útil de novo à equipa".

Bruno Paixão e a acusação de atentado ao pudor

Tudo aconteceu num Académica-Imortal (2-1), em que Bruno Paixão acabou acusado de atentado ao pudor. A queixa partiu de duas agentes da PSP de Coimbra, destacadas para policiar o encontro, que garantiam que o árbitro passeou no balneário sem roupa perante o olhar incrédulo das mulheres-polícia. 

Segundo declarações do delegado distrital de Coimbra da Associação Sócio-Profissional de Polícia (APP), Pedro Caridade, Bruno Paixão “passeou todo nu dentro do balneário, exibindo ostensivamente por quatro ou cinco vezes as partes íntimas”.  

“De cada vez que a porta do balneário se abria para a entrada de delegados ao jogo, Bruno Paixão expunha-se deliberadamente para as polícias, exibindo os órgãos sexuais”, acrescentou Pedro Caridade, em declarações à agência Lusa. 

Mas as acusações a Bruno Paixão não ficam por aqui. Segundo a PSP de Coimbra, o árbitro terá dito ainda ao comandante no local que poderia dispensar os serviços dos agentes masculinos, mas as duas mulheres-polícia poderiam ficar. 

Perante a insólita situação, as duas agentes expuseram o caso ao comando distrital de Coimbra e podem mesmo apresentar uma queixa-crime contra o árbitro de Setúbal, de 26 anos. 

Em comentário a toda a polémica, Bruno Paixão garantiu que não ofendeu ninguém e garantiu que, caso fosse apresentada uma queixa por atentado ao pudor, avançará ele próprio com um outro processo em tribunal por difamação. O caso seguiu agora para investigações e acabou por cair no esquecimento.

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