Se um país ficar submerso continua a existir como Estado ou não? E onde, como? “É uma situação sem precedentes para o direito internacional”

6 jul 2023, 19:56
Tuvalu (	Alastair Grant/AP)

A discussão está em curso porque há mesmo países em risco de ficarem submersos

Tuvalu, Ilhas Cook e Papua Nova-Guiné são três dos 18 países que integram o Fórúm das Ilhas do Pacífico. Esta organização representa muitos dos Estados mais vulneráveis à subida da água do mar - alguns correm até o risco de ficar submersos durante este século. Esta organização pretende realizar uma campanha diplomática para garantir que a soberania de um Estado mantém-se mesmo após o território ficar submerso, segundo o jornal britânico Guardian

Aliás, estas ilhas já estão a ser afetadas pelo fenómeno da submersão, com as suas linhas costeiras a serem lentamente redesenhadas e reduzidas. Nas próximas décadas prevê-se que alguns arquipélagos percam os seus atóis periféricos e daqui a um século estima-se que Estados inteiros possam ficar submersos, visto que as inundações e a erosão das costas vão aumentar significativamente até ao final do século. Estas conclusões surgem num relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), que levanta ainda a seguinte questão: o que vai acontecer com os cidadãos, os governos e os recursos destes países? A resposta não é clara. 

O que diz o direito internacional?

Um jovem a atravessar as águas enquanto Funafuti, a capital de Tuvalu, é inundada durante uma das marés mais altas (Ashley Cooper / Getty Images)

O Banco Mundial confirmou que os atuais regulamentos sobre a definição de Estado e o que constitui o mesmo foi desenvolvido num período de estabilidade climática e pode ter de ser reavaliado, uma vez que é “uma situação sem precedentes para o direito internacional”, escreve o Guardian.

Simon Kofe, ministro da Justiça, Comunicação e dos Negócios Estrangeiros de Tuvalu, já lamentou o facto de o direito internacional não proteger o futuro das ilhas insulares, uma vez que requer quatro critérios: território físico, população, governo e a capacidade de entrar em relação com outros Estados. E um dos critério pode ficar em causa daqui a pouco tempo - a existência de território físico. "Tuvalu pode perder o seu estatuto de Estado se perdêssemos o nosso território físico ou se fôssemos obrigados a mudar para um local diferente. Gostaríamos que o mundo continuasse a reconhecer o nosso estatuto de Estado como sendo permanente."

"A primeira nação digital do mundo"

Face às ameaças à integridade física do território destes Estados, a proteção dos seus direitos legais tornou-se numa prioridade. Em 2020, o Fórum das Ilhas do Pacífico apelou a que fossem dadas garantias internacionais para que as zonas marítimas existentes e os recursos nelas contidos continuem a pertencer ao Estado soberano que lá se encontrava, mesmo que o território terrestre sofra erosão, dá conta o Guardian.

A este nível, Tuvalu lançou um esforço diplomático para que outras nações reconheçam o seu estatuto de Estado, independentemente dos impactos das alterações climáticas. Além de garantir a existência de um Estado, e que os recursos desse território pertençam à sua população, vários Estados consideram que é necessário garantir que os membros da comunidade mantêm os seus direitos legais e a sua coesão cultural, escreve o Guardian.

Mas o esforço para garantir a soberania não termina aqui. Tuvalu quer tornar-se “a primeira nação digital do mundo”, disse Simon Kofe na COP27. O objetivo é criar um gémeo digital de Tuvalu - do seu território, das suas gentes e da sua cultura -, assim digitalizar “o sistema administrativo do Governo, os documentos históricos, os vídeos de práticas culturais”, lê-se no site do governo.

Esta iniciativa integra o projeto Future Now - e, de acordo com a revista The Conversation, o “gémeo digital de Tuvalu” vai surgir em metaverso, isto é, na realidade virtual e aumentada.

"A nossa nação digital proporcionará uma presença digital que substituirá a nossa presença física e permitir-nos-á continuar a funcionar como um Estado", diz Simon Kofe. Que deixa um alerta: "Sem uma consciência global e um compromisso global, é possível que o resto do mundo se junte a nós em breve".

O Banco Mundial sugeriu ainda que se faça uma fusão com outros Estados, como aconteceu com Zanzibar e Tanganica em 1964, para formar a Tanzânia, relata o Guardian. 

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