Portugal "não se pode dar ao luxo" de ceder água do Alqueva a Espanha

Agência Lusa , DA
31 out 2023, 12:44
No limite

Agricultores do Alentejo recusam-se a ceder água do Alqueva a Espanha. Isto depois do parlamento regional da Andaluzia, em Espanha, aprovar uma “proposta não legislativa”, solicitando água do Alqueva devido à seca

Portugal “não se pode dar ao luxo” de entregar água da albufeira do Alqueva, no Alentejo, aos agricultores espanhóis porque os portugueses também precisam, devido à seca, defendeu esta terça-feira o presidente de uma associação do setor.

Diogo Vasconcelos, que preside à Associação dos Jovens Agricultores do Sul (AJASUL), disse à agência Lusa encarar com preocupação as notícias que dão conta de que o parlamento regional da Andaluzia, em Espanha, aprovou uma “proposta não legislativa”, ou seja, uma recomendação, solicitando água do Alqueva devido à seca.

Essa pretensão de fazer chegar à Andaluzia água do Alqueva, nomeadamente do rio Guadiana a jusante da barragem, também já foi manifestada por agricultores da região espanhola.

“Não percebo porque é que havemos de ceder a pouca água armazenada que temos, num dos poucos sítios que temos para a armazenar, aos agricultores espanhóis, quando os portugueses também têm falta de água”, contrapôs Diogo Vasconcelos.

Assinalando que Portugal também enfrenta “um período de seca muito grande”, com “tanta falta de água e de capacidade de armazenamento”, o dirigente associativo considerou que o país “não se pode dar ao luxo” de ceder ou vender a que tem armazenada.

“Espero que não passe apenas de uma notícia”, sublinhou, argumentando que a cedência ou venda aos espanhóis “não vai resolver o problema de falta de água no país, mas agravá-lo”.

Em Portugal, os efeitos das alterações climáticas “são reais”, ou seja, “chove menos e menos vezes”, pelo que fazem falta “transvazes, barragens e uma série de investimentos para enfrentar” as secas.

Considerando que “os espanhóis instalaram mais regadio do que aquilo que podiam regar”, o presidente da AJASUL realçou que os agricultores do país vizinho, tal como os portugueses, deparam-se com “a falta de capacidade de armazenamento”.

Diogo Vasconcelos acrescentou que a eventual entrega de água do Alqueva aos agricultores espanhóis é também “uma questão de defesa nacional”, pois, perante uma possível “falta de água grave no Alentejo, a única solução é o Alqueva”.

“A barragem do Monte Novo, que abastece Évora, é fornecida por Alqueva e, se não houvesse Alqueva, não havia água em Évora com anos como estes”, exemplificou.

Contactado esta terça-feira pela Lusa, o Ministério do Ambiente e da Ação Climática (MAAC) respondeu, através de correio eletrónico, não ter recebido, “até à data, qualquer pedido” de Espanha sobre a captação de água do Alqueva.

“Portugal tem em curso com Espanha uma negociação para a definição do regime de caudais na secção de Pomarão no rio Guadiana”, isto é, a jusante da barragem e no troço do rio no concelho de Mértola, distrito de Beja.

O presidente da Empresa de Desenvolvimento e Infraestruturas do Alqueva (EDIA), José Pedro Salema, indicou à Lusa, no dia 16 deste mês, que a albufeira alentejana tem água suficiente para entregar aos vizinhos espanhóis, mas avisou que “a manta é curta” e a que for transferida já não volta.

“A água não se multiplica. Se for para um lado, há menos garantia de que fica para servir clientes no futuro. A manta é curta. Ou tapa os pés ou a cabeça”, afirmou, então, o responsável.

O parlamento da Andaluzia aprovou uma proposta para a transferência dos direitos da água dos utentes do Alqueva para os utentes da bacia hidrográfica Tinto-Odiel-Piedras e Chanza, no âmbito da cooperação entre Portugal e Espanha, devido à situação de seca extrema que enfrenta o setor agrícola na zona de Huelva, noticiou o jornal Público, em meados deste mês.

A AJASUL, com sede em Évora e polos em Reguengos de Monsaraz e Portel, tem cerca de 1.000 associados, quase todos no distrito de Évora.

"A água que está disponível para agricultura na nossa região não chega"

O presidente da Federação das Associações de Agricultores do Baixo Alentejo (FAABA) disse não ver “com bons olhos” a eventual cedência de água do Alqueva a Espanha devido à seca, vaticinando prejuízos para a lavoura alentejana.

“Não vejo, à partida, essa pretensão com bons olhos. Tem de haver muitas conversas e […] tenho algumas reticências” sobre essa possibilidade, disse hoje à agência Lusa Rui Garrido, presidente da FAABA, que tem sede em Beja.

O dirigente falava à Lusa a propósito de notícias publicadas em Portugal que dão conta de que o parlamento regional da Andaluzia, em Espanha, aprovou uma “proposta não legislativa”, ou seja, uma recomendação, solicitando água do Alqueva devido à seca.

Essa pretensão de fazer chegar à Andaluzia água do Alqueva, nomeadamente do rio Guadiana a jusante da barragem, também já foi manifestada por agricultores da região espanhola.

Rui Garrido lembrou que os agricultores espanhóis “têm mais do dobro das captações na bacia do Guadiana” do que os agricultores portugueses.

“Segundo ouvi dizer, eles têm a área regada muito pelas ‘pontas’ e uma área muito grande para a água que têm. Portanto, é preciso que venham sempre anos muito temperados para aquilo dar”, argumentou.

O presidente da FAABA disse ainda que Portugal até podia ser solidário com Espanha nesta matéria, mas não se pode “esquecer que o ano passado ou há dois anos [os espanhóis] queriam cortar a água do caudal ecológico para Portugal no Douro”.

“Quem não se sente não é filho de boa gente”, frisou.

Na opinião de Rui Garrido, a pretensão espanhola poderia igualmente colocar em causa a agricultura alentejana que é beneficiada pelo Alqueva, cuja quota anual é de “590 milhões” de metros cúbicos de água e, ester ano, “se não foi ultrapassada, está à beira de ser ultrapassada”.

“Portanto, a água que está disponível para agricultura na nossa região já não chega e temos de renegociar mais água. Ou com a EDP ou fazer mais barragens para captar mais água”, afirmou.

“Portugal tem em curso com Espanha uma negociação para a definição do regime de caudais na secção de Pomarão no rio Guadiana”, isto é, a jusante da barragem e no troço do rio no concelho de Mértola, distrito de Beja.

O presidente da Empresa de Desenvolvimento e Infraestruturas do Alqueva (EDIA), José Pedro Salema, indicou à Lusa, no dia 16 deste mês, que a albufeira alentejana tem água suficiente para entregar aos vizinhos espanhóis, mas avisou que “a manta é curta” pelo que “ou tapa os pés ou a cabeça”, e a que for transferida já não volta.

O parlamento da Andaluzia aprovou uma proposta para a transferência dos direitos da água dos utentes do Alqueva para os utentes da bacia hidrográfica Tinto-Odiel-Piedras e Chanza, no âmbito da cooperação entre Portugal e Espanha, devido à situação de seca extrema que enfrenta o setor agrícola na zona de Huelva, noticiou o jornal Público, em meados deste mês.

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