Parpública afirma que a compra de ações dos CTT cumpriu os "requisitos legais"

CNN Portugal , MJC
3 jan, 19:32

Bloco de Esquerda e PCP recusam insinuações de que a compra das ações seria exigência para a constituição da Geringonça. Governo queria adquirir 13% dos CTT. Parpública confirma aquisição de 0,24%, revela o parecer favorável da Unidade Técnica de Acompanhamento e Monitorização do Setor Público Empresarial e despacho do então ministro das Finanças, João Leão, e afirma que a aquisição não foi noticiada "para evitar perturbações indevidas da cotação destes títulos no mercado"

A Parpública confirma que detém 355.126 ações dos CTT que foram adquiridas em bolsa em 2021, o que corresponde a 0,24% do capital da empresa.

Em comunicado, a Parpública, que é a sociedade do Estado que gere as participações em empresas, confirma as notícias publicadas esta quarta-feira, que davam conta da aquisição, mas explica que "a compra de ações dos CTT pela Parpública, realizada até outubro de 2021, ocorreu no cumprimento dos requisitos legais, designadamente o despacho do então ministro das Finanças, precedido do parecer prévio da UTAM" - Unidade Técnica de Acompanhamento e Monitorização do Setor Público Empresarial. 

No documento da UTAM, disponibilizado agora pela Parpública, é referido que lhe foi solicitado um parecer, em 18 de fevereiro de 2021, pelo gabinete do secretário de Estado do Tesouro acerca da operação de aquisição pela Parpública "de participação qualificada de até 13% nos CTT – Correios de Portugal". O parecer favorável foi emitido a 22 de fevereiro de 2021. A compra foi autorizada pelo então ministro das Finanças, João Leão, de acordo com o decreto de 17 de agosto de 2021, também revelado agora pela empresa.

"Para evitar perturbações indevidas da cotação destes títulos no mercado, estes documentos foram considerados informação reservada pelo Ministério das Finanças, à época", explica a Parpública, justificando assim o facto de a compra não ter sido divulgada na altura. No seu relatório e contas, não divulgou esta posição nos CTT individualmente, integrando no conjunto de pequenas posições). "Tendo o despacho cessado os seus efeitos no primeiro semestre de 2022, e decorridos mais de dois anos desde a última aquisição de ações dos CTT, os documentos podem agora ser tornados públicos por determinação do Ministério das Finanças."

A intenção do Governo não seria a constituição de uma posição maioritária, mas apenas uma participação que permitisse ao Estado ter influência nas decisões da empresa, a única capaz de prestar o serviço postal universal, criando uma situação de dependência para o Estado. “A intervenção do Estado através de uma participação no capital social da empresa configura, assim, um meio para influenciar o mais adequado cumprimento dos índices de qualidade exigidos para o serviço postal, designadamente ao nível de regularidade e de prazos de entrega, assegurando também que estes serviços se encontram acessíveis em todos os Concelhos do país (incluindo as Regiões Autónomas)”, argumenta o Governo, citado no parecer da UTAM.

"Posto isto, e dado que se trata de uma decisão fundamentada do Governo, considera a UTAM que se encontra suficientemente justificado o interesse (público) na realização da operação de aquisição de participação social em causa", diz o parecer da UTAM, que autorizou uma "participação qualificada de até 13% nos CTT – Correios de Portugal, S.A. (“CTT”)". 

O despacho do governante previa uma aquisição faseada de ações, para a constituição de uma posição até ao limite da obrigação de comunicação ao mercado, que na altura era de 2% do capital. A intenção era manter as operações em sigilo, evitando que o conhecimento da intenção do Governo levasse as ações a disparar, obrigando a pagar um preço mais alto. O diploma também impunha limites de preço para a compra dos títulos ("Não poderão ser adquiridas ações a uma cotação superior a 4,75€"), justamente para haver um teto ao que o Estado iria gastar. Limites esses que acabaram por dificultar as intenções do Governo, segundo explicou o jornal ECO.

Os CTT iniciaram 2021 com uma cotação de 2,35 euros por ação, mas os títulos encetaram um forte movimento de valorização a partir de março, levando a cotação a mais do que duplicar (122%) até ao máximo de 5,21 euros registado a 12 de julho. Acabariam por recuar nos meses seguintes, mas não de forma substancial, fechando o ano nos 4,555 euros.

O Governo acabaria por cair em outubro com o chumbo do Orçamento do Estado, levando à realização de eleições antecipadas em janeiro de 2022. A compra de ações dos CTT acabou por não ter sequência com o novo Executivo socialista de maioria absoluta.

Compra dos CTT foi exigência da Geringonça?

A decisão de avançar para a compra de ações coincidiu com exigências do Bloco de Esquerda e PCP para uma reversão da privatização e também com a negociação da nova concessão do serviço postal universal. 

De acordo com o Jornal Económico, esta "compra teve lugar após exigências do Bloco de Esquerda para aprovar o Orçamento do Estado para 2021".

O PSD e a Iniciativa Liberal já tinham desafiado esta quarta-feira António Costa a explicar a decisão do Governo de ter ordenado que a Parpública adquirisse acções dos CTT entre 2020 e 2021.

Hugo Soares, secretário-geral do PSD, pediu ao primeiro-ministro que divulgasse o despacho do Ministério das Finanças e exifiu explicações sobre o envolvimento de Pedro Nuno Santos, atual secretário-geral do PS e à data ministro das Infra-Estruturas com a tutela das telecomunicações, no processo. Em declarações aos jornalistas, o social-democrata cirticou o "processo envolto em obscuridade".

Na rede social X, o líder da IL, Rui Rocha, questionou o papel de Pedro Nuno Santos, que "foi durante vários anos o elemento de ligação entre o Governo e os partidos que integraram a 'geringonça'", uma "solução política de que é entusiasta e que admite reeditar".

No entanto, o Bloco de Esquerda, através da sua coordenadora, Mariana Mortágua, e do líder parlamentar, Pedro Filipe Soares, já veio negar ter tido conhecimento dessa compra de ações ou ter feito qualquer negociação com o Governo da altura nesse sentido.

Também a líder parlamentar do PCP afirmou que o partido foi informado da compra de ações dos CTT pela Parpública: “Foi-nos dada essa informação, mas como referimos, nunca considerámos relevante, nem nunca considerámos que correspondesse aquilo que é necessário”, afirmou Paula Santos em declarações aos jornalistas no parlamento. Para o PCP, “o que se impunha é o controlo público dos CTT”.

Por outro lado, o atual secretário-geral do PS, Pedro Nuno Santos, negou ter dado orientações ao Ministério das Finanças ou à Parpública para a compra de ações dos CTT, enquanto ministro das Infraestruturas, e remeteu explicações sobre esta matéria para o Governo. "Eu tutelava a pasta, mas não sou eu que dou orientações ao ministro das Finanças e à Parpública", afirmou Pedro Nuno Santos, acrescentando: "Não há orientação do Ministério das Infraestruturas nem do ministro das Infraestruturas".

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