“Por favor, não comuniquem que esta medida nos vai salvar”, apela Associação de Escolas de Saúde Pública da Europa

21 dez 2021, 22:20
Testes covid-19

Perante uma nova e ainda não totalmente conhecida variante, a comunicação assume um papel determinante no combate à propagação do vírus. À CNN Portugal, o professor Henrique Lopes, membro da Associação de Escolas de Saúde Pública da Europa, alerta para a importância de parar de dizer que uma medida irá ditar, por si só, o fim da pandemia. Até mesmo a vacina

“Não são vacinas em vez de máscaras. Não são vacinas em vez do distanciamento. Não são vacinas em vez da ventilação ou da higiene das mãos.” O alerta é feito pela Associação de Escolas de Saúde Pública da Europa (ASPHER - sigla da associação em inglês), da qual faz parte Henrique Lopes, coordenador científico da Unidade de Saúde Pública do ICS/UCP.

Na declaração ‘COVID-DO-IT-ALL’ We need Integrated Protection Systems and Strategies Against Omicron and other COVID-19 variants [‘COVID-DO-IT-ALL’
Precisamos de sistemas integrados de proteção e estratégias contra Ómicron e outras variantes da covid-19, em tradução livre], já enviada para o escritório regional para a Europa da Organização Mundial da Saúde (OMS) e para a ECDC (Centro Europeu de Prevenção e Controlo das Doenças), a ASPHER fala da importância de melhorar a comunicação junto da população e de adotar um conjunto de medidas de mitigação contra a covid-19, medidas essas que devem ser aplicadas num sistema integrado e não de forma isolada.

“A existência de uma medida não dispensa que haja as outras”, começa por dizer à CNN Portugal Henrique Lopes, membro da ASPHER.

“Verificamos que a comunicação tem sido o ponto frágil de ligação entre os governos europeus e das população da Europa”, lamenta o especialista, que dá exemplos concretos: “Com a chegada das máscaras dizia-se que a pandemia ia ficar controlada, o que não aconteceu; na terceira vaga foi o tracking [como a aplicação móvel StayAway Covid], mas não resultou; veio outra onda [de covid-19], onde se dizia que tínhamos testes capazes e também não resultou; a partir de janeiro deste ano foi a questão das vacinas, vamos vacinar e acaba [a pandemia], mas não acabou.”

Para o especialista, a forma como o vírus “tem sido comunicado às pessoas” é um dos erros mais flagrantes da pandemia e resulta da falsa ideia de que uma medida vem substituir a outra, quando, na verdade, devem ser comunicadas e aplicadas em conjunto, referindo-se à vacinação, ao uso de máscara, à ventilação dos espaços, à higienização das mãos e ao distanciamento físico.

“A nossa posição [da ASPHER] é um statement [declaração] europeu e o que dizemos é ‘por favor, não comuniquem que esta medida nos vai salvar’”, destaca Henrique Lopes.

O especialista em saúde pública destaca que as medidas até agora aplicadas “foram corretas”, mas frisa que ficou por transmitir às pessoas “que as medidas não são alternativas, mas sim cumulativas” e que não se deve “fazer promessas às pessoas que a seguir não possamos cumprir”, até porque, reforça, “a falsa sensação de segurança vai induzir a comportamentos de risco”.

Ao longo de oito páginas, os peritos europeus em saúde pública apelam a uma melhor comunicação junto da população. “Mais do que impor, o que temos de dar é educação para que as pessoas de livre iniciativa saibam o que devem fazer e o porque é que devem fazer”, destaca Henrique Lopes.

Chegada da Ómicron exige mais precisão na comunicação

Sobre as dúvidas que pairam junto das pessoas relativamente à eficácia das medidas, sobretudo da vacina, Henrique Lopes não hesita em dizer que tem “a certeza absoluta de que a má comunicação contribuiu” para a desinformação, sobretudo após a chegada de uma nova variante, sobre a qual só há ainda uma certeza: é preciso combater o quanto antes.

“Temos o inverno à porta, o vírus não parece ser sensível às ciclicidades climatéricas, mas nós somos, fechamos as casas e arejamos menos”, diz, voltando a salientar a importância da adoção conjunta de várias medidas de mitigação.

Sobre a Ómicron, o especialista diz que, “para já, não parece ser mais complicada, mas é mais transmissível, e isso representa mais uma ameaça a somar a todas as outras”. Embora defenda que ainda é necessário “esperar duas a três semanas” para que se consiga medir os reais impactos desta nova variante, Henrique Lopes volta a frisar que “tem de se parar de propôr o 'one best way', temos de começar a propor às pessoas educá-las, isto [as medidas] não são ferramentas mágicas que vão eliminar a doença, não dão garantia de que vai passar”.

Relativamente à vacinação, o especialista defende a sua eficácia, mas descarta que seja a única solução contra a pandemia. “[Com a vacina] há muito menor probabilidade de ficar contagiado, a probabilidade de hospitalização é menor e mesmo que vá parar à unidade de cuidados intensivos, a pessoa tem menos probabilidade de morte, mas a vacinação só funciona se não facilitarmos de outras formas, tal como ter o cinto não nos dispensa de conduzirmos com cuidado”, exemplifica.

“Se for possível sensibilizar fortemente as pessoas disto, nada impede que o cenário vá melhorar, mas melhora. Se as pessoas entenderem por engano que a situação está ultrapassada, que a vacina protege irreversivelmente, vamos ter um inverno muito complicado”, conclui.

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