COP28 foge à semântica mas concorda em reduzir produção e consumo de combustíveis fósseis

11 dez 2023, 13:43
Cimeira COP28 no Dubai

Governos vão ter de reunir para chegarem a uma conclusão comum

A COP28 conseguiu acordar a redução de produção e consumo de combustíveis fósseis até 2050, seguindo os pareceres científicos que tinham sido apresentados na cimeira das Nações Unidas.

No entanto, e numa resolução que pode ficar aquém das expectativas, o projeto evita os termos “eliminação progressiva” ou redução progressiva”, que eram os principais temas de discórdia na cimeira que reuniu vários líderes mundiais no Dubai, Emirados Árabes Unidos.

O texto compromete-se a "reduzir o consumo e produção de combustíveis fósseis de uma forma ordeira e equitativa para atingir a neutralidade carbónica até, antes ou por volta de 2050 em paralelo com a ciência".

Apesar da referência direta à ciência, o texto não explicita o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), que pretende um papel quase nulo para os combustíveis fósseis por aquela altura.

"A presidência da COP28 foi clara sobre as suas ambições desde o início. Este texto reflete essas ambições e um grande passo em frente. Agora está nas mãos das partes, em quem confiamos para fazerem o melhor para a Humanidade e o planeta", afirmou o porta-voz da cimeira.

Ainda assim, e apesar da questão semântica, este acordo exige uma redução da produção de combustíveis fósseis alcançando os mesmos objetivos de uma redução progressiva, ainda que sem utilizar a linguagem que vários países criticaram.

No que se refere ao carvão, o texto apela a uma "rápida redução sem captura de carbono", mas também a "limites às autorizações concedidas para novas centrais elétricas a carvão" sem captura de dióxido de carbono.

Um parágrafo do texto de 21 páginas cita também as tecnologias de "baixas emissões", incluindo a nuclear, a captura de carbono e o hidrogénio de "baixo carbono", "para aumentar os esforços de substituição dos combustíveis fósseis ininterruptos nos sistemas energéticos".

Esta formulação faz eco da declaração conjunta de Sunnylands, assinada em novembro pela China e pelos Estados Unidos. 

Os dois maiores emissores mundiais de gases com efeito de estufa (41% entre eles) evitaram falar de "eliminação progressiva" dos combustíveis fósseis, mas sublinharam que as energias renováveis (solar, eólica, entre outras) devem substituí-los gradualmente.

À medida que os negociadores e os observadores iam desvendando o texto, começaram a surgir reações do Dubai, desde as moderadas às indignadas.

"As nossas vozes não estão a ser ouvidas" e o projeto é "totalmente inadequado" no que se refere à questão dos combustíveis fósseis, denunciou o ministro do Ambiente da Samoa, Cedric Schuster, que preside à Aliança dos Pequenos Estados Insulares (Aosis).

O texto "representa um grande retrocesso em relação às versões anteriores", afirmou Harjeet Singh, diretor de estratégia política global da CAN, que representa mais de mil associações e participa nos trabalhos da COP como observador.

"Surpreendentemente, já não inclui qualquer texto explícito sobre a eliminação progressiva dos combustíveis fósseis", acrescentou Singh.

Andreas Sieber, da ONG 350.org, também criticou as propostas por serem "mais fracas" do que as anteriores.

"As nações comprometidas com a ação climática devem rejeitar esta proposta enfraquecida e insistir em mudanças transformadoras para ter um efeito significativo nas alterações climáticas", afirmou.

Uma fonte dos negociadores europeus, contactada pela AFP, considera que o texto "está longe do que o clima precisa atualmente". 

“Uma coisa é certa: não chegaremos lá até às 11:00 de terça-feira", hora a que o Sultão al-Jaber pretende encerrar a COP28.

Li Shuo, do grupo de reflexão Asia Society, salienta que o texto já não inclui diferentes opções, mas está numa forma final, ao contrário das três versões anteriores, o que sugere que o presidente da COP28, al-Jaber, está a apresentar um compromisso do tipo "pegar ou largar".

"Estamos numa corrida contra o tempo", afirmou o secretário-geral da ONU, António Guterres, no início deste dia interminável, apelando aos países para que demonstrem "flexibilidade máxima" para evitar uma grande desilusão na terça-feira.

Guterres foi muito claro: a Cimeira do Clima COP28 deve apelar a uma "eliminação progressiva dos combustíveis fósseis", mas "isto não significa que todos os países tenham de eliminar os combustíveis fósseis ao mesmo tempo". 

Por outras palavras, os países ricos devem dar o exemplo e ajudar os países mais pobres a financiar as suas centrais solares ou a eletrificação das suas fábricas.

"Não temos um minuto a perder nesta reta final crucial", avisou Simon Stiell, diretor da ONU Clima, afirmando que "os níveis mais elevados de ambição são possíveis" nos dois temas inseparáveis que estão no centro das últimas conversações: o fim do petróleo, do carvão e do gás, por um lado, e os dólares de que os países pobres precisam para se desenvolverem sem combustíveis fósseis, por outro.

"Não podemos sair do Dubai sem termos uma ideia clara de como os nossos países vão ser apoiados na transição energética", disse à AFP Madeleine Diouf Sarr, do Senegal, a presidente cessante do grupo dos Países Menos Avançados (PMA).

Os representantes da União Europeia nas negociações da cimeira do clima rejeitaram a proposta da presidência da COP28, considerando que o texto contém elementos que “são completamente inaceitáveis”.

A posição foi assumida pela ministra espanhola Teresa Ribera e o comissário neerlandês Wopke Hoekstra cerca de duas horas após ter sido divulgada a proposta de texto do ‘Global Stocktake’ (primeiro balanço que está a ser feito do Acordo de Paris) dos Emirados Árabes Unidos, que presidem à 28.ª Conferência das Nações Unidas sobre o Clima (COP28).

“Há elementos neste texto que são completamente inaceitáveis”, afirmou, em declarações aos jornalistas, Teresa Ribera, ministra da Transição Ecológica e do Desafio Demográfico, que está a representar a União Europeia nas negociações.

 Teresa Ribera referia-se, em concreto, à questão dos combustíveis fósseis, uma vez que na nova redação há o apelo à redução do consumo e da produção de combustíveis fósseis, mas o texto deixa de referir a palavra "saída" dos combustíveis fósseis.

“É claramente insuficiente e desadequado para responder àquilo que estamos aqui a tratar. E não é porque a União Europeia quer, é porque os cientistas são claros sobre o que é preciso. No tomo dessa lista está o fim dos combustíveis fósseis”, sublinhou, por sua vez, o comissário europeu para a Ação Climática, Wopke Hoekstra.

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