Exclusivo: Presidência da República omitiu origem da informação que enviou ao primeiro-ministro sobre as gémeas

19 jan, 21:29

Carta sobre o caso das gémeas que saiu de Belém é muito diferente de outras. A Presidência da República justifica-se e diz que pretendia evitar tratamento diferenciado do governo

A carta da Presidência da República enviada para o gabinete do primeiro-ministro sobre o caso das gémeas, com informação que o próprio Marcelo Rebelo de Sousa revelou que lhe foi enviada pelo filho, omite a origem da informação.

Depois de muita insistência e de uma queixa na Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA), o Exclusivo da TVI teve acesso às seis cartas com origem na Casa Civil da Presidência da República encaminhadas pelo gabinete do primeiro-ministro para o Ministério da Saúde a 5 de novembro de 2019, sendo que apenas uma se refere à situação das gémeas luso-brasileiras a residir no Brasil, com atrofia muscular espinhal, cuja família pretendia que fossem tratadas em Portugal com aquele que na altura era o medicamento mais caro do mundo.

Estas mesmas cartas ou missivas foram referidas pela ex-ministra da Saúde, Marta Temido, numa entrevista a 30 de novembro ao Público e à Rádio Renascença.

A antiga governante sublinhava que estes pedidos vindos da Presidência da República eram comuns e a prova era que nesse mesmo dia o ministério tinha recebido mais cinco casos além do pedido da família das gémeas.

Seis pedidos. Um sem subscritor

Os documentos consultados pela TVI, encaminhados pelo Ministério da Saúde - mais de um mês depois de ter dado esse mesmo acesso, ao abrigo da lei da transparência, à antiga ministra -, confirmam os seis pedidos. Contudo, há uma diferença na missiva sobre as gémeas.

Ao contrários das outras cinco missivas da Casa Civil da Presidência da República, onde consta um “subscritor” do pedido que chegou a Belém e a referência a um anexo com o respectivo e-mail ou carta original do referido subscritor, a missiva sobre as gémeas assume uma forma distinta: em momento algum se revela a fonte da informação, nem se diz (ao contrário das outras cinco missivas) quem que foi o subscritor.

A explicação sobre o caso das crianças surge num texto entre aspas, apenas identificado como informação “recebida nesta Casa Civil”, colocado na própria missiva enviada pela Presidência e não no habitual anexo com um e-mail ou uma carta do subscritor.

A missiva termina com os contactos de e-mail e telemóvel dos pais das crianças e os anexos que chegaram ao Ministério da Saúde estão reservados para os cartões de cidadão das gémeas e dois relatórios clínicos.

Marcelo confirmou intervenção do filho

Recorde-se que depois de ter dito que não se lembrava da intervenção do filho neste caso e de ter garantido que o mesmo chegou a Belém sem ser por si próprio, no início de dezembro o Presidente da República fez uma comunicação ao país onde confirmou que após uma pesquisa aprofundada nos servidores da Presidência concluiu que o caso lhe tinha chegado através de um e-mail do  filho, que Marcelo Rebelo de Sousa encaminhou para a sua Casa Civil com o objetivo de se perceber o que se passava, à semelhança do que faz em tantos outros casos.

Os contactos da Casa Civil e da assessora da presidência para os assuntos sociais com o Hospital de Santa Maria tiveram um resultado que o próprio Marcelo classificou como negativo para a família.

Belém confirma omissão, mas justifica

Questionado há mais de uma semana sobre a diferença visível nas missivas da sua Casa Civil, a Presidência da República respondeu esta sexta-feira à TVI, confirmando a omissão e dizendo que o fez de propósito para evitar que o governo tivesse um tratamento diferenciado.  
Segundo a mesma nota, o objetivo foi “evitar uma eventual interpretação deturpada e abusiva, em particular qualquer tratamento diferenciado dado o parentesto”.

“Foi deliberadamente omitido desta transmissão ao chefe de gabinete do primeiro-ministro a identificação de quem tinha feito a solicitação à Presidência da República, tendo sido transcrito na carta o conteúdo do e-mail (e não anexado)", refere a Presidência da República.

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