"No Brasil há o risco real de os militares sentirem que têm de intervir"

8 jan 2023, 23:02

Depois da invasão da praça do poder em Brasília, o politólogo José Filipe Pinto admite que o cenário de um golpe de Estado não está afastado. Tudo depende da capacidade de Lula da Silva controlar a situação, sendo certo, diz, que o "violento discurso" do presidente não ajudou

A invasão do centro do poder em Brasília por apoiantes radicais de Jair Bolsonaro e o consequente discurso de Lula da Silva mostram um Brasil dividido a viver sob o perigo de um golpe de Estado. Quem o garante é o politólogo e especialista em populismos José Filipe Pinto. “O país está dividido. A razão institucional está do lado de Lula da Silva”, começa por dizer o especialista, notando, no entanto, que o discurso de Lula, “virulento, politizado e ofensivo”, pode ter efeitos mais preocupantes. “Ele fez um discurso emotivo de revolta. Falou em genocídio e falou em organização e financiamento destes atos dos apoiantes de Bolsonaro o que quer dizer que é uma campanha orquestrada”, nota, esclarecendo que muitos dos militares comungam das ideias de extrema-direita”.        

Para José Filipe Pinto, o discurso de Lula aumenta o risco de dividir ainda mais o país. “Há dois populismos, o de Bolsonaro, que é cultural e identitário, e o de Lula da Silva, que é económico e social. Não há uma terceira via”. De acordo com o politólogo, estes dois populismos têm-se enfrentado nos últimos anos: “As instituições são postas em causa pela força derrotada”, mas no caso do populismo dos bolsonaristas estes têm como uma das suas caraterísticas o apelo à intervenção dos militares: “Assistimos à manifestação de apoio a Bolsonaro ao pé dos quarteis a apelaram aos militares que tomem conta do processo”. Sublinhando que os populismos cultural e identitário vivem muito de símbolos nacionais, José Filipe Pinto avisa que no Brasil há o risco de os apoiantes de “Bolsonaro começarem a transformar as Forças Armadas num símbolo de unidade apelando ao seu regresso ao poder”.

Próximos dias decisivos

Mas há o perigo de um golpe de Estado no imediato? O politólogo acredita que Lula da Silva vai conseguir controlar a situação, pelo menos numa primeira fase, até porque avançou com o decreto da intervenção federal. Decreto este que estipula que “durante três semanas a segurança de Brasília é garantida pela governo federal e não estadual. “Tem de se esperar e ver se Lula consegue normalizar a situação. Ou se pelo contrário os focos de manifestação continuam e a partir daí as instituições deixam de funcionar, os brasileiros vêem as suas vida afetadas e assiste-se a uma quebra da autoridade. Aí as Forças Armadas vão intervir”, acredita o especialista.  “No Brasil há o risco real de os militares sentirem que têm de intervir”.

 Os próximos tempos, diz, serão difíceis, havendo o risco de desequilíbrio e instabilidade por todo o lado. “Em Brasília, onde agora está em vigor o decreto, o governador é um bolsonarista”, repara José Filipe Pinto, explicando que em breve se perceberá quantos dos 49% dos que votaram Bolsonaro se revêem neste tipo de comportamento.  

Frisando que durante a campanha Lula da Silva tentou captar os empresários e as chefias dos militares por saber que seriam essenciais para a estabilidade do seu mandato, José Filipe Pinto alerta que o discurso violento de Lula não ajudou, garantindo que se os comportamentos dos manifestantes são irracionais, a motivação que leva a estes atos não tem nada de irracional. “Têm um objetivo que é anular o ato eleitoral.”

 

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