opinião
Especialista em Ciência Política e Relações Internacionais: Segurança e Defesa, do Centro de Investigação do Instituto de Estudos Políticos (UCP). Jurista, foi jornalista de Política Internacional e é consultora em Public affairs e Comunicação

A errada cobertura dos vândalos com tintas

16 dez 2023, 10:30

O espaço público encheu-se de eufemismos entre os quais chamar ativistas aos vândalos que destroem a propriedade privada e a propriedade pública, a memória histórica e os legados artísticos e culturais dos países que os geraram. 

Esses vândalos, ostentando pseudo-ideais ou apenas ansiedades wokistas, vivem, tal como os terroristas, do espaço mediático que lhes dão de bandeja, e assim vão conseguindo os seus objetivos de fora da lei: causar desordem, desafiar as instituições e ameaçar impunemente os respetivos grupos-alvo. 

O estado de desregulação é tal que há mais complacência para os vândalos do que por quem os enquadra na lei, lei que eles aliás repudiam, indignando-se por haver consequências legais aos seus desvarios. Da lei, é evidente, os vândalos não querem saber, repudiam-na como repudiam a propriedade, como repudiam a história, o país e o passado, como se se pudesse viver em sociedade sem raízes e sem limites.

Mas o círculo do mediatismo é o mais pernicioso, parecendo bem aos media subordinarem-se às agendas dos vândalos, exibindo ufanos diretos do vandalismo, essa maravilha não mediada e acrítica que retira à comunicação social o papel de mediador e a empurra para uma gaveta irrelevante. 

O civismo institucional vai assim dando lugar à selva emocional que, como sabemos, tem hoje mais audiência do que teriam todos os discursos do Churchill. E prontamente mais se sente do que se pensa, mais se reage do que se edifica, mais se corre do que se discerne. Os vândalos seguem esta matriz, os meios de comunicação, contaminados pela social media, seguem esta matriz, e todo o Ocidente parece não conseguir escapar a esta matriz. 

Não há determinismo na história, há escolhas. A autorregulação é hoje uma escolha difícil, tão empurrados somos para uma suposta genuinidade e imediatismo que nos coloca mais na posição de primatas do que na de Homo sapiens. O que é próprio de sermos humanos é pensarmos e escolhermos entre várias opções. Pois nesta fase da humanidade, preferimos que pensem por nós, acolhendo de bandeja o que nos dão, e preferimos não ter de escolher, em fugas para a frente no que consideramos ser uma inevitabilidade. 

O défice de autorregulação, que atravessa todas as dimensões do Ocidente, públicas e privadas, manifesta o desnorte em que nos encontramos e a pobreza das instituições que temos, colocando em perigo o nosso próprio modelo de liberdades. 

Urge a revisão dos pressupostos, o fortalecimento das instituições e a coragem de assumir as virtudes republicanas do civismo e da decência. 

Aos media pede-se que regressem à mediação crítica dos factos, colocando a inteligência ao serviço de si mesmos e do espaço público, ao invés de romantizarem eufemisticamente todos os vandalismos e deboches, que normalizam sem pudor a decadência em que nos encontramos.

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