"Algumas pessoas do novo Governo são muito à direita, vai ser um problema", alerta Pacheco Pereira. "Não vejo direitismo perigoso", contesta Lobo Xavier

1 abr, 13:46


 

Pacheco Pereira faz ainda um outro aviso - Nuno Melo vai ser mal recebido pelos militares: "Isto não é um prognóstico, é uma certeza absoluta"

Pacheco Pereira deixou um aviso no programa "O Princípio da Incerteza", da CNN Portugal, sobre a composição do Governo: sem nomear ninguém, o comentador da CNN Portugal afirmou que "as escolhas são muito à direita" no que toca à componente do novo Executivo, o que pode criar um "problema entre o exercício da função ministerial e o choque, pressuposto, com o PS".

"O Governo tem duas componentes: tem uma componente universitária, académica, de gente próxima do PSD, mas com carreiras académicas. Eu aí só chamo a atenção dos senhores jornalistas para perceber até que ponto algumas daquelas escolhas são muito à direita. São muito à direita. E aí vai haver um problema entre o exercício da função ministerial e o choque, pressuposto, com o PS. Porque, se não for o PS, não vai haver um problema. Porque algumas daquelas pessoas são muito firmemente partidárias de coisas que o PS não pode de nenhum modo aceitar. O Chega aceita, o PS não", afirmou, acrescentando ainda que Nuno Melo, nome escolhido para ministro da Defesa, "não vai" ser respeitado pelas Forças Armadas.

"Só quem não conheça as nossas Forças Armadas é que pensa que Nuno Melo vai ser respeitado. Não vai. Isto não é um prognóstico, é uma certeza absoluta", afirma, acrescentando que o que se está a assistir com o novo Executivo "é uma subjugação, no fundo, às ideias dominantes sobre a governação e, no fundo, à direita em Portugal".

António Lobo Xavier, por sua vez, considera que "o Governo é excelente", tendo em conta o panorama atual de "maioria escassa, ameaças de instabilidade por todo lado a cada momento", mas não vê "direitismo nenhum".

"Foi possível escolher um conjunto de personalidades que, na sua globalidade, é pena o Pacheco Pereira não ter tempo para ir ao detalhe, que era para perceber quem são os académicos, no plural, com trabalhos e teses direitistas. É porque eu, académicos, no plural, com teses que alguma vez possam ser entendidas como direitistas, não vejo lá. Tenho a impressão de que o Pacheco Pereira tem uma ideia qualquer singular e depois transforma-a no plural. [Pacheco Pereira interrompe para dizer "é plural".] Havemos de ver, eu vejo ali os académicos, não vejo bem onde é que estão as ideias deles. Não vejo direitismo nenhum. Os académicos são todos competentes e prestigiados no seu meio e os que não são académicos são alguns, obviamente, militantes do PSD e até dirigentes."

Considerando que "o naipe de ministros" apresentado por Luís Montenegro é de "tirar o chapéu", Lobo Xavier lembra ainda que "este Governo não tem nenhuma proteção" e que "a única coisa que o protege é a lei travão".

"A única coisa que em Portugal protege um Governo minoritário é a existência da lei travão, porque a oposição não poderá agravar a despesa nem reduzir a receita. E, portanto, aqueles adversários da ideia de que o Presidente da República quis um orçamento, que não perceberam porque é que se fez tanta ginástica para que houvesse um orçamento, é que era a única forma de proteger de algum modo num sistema como o nosso, que é muito pouco protetor de um Governo minoritário, é a única forma de proteger - um Governo minoritário fosse ele do PSD ou do PS ou de outro partido qualquer. Mas em suma, acho o Governo uma belíssima surpresa."

No entanto, assume Lobo Xavier, "vários dos membros do Governo têm posições mais liberais sobre a economia e sobre o funcionamento do Estado, mais preocupadas com a eficiência, do que o PS" e que, por isso,  "o que vai ser complicado vai ser esses ministros, com esse perfil e aquele programa, ver como é que é possível convencer da eficácia à esquerda".

Já Alexandra Leitão diz que não ficou surpreendida pela composição do novo Executivo, mas considerou que "o perfil é de um Governo acentuadamente liberal, acentuadamente à direita".

"Olhamos para o perfil dos ministros e, de facto, são ministros com uma visão muito liberal ao nível dos serviços públicos e ao nível das funções do Estado e do papel do Estado, da economia, dos serviços públicos, etc. Eu não estou com isto a criticar. É a posição deles. Os ministros estão lá legitimamente, foram eleitos, por uma finíssima maioria. Mas se nós olharmos para as poucas coisas escritas, num caso têm poucas coisas escritas, noutros têm muito, outros têm a mais. Mas, se virmos, são pessoas que têm, no seu pensamento, com toda a legitimidade, sublinho, mas no seu pensamento uma visão muito liberal da atividade económica, muito liberal dos serviços públicos, e isso obviamente será uma marca da governação - e cá estamos para, obviamente, também escrutinar e acompanhar essa governação. Agora, uma coisa digo: mais torna importante ter uma oposição de centro-esquerda e de esquerda porque, na verdade, o perfil é de um Governo acentuadamente liberal, acentuadamente à direita."

A comentadora diz ainda não considera que "o facto de haver muitos ministros, vamos dizer os secretários de Estado, mas muitos ministros com cartão partidário não é por si nenhum tipo de coisa má, ou seja, uma coisa só por si criticável". 

"Não acho isso para o Governo do PSD, não achei isso para os governos do Partido Socialista. Agora, não deixa de ser curioso ouvir, e já passaram três dias, portanto já ouvimos muita gente falar sobre o Governo, e ver a generalizada benignidade e até loas que foram tecidas a este Governo."

"Palhaçada" ou "não palhaçada"

Pacheco Pereira considera que a principal lição a retirar da eleição do presidente da Assembleia da República é que "a composição do Parlamento é a que é" e que Portugal tem "como terceiro partido um partido antissistema, um partido muito à direita". O comentador considerou ainda que "o que eles estão a fazer, num certo sentido, é a continuação da sua campanha eleitoral".

"Esse partido antissistema vai, evidentemente, criar situações a que os outros partidos não estão habituados. Até agora era o mito da extrema-esquerda que criava estas coisas. Não, neste momento é um partido muito à direita. E, portanto, o que eles estão a fazer, num certo sentido, é a continuação da sua campanha eleitoral. Não oferece surpresa para ninguém. E a continuação da sua atitude no Parlamento antes. Toda a gente demonizou o Santos Silva quando, na realidade, é um bocado difícil estar a presidir o Parlamento e ver os tipos do Chega a insultar as pessoas, chamando-lhe nomes."

No entanto, apesar de considerar que "o que aconteceu [na eleição do presidente do Parlamento] é normal" porque "retrata a situação política atual em Portugal", diz que aquilo que se viveu durante a eleição foi "uma palhaçada" mas "nada justifica a histeria que houve", chegando mesmo a apontar o dedo à comunicação social. 

"Aquela é a composição do Parlamento. E aquela composição do Parlamento significa que as coisas vão ser muito diferentes. Mas nada justifica a histeria que houve durante aquele dia, em que a comunicação social tem muita responsabilidade. É quase que dar alimento ao Chega. Apesar de o Chega ter tido um papel complicado no processo, aquela coisa de palhaçada parlamentar, o abaixamento do Parlamento. Quer dizer, os parlamentos são assim em todos os sítios do mundo. Em alguns casos até andam à pancada. Felizmente, em Portugal nunca houve praticamente uma cena desse género. Os parlamentos são locais de conflito. Os parlamentos não são locais de consenso. Os parlamentos não são locais em que a sua principal função seja fazer acordos. É bom que haja acordos. Mas os parlamentos são locais onde a democracia é representada, é representada pelos partidos que, naturalmente, têm posições diferentes. Portanto, o que aconteceu é que ninguém podia esperar."

Por seu lado, António Lobo Xavier afirma que concorda com o colega de mesa, mas considera que "não há palhaçada nenhuma no facto de se falharem três ou quatro tentativas de eleição do presidente da AR" e que situações nas quais se verifica "uma espécie de rebeldia" por parte de um partido ao "não cumprir a disciplina nas primeiras tentativas" não são uma novidade.

O comentador da CNN Portugal lembra que "realmente a Constituição não tem regra nenhuma sobre como é que se chega à escolha do presidente da Assembleia da República", sendo que o que acontece nestes casos é que "o regimento da Assembleia da República diz é que, se não se atinge a maioria absoluta que é exigida, então repete-se o processo e repete-se indefinidamente".

"Não há novidade porque já aconteceu, mesmo em situações de maioria absoluta, haver uma espécie de rebeldia do partido maioritário e não cumprir a disciplina nas primeiras tentativas", afirmou o comentador, acrescentando que "não há palhaçada nenhuma" no que aconteceu na eleição da passada quinta-feira, adiantando que "o Parlamento é assim que está e esta é uma realidade de três blocos que vamos viver". 

Por sua vez, Alexandra Leitão entende que num Parlamento muito dividido surjam situações de impasse, mas defende que essas situações devem ser "desbloqueadas", principalmente quando se trata de "impasses institucionais".

"Num Parlamento muito dividido, como é o caso, é normal que haja situações ou que surjam situações de impasse. Mas também é verdade que essas situações têm que ser desbloqueadas, sobretudo quando são impasses institucionais, como era aqui o caso. Não sei se houve acordo, se não houve acordo, essa não é a função do Partido Socialista, não tem de se pronunciar sobre esse acordo."

Em análise à eleição do novo presidente da Assembleia da República, a comentadora observa ainda que o Chega "vai tentar uma lógica em que ganha sempre". "A intenção do Chega já se percebeu qual é. O Chega vai tentar uma lógica em que ganha sempre porque, se forçar o PSD a acordar com eles, quebra a ideia do "não é não". Se não conseguir forçar isso, vai tentar assumir-se como líder da oposição, vai dizer 'lá está o Bloco Central, dos tachos', como se os deputados do Chega não tivessem também sido eleitos para vários cargos na mesa, no Conselho de Administração."

Lobo Xavier lembrou ainda que as negociações com o Chega não passam pelo "apaziguamento", uma vez que, na sua opinião, Ventura vê a Aliança Democrática como o "grande inimigo".

"O Chega não vai lá com um apaziguamento e por uma razão simples - o resultado das eleições para o Chega foi negativo neste aspeto: o Chega preferia que o PS ganhasse e preferia que a AD tivesse tido menos votos porque a aspiração destes partidos radicais, que não se querem normalizar - pelo menos nesta fase -, é de corroerem o centro mais próximo. O grande inimigo de Ventura é a AD. O sucesso da AD na governação, o sucesso eleitoral e o eventual sucesso na governação são o maior adversário de Ventura."

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