Costa quis provocar um ferido muito grave (Marcelo), outro grave (Lucília Gago), dois ligeiros (Montenegro, Cavaco Silva). E quis salvar duas pessoas de um acidente em março de 2024

12 dez 2023, 07:00

ENTREVISTA À TVI / CNN PORTUGAL Costa quis acertar em Marcelo. E em Marcelo. E em Marcelo. E em Marcelo. Não o fez com mensagens veladas, foi mesmo à vista de todos: Costa quis mesmo acertar em Marcelo. Várias vezes. Se acertou, como acertou, em breve veremos - Marcelo resistirá a não reagir? Mas Costa quis mais do que Marcelo nesta entrevista, ainda que tenha sido o Presidente quem Costa quis mais. Pelo meio, o primeiro-ministro do agora Governo de gestão foi confrontado com um ferimento infligido pelo seu passageiro do lado, Vítor Escária. E admitiu as consequências graves disso

Costa tenta provocar um ferido muito grave

António Costa jurou que não foi com um tom irónico que disse isto: “Só espero que das eleições do próximo dia 10 de março resulte uma situação mais estável do que aquela que tínhamos atualmente”. Até porque antes, enumerando as dificuldades que o país atravessa e os danos causados na reputação de Portugal por causa da Operação Influencer, sublinhou que Marcelo “fez uma avaliação errada” e que podia ter evitado a crise política.

A solução alternativa defendida por Costa incluía o nome de Mário Centeno para se tornar primeiro-ministro de emergência no atual quadro parlamentar de maioria absoluta. Marcelo rejeitou-a, fê-lo a título pessoal - o Conselho de Estado não apoiou a dissolução, ficou empatado. Posto isto, o primeiro-ministro demissionário disse na entrevista à TVI / CNN Portugal que o Presidente "errou" - e quis provar isso usando um argumento académico sensível para Marcelo: "Não conheço nenhum manual de Direito Constitucional que legitime a ideia de que quando o primeiro-ministro sai, por muito que tenha contribuído ele próprio para o resultado eleitoral, isso determina a dissolução da Assembleia”. Essa “foi uma teorização que o próprio Presidente da República fez logo na tomada de posse do Governo - eu na altura disse-lhe que não concordava com essa interpretação”.

E se o caso de Durão Barroso / Santana Lopes é um exemplo de como a solução defendida agora por Costa para Centeno ilustra o que pode correr mal, “não significa que não haja um que possa correr bem”. “Tínhamos uma alternativa credível”, sublinha, e, mesmo retirando Centeno da equação, existiam “vários nomes possíveis que podiam ter assegurado um bom Governo até ao termo da legislatura, ou porventura que evitasse que precipitadamente a legislatura terminasse como terminou”.

Costa não considera que as próximas eleições são um “plebiscito” à atuação de Marcelo, mas não nega que a dissolução do Parlamento o faça refém dependendo dos resultados que saírem de 10 de março de 2024. “Obviamente, todos nós, com cada decisão que tomamos, somos depois julgados necessariamente pelos resultados das nossas decisões. Eu acho, sinceramente, que o Presidente da República tinha todas as condições para encontrar uma solução alternativa que poupasse o país a esta crise, tenho a certeza absoluta de que quem nos está a ouvir em casa não deseja ir a eleições.”

No final, após todas estas críticas, António Costa revelou também que não se recordava que esta terça-feira é o aniversário do Presidente da República. “Sou péssimo para datas de aniversário”, confessou. Mas vai ligar-lhe.

Costa tenta provocar um ferido grave

Além de tentar afastar o Partido Socialista de qualquer dano colateral à operação Influencer e à investigação que sobre si decorre no Supremo Tribunal de Justiça, António Costa separou também os “agentes da justiça” deste caso que “agiram incorretamente” da crença generalizada que tem no Ministério Público, que se quer “independente”.

“Distingo bem o que é a atuação do agente A, do agente B e do agente C e o sistema de justiça, que assenta em quem investiga, em quem acusa, em quem defende e, finalmente, em quem julga e é no conjunto desse sistema que eu confio.”

Entre essa noção despersonalizada de agente da justiça, foi a mais alta magistrada da magistratura a ser o foco do primeiro-ministro demissionário, destacando o parágrafo que Lucília Gago "acrescentou" à nota da Procuradoria-Geral da República e na qual Costa era referido como suspeito de uma investigação. “O grau de confiança que os cidadãos têm de ter nas instituições democráticas, e designadamente na figura do primeiro-ministro, não são compatíveis com uma suspeição oficializada.” 

Costa sublinha que “aquele parágrafo é claramente acrescentado àquele comunicado para dar notícia pública de que há uma suspeita sobre o primeiro-ministro que está a ser investigada”. “Ainda hoje não sei qual é a suspeita”, diz. “No meu entendimento, quem está sob a suspeição oficial com a gravidade que foi suscitada pela Procuradora-Geral da República tem o dever de proteger as instituições e de não exercer casos públicos”

Se esse parágrafo não tivesse existido, considera que “provavelmente teria aguardado pela avaliação pelo juiz de instrução do conjunto de indícios que existia" e que por isso não se teria demitido a 7 de novembro. E, "como se sabe, em menos de uma semana o juiz de instrução concluiu que várias das suspeitas que existiam não considerou indiciadas”.

Mas confrontado com o facto de terem sido encontrados mais de 75.000€ em dinheiro vivo no escritório do seu chefe de gabinete, Vítor Escária, António Costa admite que isso também o podia ter levado à demissão antes de se saber a decisão do juiz de instrução. Esse facto, conhecido a 8 de novembro, "podia ter-me levado a tomar esta decisão" da demissão.

Já sobre as escutas a que os arguidos no decurso da operação Influencer foram sujeitos, sublinha que “aparenta ser estranho” que o seu ex-ministro João Galamba tenha sido alvo deste procedimento durante 4 anos.

Costa tenta provocar um ferido ligeiro

Foi o nome do líder do PSD que Costa escolheu elencar ao falar, ainda que em jeito de advertência, sobre qual seria o seu maior arrependimento de todo o ciclo político. “Se o PSD não honrar o compromisso que tem, eu diria que foi o ter confiado que podíamos trabalhar em conjunto para ter uma decisão de consenso sobre uma investidura fundamental para o país, como é o futuro aeroporto”. 

O acordo de incidência parlamentar sobre o destino do novo aeroporto é, aliás, para António Costa, “o grande teste à credibilidade” dos sociais-democratas e, destaca, “espero não me desiludir”. Isto porque, refere o primeiro-ministro demissionário, “tinha toda a legitimidade para ter tomado a decisão que bem entendesse”, mas decidiu “que tínhamos de tomar em consenso com o PSD”.

António Costa defendeu ainda que a direita "é uma barafunda" e que Luís Montenegro está preparado para replicar no continente o “fiasco” e o “ensaio geral” que foi a aliança à direita nos Açores – e que acabou em eleições antecipadas a 4 de fevereiro do próximo ano, perante a incapacidade de se manter uma maioria para aprovar as contas regionais de 2024.

Costa tenta provocar outro ferido ligeiro

A última vez que Costa tinha falado publicamente sobre Cavaco Silva foi em maio - quando o ex-Presidente da República escolheu o 3º Encontro dos Autarcas Sociais Democratas para convidar o primeiro-ministro a demitir-se. Na altura, a resposta dada, um dia depois do ataque, foi um "deixem-nos trabalhar", reminiscente da defesa de Cavaco no Parlamento.

Esta segunda-feira, em entrevista à CNN Portugal, nova referência: “Como é que, ao fim destes anos todos, o melhor que têm para dar energia ao partido foi ir buscar o Cavaco Silva para animar o PSD?”. Duas notas sobre o "ir buscar Cavaco": o ex-Presidente apareceu de surpresa no congresso de 25 de novembro dos sociais-democratas e escreveu a 4 de dezembro um artigo no Público a questionar a seriedade de ministros de António Costa e a dizer que "cidadãos não especialistas" estão a ser iludidos pelo PS.

Costa tenta salvar duas pessoas de um acidente em março de 2024

Costa não diz em que vota na luta interna do PS mas tem a certeza de que para a luta externa tanto faz ser Pedro Nuno Santos ou José Luís Carneiro a liderar o partido. Porquê? "Ambos são melhores que o líder da oposição." Por isso: qualquer um deles vence Montenegro nas eleições de 10 de março de 2024.

Para António Costa, “não há nenhuma solução estável” para Portugal que não conte com o PS. E tanto Pedro Nuno Santos como José Luís Carneiro “têm muito mais experiência, muito mais competência e asseguram muito melhores qualidades de governação do que o líder da oposição”.

Uma nota adicional: Pedro Nuno Santos, ao contrário de António Costa, defende a reposição integral do tempo de carreira dos professores. Para o primeiro-ministro demissionário, isso até é bom: “Para ficarem todos libertos para o futuro, este é um ciclo político que se encerra no Partido Socialista (E, portanto, está toda a gente de mãos livres. É normal que o PS olhe, faça um balanço, o que é que correu bem, o que é que correu mal, o que é que não fizemos e podíamos fazer, que novos problemas é que existem que exigem novas respostas”. E ainda: “Não me incomoda que um líder venha defender coisas diferentes do que eu fiz”, "admito que haja ideias diferentes, há camaradas meus que têm ideias diferentes".

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