O futebol português não funciona com Wengers

23 mar 2016, 10:07
Arsenal-Barcelona (Reuters)

Liga portuguesa é aquela onde os técnicos têm menor tempo de permanência nos clubes

A Liga portuguesa é, de entre as principais na Europa, aquela onde o trabalho em continuidade dos treinadores é menos valorizado. E é, também, a competição onde os clubes mudam mais facilmente de técnico. O mote, dado por este artigo, foi confirmado esta semana, por um estudo do CIES-Football Observatory (Centro de Estudos Internacional do Desporto) sobre o tema nas cinco maiores Ligas europeias.

Assim, na semana em que o Fórum de Treinadores, em Setúbal, tem valorizado a competência da classe, os agentes do futebol português vêm confirmado pelos números que Portugal tem, a larga distância, o campeonato de primeiro escalão com o mais baixo tempo médio de permanência dos treinadores num clube (10 meses). Este valor situa-se a larga distância dos apresentados por Inglaterra (27 meses em média) e França (24 meses), as Ligas onde a continuidade dos treinadores é mais valorizada. Mas também Alemanha (18 meses), Espanha (17 meses) e mesmo a Itália (15) estão bem acima da tradição portuguesa.

O efeito das exceções, como Wenger e Jesus

Olhando para o panorama geral, é importante notar que os números são influenciados por casos pontuais. A permanência de Wenger no Arsenal - 233 meses, mais do triplo do segundo classificado no ranking de longevidade, o francês Christophe Galtier - faz disparar o valor médio em Inglaterra de 17 para 27 meses. Tal como o valor médio da Liga portuguesa seria substancialmente diferente, por força da longa permanência de Jorge Jesus no Benfica (que se estendeu por uns invulgares 72 meses) e que, a manter-se nesta época, teria feito o tempo médio de permanência da Liga portuguesa disparar para 19 meses.

Mas a verdade é que, expurgando as médias de cada Liga – isto é, retirando os extremos máximo e mínimo das contas – as posições relativas pouco se alteram: o valor da média expurgada em Portugal cai para 9 meses, mantendo-se claramente na cauda, enquanto a França supera a Inglaterra na liderança, se retirarmos à Premier League o efeito Wenger.

De referir, também, que os clubes portugueses continuam a despedir mais facilmente treinadores do que na generalidade dos campeonatos de topo: nesta edição da Liga, apenas 11 dos 18 clubes mantêm os técnicos que iniciaram o campeonato (61%) um valor próximo dos registados em Espanha (12 em 20, 60% do total) e França (11 em 20, ou 55%), mas abaixo do que é tendência na Alemanha (73%), Inglaterra (70%) e mesmo Itália (65%).

Se olharmos para treinadores com mais de um ano no mesmo clube, então essa diferença é ainda mais significativa: em Espanha e França são metade do total (10 em 20) e em Inglaterra e na Alemanha (55%), a percentagem é ainda superior. Em Itália a média baixa um pouco (9 em 20, ou 45%), mas nada que se compare com o sucedido em Portugal, onde apenas quatro de 18 treinadores – Manuel Machado, Pedro Martins, Miguel Leal e Fabiano Soares - estão há mais de 12 meses à frente do mesmo clube.

Por fim, uma referência positiva: a Liga portuguesa está entre as que mais apostam nos treinadores locais: apenas três estrangeiros (Erwin Sanchez, Julio Velazquez e Fabiano Soares) em 18. Itália e França (dois estrangeiros em 20) são ainda mais conservadores nesse particular, enquanto Espanha (5 em 20) e Alemanha (7 em 18) se mostram mais abertas a influências do exterior – mas não tanto como a Premier League, que tem apenas seis treinadores britânicos, dos quais três ingleses, no seu quadro principal.

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