V. Guimarães - Beira Mar, 1-1 (crónica)

22 out 2000, 19:14

Congénita aversão ao êxito O confronto anunciava um triunfo fácil para os vimaranenses, mas Autuori continua sem conseguir impor tácticas à equipa. O empate serve como penitência para todos e especialmente para alergia ao golo dos aveirenses. O expoente máximo projectou-se na família Sousa, que falhou nos momentos decisivos e tem de se lamentar por não conseguir alcançar o triunfo.

A presa ferida tentava o golpe fatal, tentava correr, mas era evidente a dificuldade de movimentação. Uma lebre desbravava milhas, calcorreava o campo todo, fugia desalmadamente e nunca se deixava apanhar. Uma caça aberta, anunciada aos sete ventos, que só esperava para conhecer os contornos macabros, de tão propalada carnificina. 

O devorador seria, obviamente, o nome de vitória, abastado e arrogante, que vê-se obrigado a fazer pela vida para afastar o agoiro das consecutivas desilusões; o outro, decisivamente menor e despretensioso, arrogava-se a surpreender e inverter a lógica natural das coisas, tentando deitar para o esquecimento a má-sorte de ser vassalo. Porém, essas diferenças esbateram-se automaticamente, numa breve infusão de estilos e vontades, que só não tiveram efeitos mais pungentes por manifesta falta de engenho e competência dos aveirenses no momento de cortar a meio as esperanças do oponente. 

A similitude de forças, que resulta no empate de golos, justifica-se pela insensatez vimaranense e por essa falta de objectividade do Beira Mar que continua sem conseguir ser afirmativo, positivo e vencedor. António Sousa apostou tudo nos bravos velozes Rui Dolores, Óscar e Gamboa e quase conseguiu sorver o cálice triunfal, mas o medo congénito dos seus jogadores em frente da baliza é capaz de desesperar qualquer um e o treinador terá de penitenciar-se por isso. 

A corda que sufoca 

A missão é complicada e as expectativas são muito altas, demasiado elevadas para a realidade. É notório o esforço de Paulo Autuori em rentabilizar os jogadores e tornar a equipa forte e eficaz, mas as ideias esbatem-se em campo, esbarram na densidade táctica e perdem qualquer sentido quando deparadas com a recorrente barreira defensiva imposta pelos oponentes. O brasileiro gosta que se jogue aberto e bonito, com sucessivas trocas de bola e movimentações constantes, com dois atacantes irrequietos e desesperados pelo remate, pela hora do golo. Só que nada disto acontece, ou quase nada, e cada vez mais os esquemas de Autuori assemelham-se a fantasias pessoais, ininteligíveis. 

Igualmente sem grande margem de manobra, António Sousa viu o seu filho anunciar a vantagem, falhando em frente a Tomic quando tinha tudo para afirmar a sua qualidade, convertendo-a em golo. O passo em frente foi dado pouco depois e com a ironia em jeito de vingança pela cabeça de Vítor Silva, um ex-vimaranense que regressa ao Afonso Henriques com a pele do inimigo e depois de uma passagem por terras de Espanha. Apesar da irritação patente nas bancadas, a justiça do resultado era inquestionável e só não foi mais vincada pela atrofiante falha dos aveirenses, que continuaram a penitenciar-se pela alergia ao êxito.  

A revolta surgiu estampada pelo estranho colombiano, que parece perdido no relvado, que corre sem sentido, que desaparece constantemente. Para o oponente, Congo é o avançado mais indesejado. Macio, fácil de marcar, mas teimosamente eficaz. Foi ele que concebeu o balão de ar que permite a Autuori suspirar por mais algum tempo, foi o sul-americano que esteve quase em cima da linha de golo, poucos centímetros à frente do falível Lobão, quando Palatsi já estava prostrado no chão, e amansou com a cabeça a bola para junto das redes. 

Esse lance esgotou a dose de sorte destinada ao treinador dos vitorianos. E isso teve confirmação no penalty que Maurílio enviou ao poste, nos remates de Sérgio Júnior sempre transviados e nos sucessivos cantos, que se esgotavam irremediavelmente nas mãos do francês do Beira Mar. Aliás, o destino de azar atingiu os dois técnicos e António Sousa foi obrigado a queimar cigarros e mais cigarros, nervoso de raiva pela bola enviada por Cílio à barra. Mas, o momento mais incompreensível aconteceu quando faltavam apenas dois minutos para o fim e Rui Manuel partiu isolado desde o meio-campo. Era mais um contra-ataque e a frescura de um jogador que tinha entrado em campo há escassos momentos fazia adivinhar o auge da partida, só que o avançado só veio confirmar o temor dos colegas e quando viu Tomic a escassos metros deitou tudo a perder, dando a bola para o lado, onde Abel cortou para canto. Um lance que resume toda a história do jogo.

Patrocinados