"É desumano uma segunda noite igual": timorenses a dormir na rua em Lisboa sofreram com o mau tempo

Cláudia Évora , Notícia atualizada às 00:16 de dia 9
8 dez 2022, 18:31

A Câmara de Lisboa disse à CNN Portugal que uma parte grupo encaminhado para um centro de acolhimento, na Praça de Espanha, e outra para um quartel militam em Santa Cruz

Tem estado a circular nas redes sociais vários apelos sobre um grupo de cerca de 40 timorenses que, alegadamente, passou a noite de quarta para quinta-feira ao frio e à chuva no Terreiro do Paço e no Cais do Sodré, em Lisboa, por não terem um teto onde se pudessem abrigar. Neste apelo é dito que a "situação é desesperada" e que já foram contactadas "todas as instituições públicas e privadas". 

"A noite passada foi caótica e é desumano uma segunda noite igual", lê-se na publicação de Carla Rodrigues Cardoso, professora na Universidade Lusófona em Lisboa e diretora da Licenciatura em Comunicação e Jornalismo.

Numa outra publicação é dito que "o nível das águas subiu e a quantidade de água que caiu fez com que parte das tendas inundasse ou ficassem inoperacionais". "Já ligámos para a Proteção Civil, dizem-nos que não podem ajudar porque não têm capacidade de dar resposta aos inúmeros pedidos de emergência desta noite." 

Câmara de Lisboa: "Nunca passaram a noite de ontem no Terreiro do Paço"

A CNN Portugal contactou a Câmara de Lisboa (CML): a autarquia diz que tem conhecimento da situação e já ofereceu por várias vezes ajuda a estes cidadãos. Sempre a negaram, até esta noite. 

"A Proteção Civil tem vindo a acompanhar esta situação e a oferecer abrigo, mas nunca aceitaram. Ontem finalmente aceitaram e foram encaminhados para o centro de acolhimento na Praça de Espanha, onde permanecem. Nunca passaram a noite de ontem no Terreiro do Paço", diz fonte oficial da CML. 

Uma segunda fonte da autarquia confirmou a mesma informação: "A indicação que tenho é que da parte da Proteção Civil Municipal todas as situações sensíveis foram apoiadas e sinalizadas. Isso mesmo deu nota o presidente da Câmara Municipal de Lisboa na conferência de imprensa desta manhã questionado sobre essa questão em concreto".

Contudo, a CML garantiu à CNN Portugal que ia averiguar novamente a situação "para perceber mais necessidades que existam no terreno".

Ativista: "Ficaram com as mantas e as tendas alagadas e destruídas"

Não é novidade que existem sem-abrigo nas ruas de Lisboa, assim como não é novidade que existe um grupo de imigrantes timorenses que reside na zona Terreiro do Paço e Cais do Sodré. Grupo esse que, segundo explicou à CNN Portugal Marina Carneiro, ativista dos direitos dos imigrantes, "é bastante volátil".

"Eles vivem na rua ao relento e estão todos concentrados no Terreiro do Paço, mas é um grupo altamente heterogéneo, ou seja, ora entram uns, ora saem outros, uns conseguem trabalho, chegam novos elementos de avião. Não estamos a falar de um grupo coeso. Todos os dias são pessoas diferentes e chegou a atingir um total de 60 pessoas." 

Mariana acompanha e dá apoio aos imigrantes timorenses em Portugal há mais de dois meses. Na noite de quarta-feira, quando se apercebeu das inundações em Lisboa e da subida do nível das águas, dirigiu-se de imediato para o Terreiro do Paço. O cenário era catastrófico. 

"Ontem estavam cerca de 60 pessoas e choveu torrencialmente. As tendas ficaram inoperacionais. Eu ajudei a arranjar mantas. Esteve uma equipa da comunidade e paz a distribuir snacks. Foram feitos vários contactos da Comissão de Emergência Social Timorense (…), muitos membros da comissão começaram a divulgar a situação por se completamente dramática. Ficaram com as mantas e as tendas alagadas e destruídas", relatou. 

Por volta das 03:00 desta madrugada, apareceram elementos da CML e "parte desse grupo foi levado para centro de acolhimento, na Praça de Espanha, mas outra parte ficou no local". Mariana negou que estes imigrantes tenham negado constantemente um teto e explicou que isso só aconteceu em um ou dois casos. 

"Pode haver um ou dois elementos que negaram a ir para aquele centro, lá terão as suas razões, mas isso não é uma resposta coletiva. Agora, se forem ao Terreiro do Paço há varias pessoas lá que sempre tentaram arranjar um teto, mas nunca conseguiram ter essa resposta. Ninguém pode alegar desconhecimento deste grupo. Não é verdade que este grupo tenha recusado coletivamente ter apoio. Eu tenho lá pessoas que não tem um casaco, uma tenda. Basta fazer trabalho de terreno, basta ir lá. Pretendem regularizar-se, ter um trabalho e ter um teto."

Marina Carneiro lembrou que o centro de atendimento e emergência, na Praça de Espanha, em Lisboa, "já esgotou a sua capacidade" e finalizou dizendo: "O facto de haver conhecimento destas situações por parte das entidades oficiais, não significa que tenha havido uma resposta pública".

Câmara de Lisboa realojou dezenas de imigrantes em quartel militar

Entretanto, a CNN Portugal soube que por volta das 21:25 esteve um autocarro no local que levou cerca de 13 imigrantes para um quartel militar, em Santa Cruz, onde o Alto Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas (ACIME) tinha vagas. Entre sábado e domingo foram realojados pelo menos 45 imigrantes. 

Existem, contudo, pelo menos 25 timorenses que se recusam a ser realojados quer pela Câmara de Lisboa, quer pela Santa Casa da Misericórdia de Lisboa. 

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