Conclusão é de um estudo. Autores defendem que estes níveis de exposição exigem que o país passe a dispor de uma "boa lei de proteção ao fumo do tabaco, conforme estava contemplado na proposta de lei inicial” anunciada pelo Ministério da Saúde
Mais de oito em cada 10 portugueses consideram que estão expostos ao fumo de tabaco em espaços exteriores, uma percentagem que coloca Portugal entre os países da União Europeia com maior nível de exposição.
A conclusão consta de um estudo desenvolvido por investigadores da Universidade de Santiago de Compostela, em Espanha, da Escola Nacional de Saúde Pública e da Universidade da Beira Interior a que agência Lusa teve acesso.
Esta revisão sistemática dos diferentes dados disponíveis indica que 93,3% dos portugueses declaram estar expostos ao fumo do tabaco em terraços e esplanadas da restauração, 88,7% nas praias, 87,3% nas paragens de autocarro, 81,5% nos estádios desportivos, 83,3% nos parques, 72,8% nos recintos das escolas e 71,9% nos recintos dos hospitais.
“Estes dados são muito preocupantes, pois não há um nível seguro de exposição ao fumo de tabaco, que causa as mesmas doenças do que o consumo ativo, como cancros, doenças respiratórias e cardiovasculares e infeções”, salientou Sofia Ravara, professora da Universidade da Beira Interior e uma das autoras principais do estudo.
Segundo adiantou à Lusa, estes níveis de exposição exigem o país passe a dispor de uma "boa lei de proteção ao fumo do tabaco, conforme estava contemplado na proposta de lei inicial” anunciada pelo Ministério da Saúde.
"A lei tem de ser clara, sem exceções, ambiguidades e moratórias. Tem de ser abrangente e incluir os diversos espaços exteriores onde os estudos mostram que as pessoas estão expostas”, preconizou a especialista, ao salientar que, no caso das esplanadas e terraços, a exposição “acontece sempre, independentemente de haver ou não teto, parede ou cobertura.
“Sejamos claros: exceções, moratórias e ambiguidades causam doenças, mortes e sofrimento, além de custos sociais e económicos”, alertou.
A professora da Universidade da Beira Interior defendeu ainda campanhas de educação para a saúde, que divulguem a toxicidade e os efeitos nocivos para a saúde da exposição ao fumo de tabaco e a necessidade de proteger os não fumadores e as populações vulneráveis, como trabalhadores, crianças, adolescentes e grávidas.
“Esta análise crítica da revisão sistemática põe a nu uma verdade inaceitável que é urgente mudar. Em Portugal, não há uma estratégia de saúde pública eficaz na proteção da exposição ao fumo de tabaco, porque falham as políticas públicas, quer na sua formulação e implementação de medidas, quer na sua monitorização e avaliação”, lamentou a especialista.
Um outro estudo dos mesmos investigadores conclui que a “carga de mortalidade por tabaco é elevada e varia significativamente por região, sexo e idade”.
Em 2019, o consumo de tabaco provocou 13.847 mortes em Portugal, 9.859 (71,2%) homens e 3.988 mulheres, representando 12,3% do total de mortes ocorridas em adultos portugueses com 35 ou mais anos, indica o documento.
Do total da mortalidade atribuída ao tabaco, “pelo menos 22,2% foram óbitos prematuros ocorridos em menores de 65 anos, representando 20,7% do total de mortalidade observada na faixa etária de 35 a 64 anos”, refere o estudo.
“Os Açores e a Madeira apresentam dados preocupantes. Nas regiões autónomas, a mortalidade associada ao tabaco é muito alta para todas as doenças, incluindo por doença cardiovascular, a qual é similar à mortalidade das doenças oncológicas, ao contrário das regiões de Portugal com maior nível socioeconómico e maior equidade social e em saúde, em que houve uma franca diminuição da mortalidade por doença cardiovascular”, sublinhou Sofia Ravara.
Isso quer dizer que o “tabaco é um reforçador das desigualdades em saúde”, sublinhou a médica pneumologista.
A atual lei do tabaco está em vigor deste 2017 e o Conselho de Ministros aprovou, em 11 de maio, um novo diploma que pretende “ir mais longe” nas restrições à venda e nas limitações ao consumo, alegando que se trata de um “seríssimo problema de saúde pública”.
Uma das medidas previstas inicialmente na proposta de lei era a proibição da venda de tabaco nos postos de abastecimento de combustível, que mereceu a contestação dos representantes do setor, e que o Governo deixou cair, com o argumento de que, em algumas localidades, “o sítio para comprar tabaco ficava demasiado longe”.
Com o diploma que já entrou na Assembleia da República, o Governo pretende uma “geração livre de tabaco até 2040”, tendo também em conta os novos padrões de consumo que surgiram com produtos como os cigarros aquecidos, sobretudo, entre os mais novos.