Após greves dos médicos, urgências em risco de fechar num cenário caótico

Manuela Micael , com Lusa
28 set 2023, 10:21
O estudo português indica que 34% dos médicos obstetras-ginecologistas dedicam 30% do seu tempo ao serviço de urgência e 48% dedicam 75% do seu tempo no hospital ao serviço de urgência (Pexels)

Novo protesto arranca já no domingo. Cresce diariamente a lista de clínicos que se recusam fazer horas extra além das 150 a que estão obrigados por lei. Administrações de muitos hospitais sem recursos humanos para manterem urgências abertas

Faltam poucos dias para o arranque do mês de outubro, altura em que muitos médicos vão deixar de fazer horas extraordinárias além das 150 a que estão obrigados por lei. Cresce diariamente a lista de clínicos que aderiram ao protesto e entregaram já a declaração de escusa às respetivas administrações hospitalares. De acordo com o Movimento Médicos em Luta, criado em agosto nas redes sociais, a esmagadora maioria dos médicos já ultrapassou as 150 horas obrigatórias no final do primeiro trimestre do ano e muitos já fizeram este ano mais de 600 horas extraordinárias.

Como a CNN Portugal noticiou em primeira mão na última terça-feira, há muitos hospitais que têm especialidades em que a adesão dos médicos a esta forma de protesto é de 100% ou está muito perto disso. No Hospital de Santarém e de Viana do Castelo, por exemplo, 100% dos médicos de cirurgia geral já entregaram a minuta de escusa ao trabalho extraordinário para além daquele que é obrigatório. Mas não é caso único: os intensivistas de Portimão, os médicos internos de cirurgia, assim como alguns especialistas de cirurgia, de Santa Maria e de Aveiro seguiram o mesmo exemplo. Também no hospital de Aveiro, 80% dos pediatras entregaram o documento à administração, de acordo com dados daquele movimento

“A situação é transversal ao país inteiro. No Hospital Pedro Hispano, em Matosinhos, a adesão ronda os 100%. No Tâmega e Sousa 90% dos médicos do serviço cirurgia geral e maioria cardiologia geral também entregaram o documento, o que significa que o hospital vai deixar de ter via verde coronária neste período”, alerta Susana Costa, médica de cirurgia geral e porta-voz do movimento.

O protesto surge numa altura em que o país assiste a greves dos médicos, convocadas pelos sindicatos. Esta quinta-feira, os médicos da Região de Lisboa e Vale do Tejo cumprem o segundo dia de uma paralisação convocada pelo Sindicato Independente dos Médicos (SIM).

No primeiro dia, de acordo com o sindicato, a greve teve uma adesão entre os 80 e 90%. De acordo com Jorge Roque da Cunha, secretário-geral do SIM, os dados indicam que a paralisação atingiu os 90 por cento nos hospitais, cerca de 85% nos blocos operatórios e 80% nas consultas externas.

Em alguns casos, como os centros hospitalares de Santarém e do Médio Tejo ou o hospital Dona Estefânia, a adesão nos blocos foi total, exemplificou Roque da Cunha, mostrando-se satisfeito com a mobilização dos médicos.

“Após um ano de negociação em que não fizemos greve e depois de o governo fazer uma proposta de 3,1% quando o poder de compra foi reduzido em 22%” para a população, o sindicato propôs “a recuperação desse poder de compra para todas as carreiras” médicas de modo gradual.

Por isso, a greve é “um sinal muitíssimo claro e expressivo” da “justeza das nossas reivindicações” perante “um governo que tem maioria absoluta e está a governar há oito anos e tem uma coleta fiscal como nunca aconteceu”, disse Roque da Cunha.

O secretário-geral do SIM disse que é preciso "que o governo perceba que tem um problema sério" e manifestou disponibilidade para que durante a legislatura possam ser "criadas condições para que os médicos não continuem a sair do Serviço Nacional de Saúde”.

A segunda greve de dois dias dos médicos de Lisboa e Vale do Tejo iniciou-se às 00:00 de hoje, englobando hospitais e centros de saúde que não foram abrangidos pela paralisação que decorreu a 13 e 14 de setembro.

A greve regional, que se estende até às 24:00 de quinta-feira, abrange os centros hospitalares Lisboa Norte, Lisboa Central, Lisboa Ocidental, do Oeste, Médio Tejo e os hospitais Doutor Fernando Fonseca (Amadora-Sintra), de Santarém, o Hospital Forças Armadas e o Hospital Prisional de Caxias.

Segundo o SIM, são também abrangidos pela paralisação o Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses Sul, o Instituto Português do Sangue e Transplantação e a Divisão de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (DICAD) da Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo.

Os médicos dos Agrupamentos de Centro de Saúde (ACES) de Lisboa Norte, Lisboa Central, Ocidental e Oeiras, Amadora, Sintra, Oeste Norte, Oeste Sul, Médio Tejo e Lezíria também são abrangidos pela paralisação de dois dias.

Os serviços mínimos devidos durante a greve médica regional são os estabelecidos na regulamentação coletiva do trabalho em vigor no SNS, refere o SIM.

As negociações entre sindicatos dos médicos e o Ministério da Saúde iniciaram-se em 2022, mas até ao momento não houve acordo.

 

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