Sardinha mais barata em ano de inflação. Surpreendente? Pois. Mas há mais surpresas: truques para entender uma boa sardinha
“Está mais barata e veja, é fresca, bem gorda e do nosso mar.” Albertina aponta para as seis sardinhas que estende perfeitamente na palma da mão com a destreza de quem as vende há mais de 60 anos. São 7:30, mais ou menos, a agitação está mais intensa do que é normal a esta hora à volta do mercado de Matosinhos -afinal não é um dia qualquer: é véspera de São João e ali ao lado, no Porto, prepara-se a noite mais longa do ano.
Por uma questão de conveniência ou mesmo para evitar confusões, muitos decidiram iniciar bem cedo a corrida pelas melhores sardinhas. “A sardinha não pode faltar”, diz uma das primeiras clientes enquanto escolhe 20 sardinhas para mais logo. E confirma: “Está mais barata, no ano passado comprei a 10 euros o quilo, hoje está aqui a 8”.
Sardinha mais barata em ano de inflação. Surpreendente? Pois a percepção geral no mercado de Matosinhos é mesmo esta: apesar da inflação e do aumento geral dos preços dos alimentos, tanto comerciantes como clientes dizem que o custo da sardinha este ano é inferior ou pelo menos igual ao do ano passado. É verdade que o preço difere sempre consoante o tamanho e a origem mas, para uma sardinha de tamanho médio, em 2022 o quilo era vendido por 10-12 euros e este ano é possível encontrar a 8 euros.
Maior ou mais pequena não será o tamanho o que aqui mais importa, mas no que diz respeito à origem a conversa muda de tom e há sempre espaço para os mais sublinhados elogios ao que o país tem de melhor. “Olhe que esta é de Peniche, é do nosso mar, e é muito melhor do que a que vem de Espanha”, exclama Albertina. A fresca acima da congelada, a portuguesa antes da espanhola. Então e depois, como é que se sabe se a sardinha é ou não de boa qualidade? Na experiência de Albertina, o segredo desvenda-se aos nossos olhos. “Está a ver aqui, esta gordurinha aqui atrás” - explica a peixeira enquanto aponta para a linha que desenha a extremidade do peixe - “pois é assim que se sabe se ela é boa ou não se tiver esta gordurinha aqui atrás".
Pelas nove horas e pouco da manhã, entre os balões coloridos de papel espalhados pelo teto, a corrida à sardinha intensifica-se. Quem vende puxa a brasa à sua, quem compra faz o equilíbrio entre o aspecto do peixe e o peso da carteira. No que toca a gastos, e num ano em que os portugueses perderam poder de compra, o jantar de São João deverá sair mais caro. É que nem só de sardinha se faz uma sardinhada e, quanto ao resto - pimentos, batatas, pão e sem esquecer a couve para o caldo verde -, "está tudo mais caro", afirma quem por aqui passa.
O certo é que as noites não são todas iguais e, no Porto, de sardinha no pão e martelo na mão, abre-se uma exceção para comemorar a mais longa do ano. "Depois volta-se a apertar o cinto outra vez, tem de ser", dizem-nos,sem hesitação.