Mais de dois terços da riqueza das famílias é feita de betão

ECO - Parceiro CNN Portugal , Luís Leitão
9 jan, 07:47
Casas, habitação, bairro típico, Lisboa. Foto: Tim Graham/Getty Images

À imagem do que sucede na Europa, o património dos portugueses está fortemente concentrado no setor imobiliário. Na componente financeira, são os depósitos que recolhem as preferências das famílias

Os portugueses continuam a ter uma fixação por betão. Os últimos dados do Banco Central Europeu (BCE) revelam que, no segundo trimestre de 2023, mais de dois terços da riqueza líquida das famílias estava concentrada em ativos imobiliários, com particular destaque para o imóvel onde residem.

Isto significa que dos 271 mil euros de património líquido médio dos agregados familiares em Portugal, no final de junho do ano passado, 66,3% estava concentrado em imóveis.

É preciso recuar mais de uma década, até ao quarto trimestre de 2012, para encontrar um peso tão significativo do betão na composição da riqueza das famílias portuguesas.

Segundo dados do BCE, a exposição média de cada agregado familiar português a ativos imobiliários era de 179 mil euros no final do segundo trimestre do ano passado, cerca de 1,7 vezes mais do que dez anos antes.

Entre os ativos que compõem a riqueza das famílias nacionais, apenas a exposição a fundos de investimento registou um crescimento maior que os imóveis na última década. No entanto, o montante médio aplicado pelos atuais 4,1 milhões de agregados familiares nestes produtos traduz-se em apenas 3,5% da exposição das famílias per capita a ativos imobiliários.

Apesar do montante histórico de dinheiro aplicado em depósitos pelas famílias portuguesas em junho de 2023, é equivalente a apenas 30% do valor total da exposição em ativos imobiliários que as famílias apresentavam no final do segundo trimestre de 2023.

Mas a preferência por casas não é uma particularidade dos portugueses. É comum a praticamente todos os países da Zona Euro: segundo cálculos do ECO, com base nos dados do BCE, 66,3% (a mesma percentagem de Portugal) do património líquido das famílias do espaço da moeda única está alocado em ativos imobiliários.

Entre os europeus com maior “queda” pelo betão estão as famílias eslovacas e holandesas, com mais de 80% da sua riqueza líquida a estar concentrada em ativos imobiliários.

No canto oposto está a Itália e a Letónia, com os agregados familiares destes países a concentrarem 54% e 45%, respetivamente, do seu património em imóveis.

Riqueza nacional continua longe da Europa

Além da preferência contínua por ativos imobiliários, os portugueses continuam também a mostrar uma forte inércia na realocação da sua carteira financeira.

Desde 2020 que os depósitos representam mais de 50% dos ativos financeiros dos agregados familiares, apesar de, até dezembro de 2022, a taxa de juro dos novos depósitos ter sido inferior a 0,5%, segundo dados do Banco de Portugal.

Em junho do ano passado, os dados do BCE revelam que, em média, cada agregado familiar em Portugal tinha aplicado 53,7 mil euros em depósitos bancários. Desde pelo menos o segundo trimestre de 2010 (início da série do BCE) que não há registo de um valor tão elevado.

Apesar do montante histórico de dinheiro aplicado em depósitos pelas famílias portuguesas em junho de 2023, é equivalente a apenas 30% do valor total da exposição em ativos imobiliários que as famílias apresentavam no final do segundo trimestre de 2023.

E o que os números revelam é que nos anos mais recentes, a preferência das famílias pelo investimento no setor imobiliário mostrou-se claramente numa aposta vencedora.

Como resultado da fase positiva do setor, especialmente após 2013, os ativos imobiliários aumentaram a um ritmo médio de 5,2% por ano no património das famílias ao longo da última década, tornando-se assim no principal vetor do crescimento de 63% da riqueza líquida média das famílias nacionais entre o segundo trimestre de 2013 e o segundo trimestre de 2023.

Embora haja um progresso notável da riqueza dos portugueses ao longo dos últimos dez anos, permanece atrás dos padrões europeus. Atualmente, o património médio dos agregados familiares nacionais é 29,7% inferior à média da riqueza das famílias da Zona Euro.

“A riqueza média é menor em Portugal, principalmente porque os valores médios da maior parte dos ativos [sobretudo imóveis] para as famílias que os possuem são muito inferiores” quando comparados com os europeus, referem Sónia Costa, Luísa Farinha, Luís Martins e Renata Mesquita, num trabalho académico publicado em outubro de 2021, em que já salientavam para que “a riqueza média ou mediana das famílias em Portugal é cerca de 30% inferior à da área do euro.”

Apesar do fosso da riqueza dos portugueses face à média das famílias europeias estar a baixar ao longo dos últimos oito anos, tem sido feito a um ritmo bastante reduzido. Hoje, o diferencial da riqueza das famílias nacionais para as europeias encontra-se, inclusive, num nível acima do período pré-pandemia e até abaixo dos valores registados em 2010.

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