Decisão 22: Nova newsletter diária sobre as eleições

Ter, 18 jan 2022

Vamos conversar. Escreva-nos nas redes sociais da CNN Portugal com questões e temas sobre as eleições legislativas

Dou-lhe as boas-vindas à nova newsletter da CNN Portugal. Vou escrever-lhe todos os dias sobre as eleições de dia 30, convidando a que entre na conversa com temas e questões. Para praticarmos o direito à informação, participando nas escolhas democráticas do país. Esta é uma Porta Aberta. Deixe-nos as suas questões nas nossas redes sociais (Instagram, FacebookTwitter e LinkedIn). Olá.

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Inês Sousa Real hoje no Montijo, de galochas vermelhas. Como Dorothy no Feiticeiro de Oz. (Detalhe. Fotografia António Cotrim, Agência Lusa)

A História explica, António Costa não

A partir de agora, sempre que alguém lhe perguntar o que correu mal, responda: “A história explica”. E mude de assunto. Foi isso que fez António Costa, no debate a nove desta segunda à noite, quando o jornalista Carlos Daniel lhe perguntou porque é que Portugal foi ultrapassado nos últimos 20 anos em crescimento económico por tantos países que chegaram mais tarde aos benefícios da União Europeia. Resposta: “A História explica”. Lapidar. E vazio.

Foi o único debate a nove, depois de trinta frente-a-frente na pré-campanha, que podem ser todos revistos na íntegra aqui, e que segundo o Público tiveram uma audiência somada de 20,2 milhões de espectadores.

Um dos problemas dos debates é, precisamente, sermos amiúde confrontados com versões diferentes para os mesmos factos, o que obriga a fazer “fact checks” para compreender o que está em causa. Às vezes, há afirmações que são factualmente falsas. A maior parte das vezes, contudo, trata-se de factos descontextualizados, incompletos ou tratados de forma populista. Ou, como cunhou também Costa no debate com Rui Rio, são “malandrices”. Com a verdade enganam.

Talvez a História seja “um conjunto de mentiras a que chegámos a acordo”, como terá afirmado Napoleão Bonaparte. Ou talvez tenha apenas costas largas. Porque é que os salários são tão baixos em Portugal? Porque é que 10% dos trabalhadores são pobres e há agora dois milhões de portugueses em risco de pobreza? Porque é que chefias de hospitais continuam a demitir-se?

A história explica. Siga.

Respostas aos leitores

Coligação PSD-CHEGA

Coligação, nunca, disse Rui Rio. Entendimentos, talvez. “A negociação [com o Chega] não pode chegar nunca, nunca, a uma situação em que haja uma coligação, em que haja ministros do Chega”, afirmou o presidente do PSD no debate com André Ventura. Contudo, quando lhe foi perguntado se prefere entregar o governo ao PS a chegar a um entendimento com o Chega, Rui Rio respondeu: “Não, não. Eu apresento o meu programa e aquilo que o Chega tem de ver é confrontar o programa do PSD com o programa do PS, ver qual é o que gosta mais.” A afirmação sugere que Rui Rio está aberto a negociar com o Chega apoios na Assembleia da República para aprovar um programa de Governo, se ganhar as eleições.

Educação

É verdade: a saúde ganhou quase 10-0 à educação enquanto tema nos debates. Nos 75 minutos do debate Costa-Rio, zero, tirando o chavão da “geração mais qualificada de sempre”. No debate de quase duas horas de ontem, a nove, quase zero, só de raspão. Percebe-se a incidência na saúde, mas é difícil perceber a ausência da educação. Estas são duas das três funções com maior despesa do Estado (só ultrapassadas pela segurança social) e a Educação é a que tem mais emprego público (186 mil funcionários públicos no final de 2020). Aliás, o triângulo entre educação, ciência e cultura está ausente da campanha.

Ainda assim, todos os partidos que elegeram deputados em 2019 dedicam capítulos nos programas eleitorais à Educação. Seguem-se algumas delas.

O PS aposta na continuidade e reforço das políticas seguidas desde 2015 e introduz propostas como a reabilitação e instituição da gratuitidade no ensino obrigatório, as residências escolares e um programa de apoio a famílias vulneráveis de base autárquica.

Já o PSD pretende mais autonomia para as escolas, “incentivando a flexibilidade pedagógica”, em torno de um currículo escolar comum, para garantir “igualdade de oportunidades de aprendizagem”. O partido defende também a reintrodução da prova de aferição no 4.º ano e das provas finais no 6.º, bem como a eliminação das provas de aferição nos 2.º, 5.º e 8.º anos de escolaridade.

À esquerda, a CDU pretende reduzir o número de alunos por turma (19 para o 1.º ciclo do ensino básico, 22 para o secundário) e eliminar todas as propinas, taxas e emolumentos e reforçar a Ação Social Escolar. Quem também defende a eliminação das propinas, mas só no caso das licenciaturas, é o Bloco de Esquerda, que propõe que a medida entre em vigor já no próximo ano. O partido defende o fim dos mega-agrupamentos e a gestão pública das cantinas escolares. O Livre pretende remover a Educação Moral e Religiosa do currículo das escolas públicas e transformar o 12.º ano num “ano zero” de entrada no ensino superior. O PAN vai mais longe que a CDU e propõe uma redução do número de alunos por turma para 15, pretendendo também promover a inclusão de aprendizagens ecológicas nos programas escolares.

À direita, a Iniciativa Liberal propõe a atribuição do “cheque-ensino” às famílias, para que possam ter liberdade de escolha da escola, seja no público ou no privado. O programa do Chega não detalha propostas concretas, elencando sim princípios como os do “combate intransigente à indisciplina”, “defesa intransigente dos exames nacionais” e “autonomia institucional”. Já o CDS-PP tem como bandeira “combater a ideologia de género e a sexualização da educação”.

Formação cívica

Formação cívica foi um tema polémico recente, depois da obrigatoriedade da disciplina Educação para a Cidadania e Desenvolvimento, para o 2.º e 3.º ciclos, introduzida em 2018, abordando temas como identidade de género, educação para a saúde e sexualidade ou ambiente. Houve dois manifestos, um a contestar a obrigatoriedade da disciplina e a defender o direito à “objeção de consciência”, outro que defendia as aulas da disciplina.

A maioria dos programas eleitorais dos partidos com assento parlamentar defende a importância da promoção da cidadania nas escolas. O CDS, por exemplo, refere que a disciplina deve ser “optativa”, reconhecendo à família “o papel da transmissão de valores”. Os programas da CDU e do Chega não fazem referência à educação para a cidadania.

Boletim

Ao contrário do que acontece nos das presidenciais, os boletins de voto das legislativas não têm fotografias dos candidatos. Porque se vota em partidos e respetivas listas, não diretamente em pessoas. É o que resulta da Lei Eleitoral, no ponto 2 do artigo 95: “Em cada boletim de voto são impressos, de harmonia com o modelo anexo a esta lei, as denominações, as siglas e os símbolos dos partidos e coligações proponentes de candidaturas, dispostos horizontalmente, uns abaixo dos outros, pela ordem resultante do sorteio efetuado nos termos do artigo 31.º, os quais devem reproduzir os constantes do registo ou da anotação do Tribunal Constitucional, conforme os casos, devendo os símbolos respeitar rigorosamente a composição, a configuração e as proporções dos registados ou anotados”. Já agora, e como exemplo, este ano em Lisboa (que elege 48 deputados) concorrem 20 partidos, que somam 960 candidatos individuais.

Factos primeiro

João Ferreira

 

O governo atualizou os salários da função pública este ano em 0,9%. Este aumento estava alinhado com a previsão de inflação inscrita na proposta de Orçamento do Estado, de novembro (que foi chumbado), e foi aprovado em Conselho de Ministros no início de dezembro. O problema é que a inflação entretanto disparou com a escassez das matérias primas e a subida dos preços da energia: a inflação homóloga foi de 1,8% em outubro, 2,6% em novembro e, segundo a estimativa rápida do INE, de 2,8% em dezembro. Para este ano de 2022, a previsão do Banco de Portugal é de uma inflação de 1,8%. E a da OCDE é de 1,7%. Sempre acima dos aumentos da função pública, que já perdera poder de compra em 2021.

 

Conclusão: verdadeiro

______

João Cotrim de Figueiredo

 

Não é fácil perceber as contas do líder da IL para concluir que “cada uma das famílias portuguesas [vai] gastar 1.200 euros do seu bolso para salvar a TAP”.

O Estado já injetou perto de dois mil milhões de euros na companhia, em 2020 e 2021, prevendo-se mais 1,2 mil milhões durante o plano de reestruturação, num total de 3,2 mil milhões.

Segundo as estatísticas do IRS do Ministério das Finanças relativas aos rendimentos de 2020 (as últimas disponíveis), declararam rendimentos ao Fisco 5.408.288 (5,4 milhões) de agregados familiares. Desses, cerca de metade declarou rendimentos brutos inferiores a 10 mil euros, valor insuficiente para pagar IRS. Houve pois três milhões de agregados que pagaram IRS.

Hipóteses:

- Se “cada uma das [5,4 milhões de] famílias portuguesas” pagou para salvar a TAP, a conta dá €590 por cada uma, logo Cotrim errou a conta.

- Se a expressão é uma simplificação e refere-se apenas às três milhões de famílias que paga IRS, então “cada uma das famílias portuguesas [que liquida IRS]” paga €1064, logo Cotrim errou a conta.

- Se Cotrim contabilizou não 3,2 mas 3,7 mil milhões para a TAP (valor inicialmente previsto pelo governo mas chumbado por Bruxelas) e dividiu apenas pelos três milhões de famílias que pagam IRS, então sim, a conta dá 1200 euros (mais precisamente, €1.231), mas Cotrim partiu de um valor errado.

Ou então o líder da IL incluiu outros impostos indiretos (como o IVA), mas estes não são pagos apenas por “famílias portuguesas”, são-no também por exemplo por turistas.

Além disso, é preciso ver que parte deste dinheiro poderá vir a ser recuperado, por exemplo numa privatização parcial da TAP. Mas isso já não entra nestas contas.

 

Conclusão: errado.

Best (and worst) of

No fim dos debates eleitorais, a minha avaliação é de que…

Rui Rio acabou melhor que António Costa, que começara melhor. Entre os dois, ganhou Rio.

Catarina Martins esteve melhor do que Jerónimo de Sousa (que seria substituído por João Oliveira por razões de saúde).

As grandes surpresas positivas foram João Cotrim de Figueiredo e Rui Tavares. O primeiro mostrou (do primeiro ao último debate) mais consistência política do que nas últimas eleições, o segundo conseguiu (sobretudo nos primeiros debates) reganhar credibilidade para o Livre e lançar temas e olhares diferentes. Ambos se prepararam bem. E ganharam com isso.

André Ventura saiu-se surpreendentemente mal num palco que domina. Demasiado piadético e muitas vezes apanhado em flagrante em contradições, duvido que tenha ganho votos com os debates.

Inês Sousa Real não esteve bem nem esteve mal, Francisco Rodrigues dos Santos esteve ao seu melhor e no seu pior. A primeira foi pacificadora, o segundo foi combativo.

Soundbites

Maioria absoluta: "Não posso criticar Costa, eu também quero"

Rui Rio, 18 de janeiro 

Se eu mandasse...

Ana Maria Magalhães

... tornava a vacina obrigatória.

 

Ana Maria Magalhães, escritora

 

“Uma percentagem de teimosos está a encher os hospitais, prejudica imenso o país. Isso atrapalha os médicos e impede outras pessoas com doenças para as quais não há vacinas de serem atendidas como deve ser.” Leia a resposta completa aqui.

Eurico Reis

… escolheria muito criteriosamente professores de Filosofia e de História.

 

Eurico Reis, juiz desembargador

 

“A primeira coisa que eu faria seria escolher, muito criteriosamente, professores de Filosofia e de História. E colocava rapazes e as raparigas a partir dos 12 anos a estudar como deve ser essas disciplinas. O que eu queria é que as pessoas aprendessem a pensar pela sua própria cabeça, e percebessem quando estão a ser manipuladas e quando estão a receber falsas informações. Quando não percebemos que estamos a ser manipulados, é a democracia que está em perigo e, em última análise, são os nossos próprios direitos individuais. É a nossa vida que está a ser posta em perigo. A segunda coisa seria tentar ressuscitar o Estado Social de Direito (…).” Pode ler a resposta e Eurico Reis na íntegra, e com mais explicações, aqui.

Acontece a seguir

Esta terça às 21:00 tem lugar o debate televisivo, na RTP, entre os partidos candidatos sem assento parlamentar: Aliança, PCTP/MRPP, RIR, Ergue-te, MPT, Nós, Cidadãos!, ADN, Juntos pelo Povo, PTP, PPM, MAS e Volt Portugal.

Na CNN Portugal, faremos debate e análise à campanha, incluindo da publicação dos dados da nossa “tracking poll”, a única que está a ser publicada diariamente.

Quanto às ações de campanha previstas para quarta-feira, António Costa dedicará o dia ao sul do país, mais concretamente a Beja e Faro, enquanto Rui Rio visitará as cidades da Guarda e Viseu.

Pela CDU, João Oliveira passará a tarde com trabalhadores da Exide em Vila Franca de Xira, antes de terminar o dia no comício do partido em Loures. Inês de Sousa Real, do PAN, dedica o dia à cidade de Évora, onde visitará o canil municipal. Rui Tavares tem prevista, para a manhã de quarta-feira, uma visita às Salinas do Samouco.

Pelos partidos de direita, André Ventura tem previstas uma arruada em Viseu e um jantar-comício na Guarda, enquanto João Cotrim de Figueiredo fará campanha no Hospital de Braga e em Guimarães. Francisco Rodrigues dos Santos, por seu turno, terá várias ações de campanha nos distritos de Setúbal e Lisboa, incluindo o encontro com jovens no Mercado de Cultura de Arroios.

Agora nós

“Olhar para fora da bolha é um exercício mais que necessário”, escreveu Hermane Pegoraro Schneider no Facebook. Foi um dos comentários que recebi depois de partilhar o artigo de opinião “A mulher que mudou toda a política sem querer”, muitos dos quais sublinhando uma frase quase final do texto: muitos analistas, comentadores e jornalistas falham “por darem ouvidos de mais à bolha política que fala ao telefone e olhos de menos ao que se passa nas ruas, nos campos, nas cidades.” Como detalhou Maria Olívia Santos, “o que interessa é mesmo o fim do artigo: olhar para fora da bolha porque já não se aguenta tanta conversa repetida e sempre a bater nos mesmos argumentos. Pobres, medíocres até, com falta de olhares, como que a manter tudo dentro da tal bolha de onde não saem políticos, jornalistas e, por consequência, toda a gente. Depois vê-se o resultado: pensamento crítico = zero. Há que saber virar os binóculos e não ter receio de dizer coisas diferentes dos outros e do que se acha que será o mais correto. Até porque, geralmente, é o mais desinteressante. E tantas vezes ao lado.”

Enfio a minha parte da carapuça, o de “excesso” de redação e falta de realidade concreta. É para contrariar essa tendência que temos dezenas de repórteres na rua, em contacto direto com as populações. E é também por isso que lançamos esta newsletter, abrindo a porta a perguntas e temas de leitores e não apenas de fontes oficiais e políticas. Falaremos mais sobre isto.

E finalmente...

Este texto é o melhor do dia. São 55 shots do Filipe Santos Costa, no “Folhetim de Voto”, a melhor coluna diária da campanha. Eu sou suspeito para dizê-lo, claro: leia e negue, se for o caso. Mas leia. Eis um excerto:

“O que é importante é moralizar”, disse o líder do Chega, que foi condenado em tribunal por insultar uma família por ser pobre e negra, cujo partido está a ser despejado de uma sede por não pagar a renda e que teve um candidato autárquico que desatou aos tiros na rua.

Já a Catarina Pereira assina a coluna “O Combate dos Chefes”, que diariamente se debruça sobre o confronto entre Costa e Rio. Do texto de hoje, para ler na íntegra aqui:

“Gosto de pensar que, no próximo dia 30, cerca de zero eleitores vão às urnas para (…) se questionarem: “então, o que penso eu sobre a prisão perpétua?” Talvez esteja a ser otimista, mas também confesso não conhecer ninguém de 1884.”

Acompanhe-nos a qualquer hora na televisão e no site da CNN Portugal. Volto a escrever-lhe daqui a umas horas. Até amanhã!

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