Introdução- «Por mim ganhávamos todos os jogos»

21 fev 2001, 22:29

António Oliveira em grande entrevista a Maisfutebol O jogo com Andorra, o regresso de Nuno Gomes, a influência de Figo e Rui Costa, mas também de Couto, Jorge Costa, Sérgio Conceição e todos os outros. O namoro com um ideal maior do que tudo o resto. O Mundial-2002. O Euro-2004. Não, esse não, pelo menos para já...

Numa pequena sala ricamente decorada, para lá da guarda tranquila de um cão enorme, que, pela corpulência e estranha juba, se poderia confundir com um leão de latidos pouco ameaçadores, António Oliveira, um seleccionador menos litigante, agitava o cigarro entre os dedos e deixava-se conduzir pelo tempo, voando alto e rasante, em avanços e retrocessos, ao sabor das perguntas e ao ritmo calmo das respostas. A conversa fluiría num raio de pouco mais de uma dezena de anos, interrompendo-se bruscamente num emaranhado de pruridos sempre que o Campeonato do Mundo servisse de tema. Para o seleccionador, falar do jogo com Andorra é o suficiente para lhe exigir um exercício de futurologia, de que se diz incapaz. 

A teoria parece-lhe «simpática», deixa-o com vontade de lhe fazer uma vénia. Sentado nela, era capaz de desenhar todos os resultados e os contornos de uma campanha mirabolante. «Por mim», riu, «ganhávamos todos os jogos». Na verdade, consideraria mais adiante, em tom muito mais sério, cenário assim, ou semelhante, não é de todo impossível, desde que os jogadores façam aquilo a que chama «cultura de esforço», espécie de soma perfeita entre inegáveis qualidades técnicas, brilho físico e firmeza psicológica. «Eles sentem que podem ganhar qualquer coisa», explica-se, «mas perdem, quando pensarem que é fácil consegui-lo». 

No jogo de perguntas e respostas, que aceitou sem restrições, embora com algumas defesas, Oliveira dispensou a consulta da classificação ou a muleta das teses mais claras, ao ponto de considerar a República da Irlanda «mais forte» do que a Holanda ou de jurar, num menear da cabeça, que a qualificação de Portugal para o Campeonato do Mundo «não é caso para festejos na Baixa». O seleccionador tem outros planos, mas não os confessa. 

Com orgulho, fala num relacionamento «silencioso», que as objectivas não registam, com os jogadores, julgando-se apenas mais um, apesar de mais velho e, para seu azar, sempre com lugar no banco. Figo é a sua «bandeira», «o melhor do Mundo», ainda que Rui Costa o mantenha «encantado», num fascínio que se percebe até no discurso. «Adoro vê-lo jogar, é de uma elegância extraordinária», confessaria, pouco antes de lhe exigir «um golo por jogo». Ou, em contrapartida, «cinco a dez remates» à baliza. Basta, crê o seleccionador, que faça uso de todos os seus recursos. 

Os elogios alargam-se a João Pinto, passam por Sérgio Conceição, esbarram em Fernando Couto, sobram para Jorge Costa e morrem nas mãos de Quim, uma aposta muito sua, ainda Oliveira treinava o Braga. Os aplausos carregavam problemas que o seleccionador podia distinguir à distância, em especial na concorrência recuperada pela disponibilidade de Nuno Gomes, Paulo Bento e Abel Xavier, que não atenuam o desequilíbrio reconhecido à esquerda e lhe dá muito em que pensar. Nuno Gomes... Pauleta... Quem sabe se ambos e ao mesmo tempo... O treinador ainda não pensou seriamente no assunto, mas foi o primeiro a sugerir a hipótese. 

António Oliveira, mais «maduro» e calmo, desconhece tácticas para vencer. Já travou conhecimento com algumas para não perder, mas jamais atribuirá o êxito de um jogo a uma estratégia e, em última análise, a si próprio. «São eles os criadores», diz, a propósito dos jogadores e das vitórias, reconhecendo entre ambos uma relação de causa e efeito. Resumindo, quase tudo depende dos «artistas», assim lhes chama, embora prefira conjugar os verbos na primeira pessoa do plural, gesto que, por arrasto e competência, o inclui, quando se fala de responsabilidade. «No dia em que pensarmos que já ganhámos alguma coisa, começamos a perder». É aí que entronca toda a sua filosofia, um punhado de escusas e muito tento na língua para não revelar os seus sonhos mais secretos. Nunca antes da qualificação e sabe-se lá se alguma vez a meio do Mundial. 

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