Alemanha e Argélia reencontram-se 32 anos depois da «vergonha»

30 jun 2014, 10:43
Alemanha-Argélia 1982

No Espanha-82 os argelinos estrearam-se num Campeonato do Mundo a vencer os alemães. Mas, depois da «vergonha de Gijón», foram os germânicos a passar à segunda fase. O reencontro histórico acontece nos oitavos de final deste Mundial do Brasil, nesta segunda-feira com duas seleções africanas em campo

França-Nigéria, 17h, Sport TV1
Alemanha-Argélia, 21h, RTP 1


O CALENDÁRIO do Mundial


Esta segunda-feira entram em campo as duas seleções africanas que pela primeira vez colocaram duas equipas do continente em simultâneo nos oitavos de final de um Campeonato do Mundo. Pela frente, vão ter duas das mais fortes seleções europeias da atualidade, uma delas candidata ao título ainda não tinha começado Mundial.

França-Nigéria, (oitavos de final), 17h, Sport TV1
Estádio Nacional, Brasília
Árbitro: Mark Geiger (EUA)


A abrir o terceiro dia dos oitavos de final do Campeonato do Mundo defrontam-se uma das seleções que já está a ser incluída entre as favoritas à vitória, a França, e uma seleção à procura da sua melhor participação num Mundial, a Nigéria – em consonância com a fase de grupos de que realizaram.

A seleção de Didier Deschamps está próxima da sua máxima força – se todas as dúvidas ficarem bem resolvidas – e poderá apresentar o seu onze
mais forte. Certo é o regresso de Cabaye, que cumpriu frente ao Equador um jogo de castigo pelos cartões amarelos vistos nos dois primeiros jogos. No que respeita à condição física, Valbuena também deverá estar recuperado sendo Sakho quem apresenta ainda algumas dúvidas.

Do lado nigeriano, Stephen Keshi já sabe que perdeu Babtunde em definitivo para o testo do Mundial (devido a uma fratura num pulso), mas ainda não sabe se pode voltar a contar com Moses, que ficou de fora frente à Argentina.

Atenção a:


Cabaye:
O médio gaulês está de volta às opções de Didier Deschamps para o seu lugar no meio-campo. A par do importante papel do jogador do PSG no centro do jogo, Cabaye trará também consigo a serenidade que os franceses precisarão para não estarem em campo desconcentrados, pois o médio já mandou calar
que já fala em vencer o Mundial: «A confiança não deve tornar-se arrogância porque é assim que começam os problemas.»

Musa:
Depois da grande exibição frente à Argentina, a Nigéria voltará a apostar na velocidade e criatividade do extremo do CSKA para romper a defesa francesa. Numa seleção em que os pontas de lança não têm conseguido golos e têm sido os médios mais avançados a fazê-lo, Musa mostrou-se a um altíssimo nível no último jogo frente a atual defensiva
seleção argentina.

Histórico:
França e Nigéria defrontaram-se apena uma vez com as «Super Águias» a vencerem o jogo (1-0) disputado em casa dos gauleses.

Equipas prováveis:


França:
Lloris, Debuchy, Varane, Sakho, Evra, Matudi, Cabaye, Pogba, Griezmann, Valbuena e Benzema.

Nigéria.
Enyeama, Ambrose, Yobo, Omeruo, Oshariwa, Mikel, Onazi, Moses, Odemwingie, Musa e Emenike.

Alemanha-Argélia (oitavos de final), 21h, RTP 1
Estádio Beira-Rio, Porto Alegre
Ábitro: Sandro Ricci (Brasil)


Alemanha e Argélia vão defrontar-se nesta segunda-feira nos oitavos de final do Campeonato do Mundo. Estamos em 2014. E o histórico de jogos entre os dois países é reduzido. Mas a história que cruza as duas seleções deixou marca nos Mundiais. E começou a ser recuperada nesta semana de última jornada da fase de grupos da competição.

A memória foi reavivada quando ficou fechada a segunda jornada do Grupo G, no qual estava Portugal. Alemanha e Estados Unidos já tinham encontro marcado por via do calendário. À segunda jornada concluída ficaram a saber que um empate nessa terceira ronda servia os interesses do apuramento de ambos tornando inútil para as mesmas aspirações de Portugal e Gana o resultado do jogo que estes iriam disputar à mesma hora.

E que memória foi essa? Foi a memória do Mundial 1982. Foi a memória do que ficou para a história como «a vergonha de Gijón». Porque esta «vergonha» também envolveu a Alemanha. Porque esta «vergonha» também incluiu um jogo em que o resultado registado entre a Alemanha e a Áustria podia servir os interesses de apuramento de ambas as seleções para a segunda fase deixando a outra equipa do grupo com possibilidade de apuramento a assistir ao que os seus adversários faziam (?) sem nada poder fazer. Como aconteceu.



O Grupo II do Campeonato do Mundo Espanha-82 era composto pela Alemanha, pela Áustria, pelo Chile e pela estreante Argélia. Os argelinos surpreenderam o mundo e estrearam-se num Mundial a vencer a Alemanha. Depois de perderem com a Áustria, os africanos venceram os chilenos (como fizeram todos os outros) e fecharam os seus jogos no grupo com duas vitórias e uma derrota. Mas o grupo não ficou logo fechado nesse dia.

O jogo entre Alemanha e Áustria da 3ª e última jornada só se jogou no dia seguinte – situação de jogos em dias diferentes que era normal nos Campeonatos de então. Os germânicos viram-se obrigados a vencer para passarem aos oitavos de final. Os austríacos podiam perder por dois golos e ainda se apurarem, pois a Argélia ficaria a perder para os outros dois no desempate por golos. Como aconteceu.

Os alemães fizeram 1-0 aos 10 minutos de jogo. Ainda houve mais algumas jogadas de ataque, mas o jogo acabou aí; para passar-se a 80 minutos de trocas e perdas de bola a meio campo, jogadas e remates
totalmente inofensivos: um passar de tempo
que provocou indignação, suscitou sentimentos de injustiça para com a Argélia e se tornou numa página negra não só dos Mundiais, mas do futebol.



No estádio El Molinón, do Sporting Gijón, o público insultou as seleções, desprezou o antijogo, saudou a Argélia, cujos adeptos presentes mostravam notas. Os narradores alemães da televisão e rádio nacionais calaram-se durante minutos em protesto e pediram à sua federação «explicações» para o espetáculo «vergonhoso».

Os jogadores não admitiram ter combinado o resultado. Os alemães – sendo os terceiros do grupo à entrada para a última jornada – foram sempre os mais visados e, como se ouviu no vídeo, ainda vários anos mais tarde justificaram o futebol jogado. Urlich Stielike garante nas imagens que «não houve combinações antes do jogo». Apenas «não havia necessidade de procurar mais golos». Harald Schumacher esteve em sintonia: «Jogámos pelo resultado. Foi isso.»

A Argélia pediu na altura a impugnação do jogo. A FIFA não atendeu a essas intenções, recordou o «El País»: «O jogo disputou-se segundo as regras. A FIFA não intervém nas táticas que cada equipa utiliza.» O austríaco Hans Krankl recusou no final do jogo qualquer combinação: «Não fizemos acordos, mas não podíamos forçar-nos fisicamente. Da mesma forma que também estávamos sem motivação. Os alemães tinha de ganhar, mas também não eram muito bons. Tinham medo.» A crónica do «El País» do jogo do dia 25 de junho de 1982 teve o título «Sem dignidade nem galhardia». O também espanhol «El Comercio» colocou a crónica do jogo nas páginas da secção dos «casos de polícia». A partir desse Mundfial, os jogos da última jornada da fase de grupos passaram a fazer-se à mesma hora.



Vinte e cinco anos depois, em 1987, o defesa esquerdo alemão Hans-Peter Briegel confessou «tristeza». «Não tenho mais nada a dizer do que apresentar as minhas desculpas à Argélia porque merecia passar à segunda fase depois de fazer exibições de qualidade no Mundial», disse Briegel em janeiro de 2007 numa entrevista ao jornal «Al-Ittihad» quando era treinador no Bahrain (numa citação do «Afrik-foot»).

O antigo lateral esquerdo alemão de aspeto espartano assumiu as suas responsabilidades: «Estava ao nosso alcance vencer a Áustria por mais de dois golos, mas isso não aconteceu e eu desculpo-me perante a Argélia.» E será que os argelinos já perdoaram?

Parece que sim. Rabah Madjer era uma das estrelas – a par do Bola de Ouro da África Lakhdar Belloumi – e contou há poucos dias ao Maisfutebol
que «já passou». «Foi o jogo da vergonha, como todos sabem. É futebol, já passou. Mas nós é que lhes demos essa oportunidade. Se tivéssemos ganho à Áustria eles jogavam para ver qual deles passava connosco», comentou.

«Em condições normais, ganhávamos aquele jogo facilmente. Mas os jogadores ficaram muito inchados com a vitória com a Alemanha e não entraram em campo da mesma forma. E a Áustria tinha muito medo nosso. Muito medo mesmo. Foram mais profissionais que a Alemanha e isso fez a diferença», analisou Madjer.

Diferenças de atitude que permitem também lembrar a estreia argelina em Mundiais, no primeiro jogo daquele Grupo II, frente à Alemanha – o embate
que vai repetir-se nesta segunda-feira cuja primeira edição teve a vitória da desconhecida equipa magrebina.



«Foi uma surpresa para todos. Não tenho dúvidas de que a equipa alemã menosprezou-nos. Achavam que estava ganho, viam-nos como uma equipa da África do Norte que não ia ter hipótese. Acharam que ia ser fácil. Correu-lhes mal», recordou Madjer.

Briegel recordou na entrevista citada que «alguns» dos jogadores alemães «falavam em ganhar por cinco ou seis golos...» o «TSA-Algerie» recupera as conferência de imprensa da altura de estrelas da Alemanha como Breitner, Stielike ou Rummenigge onde se ouviu que se iria «dedicar o sétimo golo à mulher e o oitavo ao cão».

A surpresa da Argélia traduziu-se na vitória sobre a favorita Alemanha (que chegaria à final) por 2-1. Como recordou
para o Maisfutebol
Madjer, o segredo da Argélia frente aos germânicos foi «jogar com confiança» desenvolvendo um «futebol ofensivo». «Jogámos bonito», frisou o mercador do primeiro golo argelino num jogo que ficou para a história do país e dos Mundiais.



No reencontro com a história marcado para estra segunda-feira, a tónica argelina está mais presente no Alemanha-Argélia do que no Alemanha-Áustria. O «TAS» recorda que (também «só» 25 anos depois) Schumacher acabou por fazer a sua contrição tentando promover um jogo de caridade entre os jogadores das duas seleções de 1982 – que acabou por nunca realizar-se. Mas Madjer – como já nos disse – remete a «vergonha» para o passado.

E já neste sábado, Madjer voltou a recordar a Alemanha de 1982 para referir que a atual seleção comandada por Joachim Löw é superior à do seu tempo. «A diferença entre esta seleção alemã e a de 1982 é que esta ultrapassa a Argélia em todos os componentes do jogo técnicos ou táticos», disse o argelino explicando, em declarações ao «Le Buteur» porquê: «O facto de a equipa ser dirigida por um treinador que está no cargo há seis anos permite ter a estabilidade exigida apoiando-se em jogadores de grande qualidade.»

Madjer dá o favoritismo à Alemanha, mas, é dos que mais do que todos, sabe que é possível a Argélia vencer: «A experiência lembra-nos que nada é impossível no futebol. A Equipa Nacional vai jogar com o coração e com a vontade que demonstrou na fase de grupos. E, quem sabe, poderá impor-se à Alemanha como nós fizemos em 1982.»

Islam Slimani foi o «homem do jogo» nas duas partidas que a Argélia venceu neste Mundial e considera que a sua seleção parte agora para este jogo com «tudo a favor». «Vamos jogar contra um dos favoritos à vitória, mas isso não significa apenas que vamos encarar o embate na pele de vítima. Vamos preparar-nos bem e, sobretudo, jogar sem pressão», disse ao mesmo «Le Buteur» o avançado do Sporting considerando que essa pressão «estará seguramente sobre os ombros da Alemanha».

Argélia ganhou sempre


Segue-se então para o jogo desta segunda-feira em que a toda poderosa Alemanha candidata ao título mundial defronta a estreante nos oitavos de final Argélia. É, talvez, o embate mais desequilibrado desta fase do Campeonato.

Os argelinos são cem por cento vitoriosos frente aos germânicos, há a questão histórica do jogo. Mas o favoritismo não pode não ser atribuído à Alemanha, como os dois lados reconhecem.

Joachim Löw não pode contar com Podolski, que se lesionou na última jornada da primeira fase. Boateng deverá estar apto para se manter no onze
, assim como Schweinsteiger deverá ter ganho o lugar a Khedira.

Na Argélia, Vahid Halilodzic não tem jogadores indisponíveis e deverá fazer alinhar a equipa que garantiu o apuramento com o empate frente à Rússia. Com o Mundial a ser disputado em período de Ramadão – como pode ler aqui
–, o cumprimento das regras do Islão pode interferir com o rendimento desportivo dos argelinos. As autoridades religiosas já autorizaram os jogadores a não cumprirem o jejum, mas Bentaleb, por exemplo, já frisou, não obstante, que a decisão de cumprir o jejum «mantém-se pessoal».

Atenção a:


Götze:
Para a última jornada da fase de grupos, Joachim Löw fez duas trocas na equipa tirando Götze e Khedira. Schweinsteiger terá agarrado o lugar. Com a lesão de Podolski, Gözte voltará ao onze
e terá talvez a última hipótese de mostrar que o lugar é seu. Não porque lhe falte capacidade para desequilibrar no ataque e ser um jogador a aparecer para a finalização, mas porque a concorrência entre os germânicos é muito forte.

Halliche:
O jogador da Académica está a fazer um Mundial muito bom e terá aqui a maior prova de fogo frente a um candidato a vencer o Campeonato do Mundo. A extrema mobilidade do ataque germânico requer atenção (e qualidade) sem falhas. Que poderá aproveitar nas bolas paradas no ataque – como já o fez contra a Coreia do Sul.

Histórico:
Alemanha e Argélia têm dois encontros feitos entre si oficializados internacionalmente. E ambos forma ganhos pelos argelinos. Um deles foi o tal de 1982, O outro foi em 1964, disputado em Argel, que a seleção da casa venceu por 2-0. Ou seja, a favorita Alemanha perdeu sempre com a Argélia.

Equipas prováveis:


Alemanha:
Neuer, Boateng, Mertesacker, Hummels, Höwedes, Lahm, Schweinsteiger, Özil, Kroos, Götze e Müller.

Argélia:
M`Bohli, Mendi, Belkalem, Halliche, Mesbah, Medjani, Bentaleb, Feghouli, Brahimi, Djabou e Slimani.

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