E você, quantos países já riscou da sua lista?
A maioria dos viajantes tem a sua própria lista de destinos mais desejados. Mas quantos têm todos os países do mundo assinalados?
Apesar do número daqueles que conseguiram este feito ainda ser relativamente pequeno – estima-se que cerca de 400 -, há cada vez mais pessoas a dar tudo para atingir esta meta.
De facto, o ano de 2023 assistiu a um recorde de 50 novas entradas na lista daqueles que viajaram para os 195 países e territórios reconhecidos pelas Nações Unidas, de acordo com a NomadMania, uma plataforma digital que permite acompanhar as viagens daqueles que andam a explorar o mundo.
Então, o que leva alguém a procurar viajar para todos os países do mundo? E quão difícil é alcançá-lo?
A maioria dos viajantes tem a sua própria lista de destinos mais desejados. Mas quantos têm todos os países do mundo assinalados?
Apesar do número daqueles que conseguiram este feito ainda ser relativamente pequeno – estima-se que cerca de 400 -, há cada vez mais pessoas a dar tudo para atingir esta meta.
De facto, o ano de 2023 assistiu a um recorde de 50 novas entradas na lista daqueles que viajaram para os 195 países e territórios reconhecidos pelas Nações Unidas, de acordo com a NomadMania, uma plataforma digital que permite acompanhar as viagens daqueles que andam a explorar o mundo.
Então, o que leva alguém a procurar viajar para todos os países do mundo? E quão difícil é alcançá-lo?
Colecionar países
Acredita-se que o finlandês Rauli Virtanen, escritor e correspondente no estrangeiro, que cresceu numa vila rural, tenha sido a primeira pessoa a visitar todos os países do mundo.
Embora houvesse menos países reconhecidos pelas Nações Unidas (170) quando Virtanen alcançou este feito em 1988, ele assegura que tem “adicionado os novos” nos anos que se seguiram.
Quando questionado sobre a motivação por detrás do seu desejo de visitar todos os países, Virtanen simplifica com a “extrema curiosidade e a mentalidade de colecionador”.
“No meio dos anos 80, reparei que já tinha estado em 150 países e pensei que talvez pudesse visitar os restantes antes de morrer”, conta à CNN Travel por email.
Virtanen pode ter completado com sucesso este desafio no final da década de 1980, mas a ideia de viajantes a “colecionar países” é muito mais antiga.
A The Travelers’ Century Club (TCC), uma organização para pessoas que já visitaram 100 ou mais países e territórios, foi lançada em 1954 e ainda hoje se mantém forte.
Desde então, outras plataformas, como a competitiva comunidade de viajantes Most Traveled People (MTP) ou a Nomad Mania ganharam destaque.
“Penso que sempre houve uma motivação intrínseca para viajar, mas historicamente era algo limitado a pessoas com recursos financeiros, uma carreira flexível e muita saúde”, diz Michael O’Regan, professor de Turismo e Eventos na Glasgow Caledonian University, no Reino Unido.
O’Regan destaca ainda que agora há mais pessoas com formas de ganhar dinheiro enquanto viajam, enquanto outras escolhem viajar após uma reforma antecipada.
“Antes, era preciso ter ‘contactos’ em determinados países, [ou] teria dificuldades em obter vistos ou convites”, diz.
“Era preciso um passaporte ‘forte’ e acesso a recursos, como guias intérpretes ou conhecimento privilegiado sobre transportes e hotéis”.
Claro que isto já não se verifica para muitos viajantes nos nossos dias, graças às companhias aéreas de baixo custo, aos vistos à chega e aos sistemas de reservas online, nota O’Regan.
“É muito mais fácil viajar e irmos marcando um certo na lista dos países (especialmente se contarmos com escalas ou trânsitos)”, junta.
O americano Patrick Gilliland está entre as muitas pessoas que têm optado por dedicar os seus últimos anos a viajar à volta do mundo.
Fator acessibilidade
Tal como aqueles que riscaram o último país da sua lista de viagens nos últimos anos, a épica aventura de Patrick Gilliland foi adiada com a pandemia de covid-19, que levou ao fecho de fronteiras e a confinamentos, com alguns países a manter as restrições em vigor durante muito mais tempo do que outros.
Mas este homem de 62 anos conseguiu finalmente realizar o seu sonho no ano passado, depois de muitos anos em viagem.
“Nunca pensei que seria possível visitar todos os países do mundo até há uns anos”, conta à CNN Travel. “Achava que alguns lugares seriam muito perigosos ou mesmo que os vistos seriam impossíveis”.
Gilliland, que gastou pelo menos 48 semanas por ano a viajar nos últimos anos, reconhece que ter acesso a todos os países não foi algo fácil e que envolveu “um pouco de sorte e de tempo”.
“Visitei a Coreia do Norte há 20 anos, quando as relações com os Estados Unidos eram melhores”, diz. “Tentei várias vezes ao longo dos anos conseguir um visto do Irão. Nauru é tão pouco visitado que o visto é complicado, as decisões ficam ao critério de cada um”
Quando chegou ao último país, a Líbia, que tinha acabado de reabrir aos cidadãos norte-americanos, em setembro, foi barrado no aeroporto.
Entre os poucos viajantes que já visitaram todos os países do mundo, a maioria, senão todos, já tinha estado num elevado número de países antes de assumir este desafio.
A blogger eslovaca Martina Sebova já tinha visitado mais de 100 dos 195 países e territórios reconhecidos pelas Nações Unidas antes de decidir visitar os que lhe faltavam com a australiana e parceira Rachel Davey.
“Acho que ficaria aterrorizada se tivesse de visitar todos os países do mundo e ainda só estivesse estado em 10”, disse Sebova à CNN Travel em 2023.
“Acho que não é sequer viável. É preciso viajar muito [antes de fazer algo como isto]”.
A explosão das redes sociais, que se tornaram populares no início dos anos 2000, tiveram, sem dúvida, um papel determinante no aumento do número de pessoas que desejam visitar todos os países do mundo.
“O advento das redes sociais, com plataformas como o Instagram ou o TikTok, significa que haverá utilizadores a ser inspirados por aqueles que estão a perseguir este objetivo de visitar X, Y, ou Z em todo o mundo”, diz O’Regan. “Agora parece mais acessível e viável do que nunca”.
Contudo, importa referir que esta acessibilidade está, em última análise, limitada àqueles que dispõem dos meios financeiros para viajar com frequência, bem como um passaporte que lhes permita irem para qualquer destino que queiram.
Realidade desconfortável
Esta é uma realidade desconfortável para Virtanen, que admite que desenvolveu “sentimentos contraditórios” sobre a sua incrível conquista ao longo dos anos.
“Tive muita sorte”, reconhece, antes de explicar que conseguiu visitar 95% dos países devido ao seu trabalho, e que, de outro modo, nunca teria sido capaz de pagar as viagens para tantos lugares.
“Tive editores que me aceitaram as minhas despesas de viagens e que aceitavam as minhas ideias para viajar para países distantes, para que os meus leitores e espectadores pudessem saber o que se estava a passar”
“Pertenço àquela pequena minoria de pessoas, nascidas e educadas em países ricos, que conseguem pagar uma viagem para qualquer lugar no mundo. Tenho uma espécie de sentimento de culpa com isso – espero que me entendas – e desde então nunca mais disse a pessoas nos países mais pobres que já visitei todo os países do mundo”.
O viajante Romaine Welds, nascido na Jamaica, tinha tido poucas oportunidades de ver o mundo antes de se mudar para os Estados Unidos em 2007 e começar a trabalhar para uma companhia aérea. De facto, nunca tinha saído da Jamaica antes disso. Lembra-se de olhar para as montanhas do seu país e se ter questionado sobre o que haveria para lá delas.
“A minha família era pobre e ninguém tinha viajado ainda, à exceção do meu pai, que viajou uma vez entre a Jamaica e Inglaterra”, explica por email.
Depois de aproveitar ao máximos os voos grátis e com descontos que conseguia através do trabalho, Welds começou a visitar os países da sua “lista de desejos”, conseguindo ir a 100.
Quando tomou consciência de que já estava “a meio caminho”, começou a visitar os outros 95 países reconhecidos pelas Nações Unidas, com o objetivo de ser o primeiro jamaicano e caribenho a fazê-lo. Visitou o último país, Antígua, em 2022.
“É muito especial para mim estar num país como jamaicano, a representar o meu país”, diz, recordando como era raro ver pessoas a viajar tanto quando ele era pequeno.
O tempo que os viajantes levam para riscar todos os países do mundo varia muito. Enquanto Welds conseguiu fazê-lo em cerca de 16 anos, para Gilliland foram precisas quatro décadas.
Alguns viajantes têm entrado na disputa para perceber quem o faz em tempo recorde – com o canadiano Taylor Demonbreun atualmente a segurar o título de “viajante que visitou todos os países soberanos em menos tempo”, com um ano e 189 dias.
Grupo de Elite
Esta competição é algo que preocupa Virtanen, que admite ser crítico quando vê alguém pessoas aparentemente “a pular de um sítio para o outro, sendo a única informação que obtemos deles uma ‘selfie’ em que se autopromovem”.
“Ultimamente tornou-se mais fácil visitar todos os países do mundo, se tiveres dinheiro e o passaporte certo”, junta.
“Já não somos uma ‘tribo’ de mochileiros que carregam o guia Lonely Planet. As motivações estão a mudar”.
“A maioria ainda tem aquela curiosidade de explorador, mas a vaidade está a tomar conta dessas viagens, sobretudo quando se tornou tão fácil percorrer o mundo”.
Tornar-se parte do grupo de elite de viajantes que já estiveram em todos os países do mundo pode abrir novas portas.
Alguns deles têm publicado livros sobre as suas experiências. Incluindo a influenciadora de viagens Jessica Nabongo, com raízes no Uganda e nos Estados Unidos, que se tornou a primeira mulher negra a viajar para todos os países do mundo em 2019. Ou Gunnar Garfors, que se acredita ter sido a primeira pessoa a visitar todos os países do mundo duas vezes.
No ano passdo, o portal de pesquisa e agência de viagens Skyscanner lançou uma iniciativa temporária, a “Everywhere Agency”, que conecta viajantes com pessoas que já visitaram todos os países do globo – entre eles Garfors e Basanth Sadasivan, uma das pessoas mais novas a visitar todos os países no mundo.
Embora O’Regan reconheça que alguns viajantes são “movidos por um impulso incontrolável” de visitar todos os países, sente que “colecionar países” desta forma pode “promover viagens superficiais, que negligenciam uma conexão e uma compreensão cultural mais profunda”.
“Há um incentivo par saltar rapidamente de região em região, arriscando precisamente aquilo de que queremos recuperar: esgotamento físico e mental”, diz O’Regan.
“Desvaloriza o potencial das viagens para a troca cultural, para a autorreflexão, bem como os conceitos de sustentabilidade e de calma nas viagens”.
No que respeita à velocidade, Welds admite que cada viajante terá “os seus próprios objetivos”, mas sente que é importante “viajar com vagar e aproveitar cada país”.
“Penso que, se realmente queres ver o mundo, vais precisar de tempo”, diz à CNN Travel. “Cada pessoa terá o seu tempo, mas eu não faria uma corrida à volta do mundo. Na minha visão, é um desperdício de tempo”.
Um enigma
O que significa uma verdadeira “visita”? O tema tem sido alvo de discussão nos últimos anos, com muitos viajantes a discordar sobre quais serão os melhores critérios.
No ano passado, a NomadMania produziu orientações detalhadas sobre este assunto, após sondar os seus utilizadores em 2022 e 2023.
“Tem sido importante para mim conhecer o máximo possível sobre cada país que visito”, diz Gilliland, explicando que às vezes passava seis semanas num país enquanto completava o desafio. E que só ficava cerca de dia e meio em países mais pequenos como o Mónaco ou o Luxemburgo.
“Na minha opinião, escalas em aeroportos não contam”, diz Virtanen. “Visitar a zona desmilitarizada não é visitar a Coreia do Norte. É preciso sempre passar pelos serviços de imigração”.
“É preciso. Contudo, viagens de um dia para países mais pequenos como Nauru, San Marino, Andorra, Liechtenstein ou Luxemburgo são aceitáveis”:
“Um ‘verdadeiro’ viajante fica dias ou semanas em lugares como Lagos, Mumbai, Mongólia ou Colômbia”.
Uma vez que há viajantes que só agora começam a assinalar os seus últimos países, porque outrora foram impedidos de terminar o seu desafio devido a fechos de fronteiras ou à agitação política em determinados países, é muito provável que a lista de pessoas que já viajaram para todos os países do mundo tenha um aumento ainda maior em 2024.
Para O’Regan, isto não é necessariamente uma coisa boa, já que “a maioria destes turistas simplesmente não tem o tempo necessário para viajar de uma forma sustentável ou para pensar nos impactos das suas viagens”.
“O seu estilo de vida, se fosse medido, provavelmente seria um grande contributo para as alterações climáticas, através de atividades ricas em carbono”, junta. “Não têm consciência disso”.
E salienta que se estima que mais de 90% das pessoas nunca voou e que apenas 1% da população mundial é responsável por metade das emissões da aviação.
Viajar para todos os países do mundo sem recorrer a aviões é algo possível, com toda a certeza, para aqueles que têm tempo, dinheiro e energia, como provou Torbjørn “Thor” Pedersen, que partiu da Dinamarca com esse objetivo em 2013.
Depois de quase 10 anos em movimento, Pedersen, que inclui na sua odisseia tanto estados soberanos reconhecidos pelas Nações Unidas como estados parcialmente reconhecidos, chegou ao derradeiro país, as Maldivas, em maio do ano passado.
Esta conquista, juntamente com a de Garfors, deverá inspirar outros a tentar feitos semelhantes e/ou a enfrentar novos desafios nos próximos anos, com cada vez mais pessoas a competir para reivindicar títulos e/ou quebrar recordes.
Embora Virtanen aceite que tal é inevitável, sente que aqueles que desejam visitar todos os países, tal como ele fez, deveriam também procurar formas de ajudar “a melhorar as vidas daqueles que não têm condições de viajar”.
“Se podemos pagar para voar à volta do mundo só para colecionar países e deixar uma pegada de carbono gigante, então somos ricos o suficiente para retribuir de alguma forma”, junta.