São "muito à direita" e regem-se pelos resultados, "mais do que pelos princípios": como duas ministras podem criar "problemas" a Montenegro

2 abr, 07:00
Luís Montenegro no Palácio de Belém (Lusa/TIAGO PETINGA)

No Governo que hoje toma posse há duas pastas que preocupam quem conhece bem o partido. São as duas lideradas por mulheres. Trabalho e Saúde. Pacheco Pereira avisa que podem ser “um problema” na hora de negociar com o PS. Porque estas duas novas ministras, diz quem lhes acompanhou o percurso, colocam os “resultados” em primeiro lugar

Algumas pessoas do novo Governo são muito à direita, vai ser um problema". O aviso foi deixado por José Pacheco Pereira. E o “problema”, justifica, vai ser na hora de eventuais negociações com o PS. Já lá vamos. Primeiro é preciso perceber quem, no executivo que hoje toma posse, é “muito à direita”.

À CNN Portugal, Pacheco Pereira vai direto ao assunto. É nas pastas “do Trabalho e da Saúde” que diz encontrar essa inclinação. As protagonistas, duas mulheres: Maria do Rosário Palma Ramalho e Ana Paula Martins, respetivamente.

O comentador, e militante do PSD, embora uma das vozes mais críticas do partido nos últimos anos, aconselha a procurar “entrevistas e trabalhos académicos” para entender as razões.

“Não havendo acordos com o Chega, têm de ser feitos com o PS. Ou há ministros que não fazem aquilo que até agora escreveram, disseram e propuseram. Ou então há um choque com o PS”, reitera.

"Resultados" em primeiro lugar

Esta posição de Pacheco Pereira é partilhada pelo politólogo José Filipe Pinto, investigador das forças à direita. Mas para o especialista o maior “problema”, ou antes, “a maior dor de cabeça” não estará nas pastas do Trabalho e da Saúde e sim naquelas onde há “aglutinações”: Agricultura e Pescas; Educação e Ensino Superior; Infraestruturas e Habitação. “Por mais secretarias de Estado que se venham a criar, não tem a importância do Ministério”, avisa.

Mas quando a análise passa da orgânica para as personalidades à frente de cada tutela, José Filipe Pinto também aponta os nomes de Maria do Rosário Palma Ramalho e Ana Paula Martins como as que estão “mais à direita”.

Tendo em conta o percurso e as posições publicamente assumidas por ambas, “medem as políticas pelos resultados, mais do que pelos princípios”, aponta o analista.

Segundo José Filipe Pinto, estas duas ministras podem vir “a ser acusadas de algum autoritarismo”, sobretudo pela esquerda, cuja orientação para estes dois ministérios poderá “gerar anticorpos com o PS”, já que “são medidas com grande custo humano”.

Em resumo: “Há uma forma de gerir e definir a estratégia que as afasta do PS, porque privilegiam a ética da responsabilidade sobre a ética da convicção.”

“Postura dirigista” no Trabalho: e as críticas às mexidas socialistas na lei

O Bloco de Esquerda, na voz do novo líder parlamentar, Fabien Figueiredo, definiu a nova ministra do Trabalho, Maria do Rosário Palma Ramalho, como “uma académica contra os direitos do trabalho”. E vários sindicatos mostraram receios nesse sentido.

“Tem uma postura dirigista”, classifica José Filipe Pinto. Entra no novo governo com a meta de simplificar o atual Código do Trabalho. Nos últimos tempos, a futura governante centrou a sua crítica na legislação do teletrabalho aprovada pelo PS em tempo de pandemia.

Já defendeu um regime de contratação a termo mais flexível, já criticou a falta de representatividade da atual contratação coletiva. E já viu um texto seu, a justificar que as razões económicas podem motivar o despedimento, a dar força a um despedimento na banca.

Sobre o direito à desconexão, um dos temas mais quentes no mercado de trabalho, chegou a responder assim: “Não precisamos de regular, mas precisamos de nos habituar, enquanto trabalhadores, a não atender o telefone”.

Posições que afastam esta professora de Direito do Trabalho do percurso levado a cabo pelo PS ao longo dos últimos anos e que podem ditar braços de ferro, em caso de necessidade de consensos, daqui em diante.

(Lusa)

“Dureza negocial” na Saúde: e o confronto com o modelo do PS

“Percebemos que, na postura que tem enquanto gestora, há alguma dureza negocial”. José Filipe Pinto descreve assim Ana Paula Martins, a próxima ministra da Saúde. E destaca que a mulher, escolhida pelo diretor-executivo do SNS, Fernando Araújo, vai agora inverter o jogo.

“O Governo de António Costa andou sempre à deriva no dossiê da Saúde e precisou de pessoas de pulso forte", como Ana Paula Martins, social-democrata há muito.

A passagem pela presidência do Conselho de Administração do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte, onde se integrava o maior hospital do país, o Santa Maria, foi curta. Um ano em funções.

Bateu com a porta, “após profunda reflexão pessoal”, por discordar do novo modelo de organização do SNS, com a criação de Unidades Locais de Saúde, como tem sido defendido pelo PS e pelo homem que a escolheu para este mesmo cargo.

E, mesmo que Ana Paula Martins seja conhecida pelo seu desejo de consensos, este tema poderá causar celeumas em eventuais negociações com os socialistas, que defendem com unhas e dentes as alterações levadas a cabo na organização do SNS.

“Tem uma ética da responsabilidade, dos resultados”, insiste José Filipe Pinto. Ana Paula Martins tem defendido que os gestores dos hospitais públicos têm de saber fazer o mesmo que os do privado, vê com bons olhos o regresso de parcerias público-privadas e a contratualização com o setor social.

“Os relatórios evidenciam que estas PPP na saúde foram globalmente muito positivas”, chegou a afirmar sobre a área dos cuidados continuados. É pragmática: o que “tiver de ser corrigido será corrigido”, o que “estiver a funcionar bem é para continuar”.

(Lusa)

A referência inevitável a Nuno Melo

José Pacheco Pereira e José Filipe Pinto concordam que este não é o Governo mais à direita de sempre. Esse título atiram para o executivo de Pedro Passos Coelho. "O Governo de Passos Coelho mudou o PSD, tirou o PSD da sua tradição social-democrata”, resume Pacheco Pereira.

Mas neste executivo de Luís Montenegro, dizem, há mais um nome que comprova essa inclinação para a direita: Nuno Melo, que fica com a Defesa. É pela própria ideologia do partido que lidera, o CDS-PP, mais conservador, que acaba referenciado.

Pacheco Pereira considera que Melo “não vai” ser respeitado pelas hierarquias militares. José Filipe Pinto concorda: “Com Nuno Melo, e numa altura em que a segurança está em causa, não sei bem se as chefias militares vão reconhecer a autoridade de que necessita”. Em especial numa altura em que se volta a discutir a possibilidade de um serviço militar obrigatório.

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