O círculo próximo aqueceu a festa, Montenegro não agoirou a chuva e foi levantado do chão. Na rua de Santa Catarina, quis provar aos eleitores "que não são de ninguém"

7 mar, 23:32
Campanha - Montene

Hugo Soares, Miranda Sarmento e Paulo Rangel animaram a arruada no Porto antes da chegada de Montenegro. O líder da AD foi recebido em êxtase por uma multidão azul e laranja, ao mesmo tempo que, alguns metros à frente, seguia a caravana do Partido Socialista. O dia acabou com Montenegro a recordar mais uma vez que só governa se ficar em primeiro lugar nas eleições de domingo

Na calçada molhada da Rua de Santa Catarina, no Porto, ainda estavam restos de cravos pisados e bandeiras do PS.  A caravana de Pedro Nuno Santos seguia 200 metros à frente da do PSD. Entre os sociais-democratas era Hugo Soares, secretário-geral do PSD, quem acertava as fileiras e ditava a contagem até Luís Montenegro chegar. “Vou agora buscá-lo”. Até esse momento, a festa era liderada por Joaquim Miranda Sarmento, Miguel Guimarães e por Paulo Rangel que iam saltando a tentar ampliar os cânticos dos jovens e a enchente de bandeiras e guarda-chuvas azuis e laranja. 

Acabou por não acontecer aquilo que a comitiva da AD mais temia, uma chuvada descomunal que complicasse a descida da rua mais concorrida do dia. Por isso, a tarde foi ser feita como planeada. O encontro para dar inicio ao percurso da Rua de Santa Catarina deu-se na Batalha, uma zona ali a poucos metros, onde se foram juntando centenas de militantes do PSD e do CDS. E nessa altura, os locais mais concorridos não eram os vários restaurantes de francesinhas à volta, nem o camião que distribuía balões insufláveis.

O espaço mais concorrido era mesmo em roda de uma carrinha branca que oferecia impermeáveis pretos estampados com o símbolo da Aliança Democrática. “Temos de nos precaver, que isto vai ser duro”, dizia um militante da Trofa. Ao lado dele, jovens aos saltos gritavam: “Graças a Deus não nasci socialista”.

Hugo Soares foi um dos primeiros a chegar ao ponto do início da arruada. Esteve sempre com um sorriso na cara depois de no dia anterior ter ouvido de Marques Mendes que ele terá um futuro brilhante na política e foi ele também que, com Miranda Sarmento e Rangel, começou a mobilizar as camadas de gente até ao primeiro checkpoint: o largo da igreja barroca de Santo Ildefonso. Foi no caminho até esse monumento que primeiro se previu a intensidade que a arruada iria ter. Ombros com ombros, guarda chuvas a baterem uns nos outros e um enorme cordão humano formado à volta da linha da frente.

A comitiva ia parando e seguindo lentamente pela rua de Santo Ildefonso, ainda sem Luís Montenegro, até descobrir outra sombra da passagem da caravana de Pedro Nuno Santos. Na viragem à direita, permanecia uma mini tenda com duas mulheres a exibir uma t-shirt verde estampada com o símbolo do PS que, com uma coluna a tocar a banda sonora do filme ‘Grease’, tentavam abafar o hino da candidatura de Montenegro. “Ainda vai votar na AD, vai ver”, disse-lhe um jovem fardado de laranja dos pés à cabeça.

Chegada de Montenegro à arruada de Santa Catarina/ LUSA

O momento em que Luís Montenegro chegou foi de alguma tensão. O cordão humano era constantemente empurrado por quem o queria cumprimentar, provocando tropeços e obrigando a um reforço de segurança para aumentar a área onde ia caminhar o líder social-democrata. Pedro Esteves, diretor de campanha, chegou mesmo a fazer algo que ainda não tinha feito em nenhuma arruada: entrou no círculo onde caminhava Montenegro rodeado de câmaras de televisão, para dar instruções a quem podia passar ou não. 

Ao lado da mulher, Montenegro empunhava um  "V" de vitória e confessava ter esperança de ter convencido muitos eleitores que ao início pensavam votar no PS ou no Chega. “Os eleitores não são de ninguém”, disse à chegada, acrescentando: “Estou muito confiante que os portugueses vão dar mais força ao próximo governo para levar este pais para a frente”. E tem alguma preocupação? perguntaram-lhe. “Nesta altura o que há é esperança”, respondeu. E de seguida, quando confrontado com uma pergunta sobre a abstenção, garantiu: “Eu sinto que este movimento de mudança vai ser mobilizador também para a votação”. Nessa altura, ouvia-se de um megafone: “Já não pára, Montenegro, já não pára”. Nuno Melo até grava o momento no telemóvel.

A chuva, essa, não passou de uma ameaça na tradicional descida da Rua de Santa Catarina, mas Montenegro mostrou-se logo ansioso com essa possibilidade, depois de o mau tempo o ter levado a adaptar uma arruada durante a manhã na Afurada para uma espécie de comício improvisado dentro de uma sala da Junta de Freguesia - e de a previsão nada favorável para sexta-feira, último dia da campanha, ter obrigado a cancelar a histórica descida do Chiado.

“Tínhamos esperança de que íamos encontrar uma janela sem chuva, espero não agoirar”, brincou ao ver os guarda chuvas a fechar e a multidão de gente a aproximar-se cada vez mais. Esta arruada, na terra de Sá Carneiro, assumiu, nunca poderia ser cancelada, já que é a “forma de retribuir tanta energia que foi passada”, para se "estar na rua com as pessoas de braços abertos, envolvendo e agregando cada vez mais forças”.

Não agoirou e acabou mesmo por ser levantado do chão pela sua comitiva ao mesmo tempo que, no horizonte, ainda se via a arruada do PS, mas já com alguns militantes a desmobilizar e a descer na sua direção. Empoleirado no braço de Miguel Guimarães, antigo bastonário da Ordem dos Médicos e cabeça de lista da AD pelo Porto, Luís Montenegro foi balançando no ar ao ritmo do “Por-tu-gal! Port-tu-gal”.

“Nunca fomos nós que desarrumámos as contas públicas, porque haveria de ser agora?”

Quando a arruada virou à esquerda na Rua Formosa, a largos metros à frente, o líder do PSD ainda pôde olhar de frente a comitiva de Rui Rocha, da Iniciativa Liberal, com quem acabou por não se cruzar. No fim da artéria, o líder social-democrata assumiu uma postura mais controlada, preferindo cumprimentar à distância quem o queria abraçar ou tirar uma selfie. Aproximava-se o momento do fim da arruada e o início do comício, que se iria realizar numa tenda, ali montada na Avenida Dom.João I, para o qual o presidente do PSD  tinha guardado o desafio de, aproveitando o embalo da arruada, dar alento à batalha pelos indecisos. 

Antes de subir ao palco, a comitiva teve de pedir várias vezes aos militantes que pousassem as suas bandeiras. Isto para que, como se ouvia através de uma coluna, “o próximo primeiro-ministro de Portugal possa aparecer na televisão”.  Antes de discursar, o líder do PSD decidiu repetir um aviso. “Nós não somos o ADN, somos a AD, não queremos que ninguém que queira votar no ADN vote na Aliança Democrática. “Tal como não queremos o contrário”, frisou, referindo-se ao facto de se poder confundir, no boletim de voto, a "sua" AD com o outro partido.   

De seguida, e depois de uma semana em que as sondagens mantiveram a AD à frente do PS, Montenegro, sublinhou que “a onda ainda não rebentou" . " Vai crescer mais”, defendeu, recordando que, quando as percentagens o colocavam-no atrás de Pedro Nuno Santos, sempre acreditou na vitória nestas eleições. “Mesmo quando estávamos mais lá em baixo, eu acreditava, eu sabia que nós íamos saber dizer às pessoas que vale a pena caminhar por um país diferente”. E a melhor forma de chegar às pessoas, salientou, foi ignorando as tricas e os casos políticos.  “Resistimos sempre àquelas coisas que não preocupam os portugueses”, referiu, já numa pré-avaliação dos dias que esteve na estrada.

Invocando Sá Carneiro, pelo “respeito, a ousadia, o risco e a vontade de criação da riqueza ao serviço de cada pessoa”, Montenegro insistiu novamente que apenas governa se ficar em primeiro lugar as eleições. E acrescentou que a sua candidatura quer “arriscar com sentido de responsabilidade”. “Nunca fomos nós que desarrumámos as contas públicas, porque haveria de ser agora?”.

Arruada desaguou num comício, onde Montenegro voltou a garantir que só governa se vencer as eleições/ LUSA


Naquele comício Montenegro fora o último a falar aos presentes. O primeiro a subir ao palco  tinha sido Miguel Guimarães que disparou de imediato: “Domingo à noite, Luís Montenegro é o primeiro-ministro de Portugal, não tenho dúvidas nenhumas”. O social-democrata defendeu ainda  que “quem desperdiça uma maioria absoluta não merece a confiança dos portugueses” e acusou  “António Costa e Pedro Nuno Santos de "abandonarem o Estado Social”. No fim, pediu uma concentração dos votos de protesto na AD. “A todos os portugueses que não estão satisfeitos, venham voto a voto para termos força para conseguir governar Portugal da melhor forma possível”. 

Depois foi a vez de Nuno Melo, líder do CDS-PP,  dar também o sinal de que a vitória está muito perto. “Com a nossa experiência política, já descemos muitas vezes a rua de Santa Catarina, mas nunca como hoje se sentiu tanta vontade de mudança no país”. É “incomparável”, disse, “o que hoje aqui se viu é inequívoco no sinal”. O presidente do CDS-PP, que nas intervenções diárias tem insistido que prefere ser tratado por “apenas mais um soldado no exército de Montenegro”, assumiu o seu papel na linha da frente contra Pedro Nuno Santos e concentrando o seu discurso na aparição do líder do PS no programa de Ricardo Araújo Pereira. “O principal argumento que invoca para ter votos é o da experiência governaria. É precisamente pela experiência governativa que Pedro Nuno Santos não pode ser primeiro-ministro de Portugal”. 

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