O americano que comprou uma casa em Itália e encontrou "muitas surpresas"

CNN , Silvia Marchetti
10 mar, 17:00
Joshua Shapiro comprou um apartamento em Latronico, na região de Basilicata, no sul de Itália. Cortesia de Joshua Shapiro

A maior de todas foi um encontro estranho quando foi pela primeira vez ver o interior da casa que tinha acabado de comprar

Pessoas de todo o mundo estão a comprar encantadoras casas antigas em aldeias isoladas de Itália. Todos motivados por objetivos diferentes, mas com uma coisa em comum: procuram um refúgio, um local para onde possam escapar e viver o idílio rural.

Joshua Shapiro, um saxofonista de Chicago de 48 anos, embarcou na procura pela dolce vita como o primeiro passo para uma mudança de vida. O seu objetivo a longo prazo é afastar-se dos Estados Unidos, que acredita estar a passar por uma ampla mudança política que o preocupa.

Em 2022, comprou um pequeno apartamento abandonado na aldeia de Latronico, no sul da região de Basilicata, por 22.000 euros, depois de ler um artigo da CNN Travel sobre o programa habitacional lançado para atrair imigrantes e travar o despovoamento.

Para já, vai e vem enquanto finaliza a remodelação da sua casa. Mas no futuro, consegue imaginar-se a dar o salto para se mudar definitivamente.

"Estou pronto para o próximo capítulo da minha vida. Ser saxofonista freelancer, principalmente de jazz e música comercial, não está isento de desafios e, à medida que o gosto e a procura pelo que faço diminuem notoriamente [nos EUA], a procura na Europa parece ser muito maior", diz Shapiro à CNN Travel.

Para ele, a compra de uma propriedade em ruínas num local italiano invulgar também tem uma dimensão política.

"Não gosto da situação política nos Estados Unidos - a mudança para a direita. Uma grande parte do eleitorado acredita noutra versão de democracia e a forma como tudo isto se pode desenrolar é um grande problema", argumenta.

Shapiro tocou o seu saxofone na sua primeira viagem a Latronico. MC Newman

Shapiro visitou Latronico numa viagem que fez a Itália depois da pandemia - a terceira vez que viajou para o país e a primeira em 20 anos. Levou consigo o seu saxofone, que tocava numa casa que arrendou enquanto a sua era alvo de obras. Os habitantes da aldeia guardam boas recordações de ouvir, à noite, as melodias de jazz nas sinuosas ruelas.

O que o atraiu a Itália foi uma "ligação ténue" que queria reavivar - o seu avô tinha estado destacado em Florença durante a Segunda Guerra Mundial.

Latronico está longe de ser Florença, no entanto, fica a cinco horas de carro de Roma e a três do aeroporto internacional mais próximo, Bari. Shapiro admite que a localização remota "pesou muito" quando viajou para este recanto imaculado da Basilicata. Nunca esperou que fosse num lugar tão afastado, sem qualquer ligação direta de comboio. 

"O meu objetivo era olhar à volta, ver o que era acessível e o que estava disponível em termos de propriedades. Com a ajuda do vice-presidente da câmara, Vincenzo Castellano, que gere o programa de habitação, escolhi a opção mais fácil para mim", conta.

Reviravoltas e surpresas

O seu apartamento fica no segundo andar, com entrada independente. Cortesia de Joshua Shapiro

O seu apartamento no segundo andar, com escada exterior e entrada independente, tem cerca de 75 metros quadrados, dois quartos e uma varanda panorâmica. Precisava de uma remodelação profunda, na qual Shapiro gastou até agora cerca de 10.000 euros.

Apesar do entusiasmo de comprar uma casa barata, a aventura em que embarcou teve uma série de reviravoltas inesperadas.

Teve de colocar novas janelas, novos azulejos e remendar as fissuras nas paredes. A casa também teve de ser mobilada - Shapiro diz que, inicialmente, teve "problemas" para perceber que mobiliário estava incluído na venda da casa.

Shapiro recorda os primeiros "choques culturais por causa dos móveis estranhos" que encontrou no interior.

Esperava que a casa viesse com a mobília que estava nas fotografias do anúncio, para ter uma preocupação a menos no início. Mas diz que "houve uma falha de comunicação ou um mal-entendido sobre esta questão" com os proprietários.

Nos Estados Unidos, diz, o contrato de compra e venda teria estipulado o mobiliário incluído no apartamento, mas em Latronico isso nunca foi muito claro.

Nunca ficou claro quais os móveis que ficariam no apartamento. Cortesia Joshua Shapiro

No entanto, deixaram-lhe alguma mobília, mas estava "gasta ou não era realmente utilizável", pelo que acabou por ter de se desfazer da maior parte.

"Não estava à espera de algumas coisas que encontrei, como a cama que estava tão velha e degradada. Na altura, isto tornou-se uma questão controversa, mas resolvemos a situação de forma muito amigável, e aprendi lições valiosas pelo caminho", assume.

Muitas das casas vazias disponíveis no site local onde os proprietários encontram os compradores são vendidas ou arrendadas com mobília, mas o que acaba por ficar lá dentro é normalmente negociado entre as partes.

Depois de a ter visto brevemente antes de a comprar, Shapiro esperava que a casa estivesse em melhor estado.

"Precisava de um telhado novo, e isso foi uma grande surpresa. A cozinha estava totalmente exposta a céu aberto, tive de acrescentar uma caleira e havia algum lixo dentro da casa que teve de ser deitado fora."

Latronico situa-se numa região remota e intocada de Itália. Gianniblues/Alamy Stock Photo

Shapiro também pintou e reparou algumas paredes - e ainda havia mais trabalho a fazer para a tornar completamente habitável.

"Houve uma série de surpresas e coisas que não esperava, como ter de remodelar a casa de banho, colocar um novo esquentador e resolver um problema de humidade no interior de um quarto. Fiquei um pouco surpreendido com as obras que tinham de ser feitas, principalmente devido às suposições que fiz sobre o estado da casa pelo simples facto de ter estado habitada antes de a comprar. Descobri mais tarde que os antigos ocupantes toleravam muitas das deficiências da casa."

Um hábito difícil

Shapiro teve a ajuda do vice-presidente da câmara local, Vincenzo Castellano. Cortesia de Joshua Shapiro

Também houve um encontro estranho quando foi pela primeira vez ver o interior da casa que tinha acabado de comprar.

Acompanhado por Castellano, o vice-presidente da Câmara, Shapiro diz que ficou surpreendido ao descobrir que a casa tinha inquilinos - um grupo de freiras idosas.

"Três freiras viviam ali há algum tempo, eram inquilinas dos antigos proprietários. Quando cheguei, não me deixaram entrar, chocadas com a ideia de que um americano pudesse andar pela casa delas."

Felizmente, tudo se resolveu. As freiras, tranquilizadas por Castellano de que não ficariam sem casa, acabaram por sair. A Câmara Municipal deu-lhes um alojamento alternativo.

Apesar dos obstáculos iniciais, Shapiro diz que se apaixonou imediatamente pelo estilo de vida descontraído e mais lento de Latronico - o oposto do que estava habituado nos Estados Unidos.

"A aldeia é pequena, situada numa zona montanhosa remota. Eu vivo numa grande cidade com milhões de pessoas. Latronico é um sítio onde me imagino a ser muito criativo, a tocar e a escrever música", descreve.

Diz que toda a gente "se esforçou por ser simpática" e foi acolhedora, exceto "alguns olhares de lado para o estranho entre nós" - embora pense que isso se deveu principalmente à barreira linguística. Não saber italiano não tem sido fácil para ele, reconhece.

Shapiro, tal como todos os outros compradores estrangeiros em Latronico, está isento de pagar impostos sobre a propriedade e eliminação de resíduos durante cinco anos, uma medida recentemente introduzida pela Câmara Municipal para atrair novos compradores estrangeiros.

E apesar dos custos imprevistos, está encantado por ter tido a oportunidade de comprar uma casa por um preço que considera uma pechincha. Em Chicago, diz, um apartamento custa pelo menos 200.000 dólares [185 mil euros] - mais impostos sobre a propriedade.

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