«Special One» abriu o livro, abordando o futuro e recuperando memórias do Man. United, da Roma e do FC Porto, onde, há 20 anos, conseguiu o trampolim para a Premier League
Sem clube desde janeiro, José Mourinho abriu o livro numa entrevista ao Telegraph, divulgada esta segunda-feira. Dos planos para a carreira – que, garante, está longe de terminar – às memórias em Manchester, o treinador argumentou sobre como serviu de motor para o desenvolvimento do futebol nos últimos 20 anos.
Aos 61 anos, o «Special One» sublinha que as vontades, de parte a parte, definirão o próximo capítulo.
«O que pode fazer a diferença é o quanto o clube me quer, o quanto precisa de um treinador com este perfil. E, também, o sentimento que poderei sentir. Quero que as metas e os objetivos sejam estabelecidos de forma justa. Não posso ir para um clube onde, pela minha história, se ambicione ganhar o campeonato. Não tenho medo de clubes que não estão talhados para vencer. Mas, o meu trabalho é tentar elevar os clubes a esse nível», começa por dizer.
Até porque, reitera, é «só» mais um treinador: «As pessoas devem olhar para mim da mesma forma que olham para os outros. O importante é que eu me sinta preparado para lutar pelos objetivos do clube. Dêem-me uma estrutura profissional, onde eu seja apenas o treinador principal».
E a passagem pela Roma dá força a esta perspetiva. Nas três épocas nos «Giallorossi», o treinador português conquistou a Liga Conferência e atingiu a final da Liga Europa algo nunca sonhado pela estrutura, sublinha.
As memórias em Old Trafford, de 2004 aos indesejados em 2018
Orgulhoso por desafiar as probabilidades, Mourinho elege o «bizarro» festejo em Old Trafford, em 2004, pelo FC Porto, como um dos mais icónicos.
«Foi a comemoração que mudou o rumo da minha carreira. Depois da Taça UEFA tive alguns clubes estrangeiros interessados, mas não eram “grandes” ou da Premier League. Tive a sensação que poderia sair de Portugal quando quisesse, mas não para um dos “grandes”. Depois do festejo em Manchester, a situação mudou. Em simultâneo, Rafa Benítez venceu a La Liga com o Valência [duas vezes] e a Taça UEFA. Ganhei a Liga portuguesa [duas vezes], a Taça UEFA e a Liga dos Campeões. Ou seja, para vir para Inglaterra não bastava fazer algo bom no campeonato», recorda.
Já que a conversa o guia para a fortaleza dos «Red Devils», José Mourinho aproveita para lamentar a falta de paciência que sentiu enquanto timoneiro do Man. United, ao contrário do que acontece com Erik ten Hag.
«Não tive essa confiança e saí triste, porque estava no início de um processo. Se confiassem em mim e acreditassem na minha experiência, o desfecho poderia ter sido diferente. A minha relação com Ed Woodward [então presidente executivo] era boa», conta.
E quanto ao diferendo com Paul Pogba? Um caso de mudança de foco.
«Acontece com quase todos em alguns momentos da vida e da carreira. O foco muda. Depois de França conquistar o Mundial [em 2018], o Paul voltou diferente. Essa conquista fez com o que o futebol já não fosse o mais importante para ele», narra, lamentando o momento que o médio, vinculado à Juventus, atravessa.
Confesso apoiante do Manchester United, José Mourinho não desperdiçou a oportunidade de deixar uma alfinetada: «Ainda há jogadores naquele plantel que eu não queria há cinco ou seis anos. Não é o melhor para um clube daquela dimensão. Mas, o tempo acabará por ditar a verdade», remata.
Elogios para Guardiola e Arteta
Na vertente tática e técnica desta entrevista, José Mourinho elogiou a opção de os treinadores de Manchester City e Arsenal apostarem em defesas centrais para ocuparem outras áreas do campo, como as laterais ou o meio-campo.
«Quantos defesas centrais têm na equipa? Às vezes têm seis, mas jogam em diferentes posições. Há necessidade de encontrar estabilidade defensiva, e de ser compacto. Devemos pensar nos anos em que o Man. City não conquistou a Liga dos Campeões e a diferença na equipa que o conseguiu», anota.
Quanto aos guarda-redes, Mourinho continua a preferir uma unidade capaz de bombear as jogadas: «Ganhei uma final da Liga Europa com bolas longas, do Sergio Romero para o Fellaini. O Ajax pressionava, mas nunca perto da bola».
Portugal entre candidatos ao Europeu
Questionado sobre as equipas portuguesas na Liga dos Campeões, o «Special One» recorda uma simples conversa de rua: «Há dias, cruzei-me uma pessoa que me interpelou: “Quando voltamos a conseguir isto em Portugal?”. Vamos ver se conseguimos nos próximos 20 anos».
Em todo o caso, Mourinho guarda outras expectativas para o Europeu deste verão, garantido que Portugal poderá voltar a conquistar a prova, à boleia de uma «seleção incrível», a melhor versão das «Quinas».
E quanto ao cargo de sonho, o treinador esclarece que já o ocupou.
«Sou “treinador principal”, aquele que trabalha com a equipa, que se foca no desenvolvimento dos jogadores e na preparação dos jogos. Já tive situações em que fui mais do que isso. Por exemplo, após a derrota da Roma na final da Liga Europa, odiei ser a cara do clube na conferência de imprensa», reitera.