Rússia reforça presença militar no arquipélago reivindicado pelo Japão

7 dez 2022, 04:46
Vladimir Putin no passado mês de setembro, na Cimeira da Organização de Cooperação de Xangai no Uzbequistão (Foto: Getty Images)

Moscovo instalou sistema de mísseis em Paramushir, uma das ilhas Curilhas, cuja soberania é reivindicada pelo Japão

O Ministério da Defesa russo comunicou a instalação de sistemas móveis de mísseis de defesa costeira numa ilha do norte das Curilas, um conjunto de ilhas e ilhéus que se estende entre o norte do Japão e a península russa de Kamchatka. Uma parte das Ilhas Curilas é reivindicada pelo Japão desde a II Guerra Mundial, quando todo esse território foi tomado pelas tropas da então União Soviética. No Japão, estas ilhas são conhecidas como Territórios do Norte.

A disputa sobre a soberania das Curilas arrasta-se há décadas, e esteve perto de ser resolvida em conversações bilaterais lançadas por Shinzo Abe, antigo primeiro-ministro japonês assassinado em julho, e por Vladimir Putin. Contudo, a condenação do Japão à invasão russa da Ucrânia - acompanhada de sanções contra Moscovo - levou Putin a suspender as conversações para um tratado de paz que pusesse um fim à querela fronteiriça.

Com as relações nipo-russas no seu ponto mais baixo desde o fim de II Guerra Mundial, Putin tem reforçado a presença russa nos territórios reivindicados por Pequim. O Ministério da Defesa russo informou que sistemas de mísseis Bastion foram implantados em Paramushir, uma das ilhas Curilas mais próximas de território continental russo. "A guarda costeira da Frota do Pacífico manterá uma vigilância permanente para controlar a área de água adjacente e as zonas estreitas", afirmou o Ministério da Defesa russo.

Para além dos sistemas Bastion, que têm mísseis com um alcance de voo até 500 km, o ministério adiantou que foi criado um acampamento militar na mesma ilha, com instalações que permitem o serviço, alojamento, recreação e comida para o pessoal durante todo o ano.

Segundo a agência Reuters, este destacamento surge um ano após a Rússia ter instalado sistemas Bastion na ilha de Matua, situada no centro do arquipélago das Curilas, a meio caminho entre a ilha de Hokkaido, no norte do Japão, e a Península de Kamchatka, na Rússia.

Japão teme eixo Moscovo-Pequim

O governo japonês reagiu ontem ao anúncio do regime de Putin prometendo uma monitorização mais detalhada das atividades militares russas na região. Hirokazu Matsuno, ministro que costuma ser o porta-voz do governo de Tóquio, disse em conferência de imprensa na terça-feira que a Rússia está a intensificar a sua atividade militar nas regiões do Extremo Oriente, coincidindo com a invasão da Ucrânia.

Este reforço da presença militar russa no extremo oriental do país coincide com atividades conjuntas entre forças de Moscovo e de Pequim, que têm aumentado as preocupações de segurança de países como o Japão e a Coreia do Sul, países aliados dos Estados Unidos que têm denunciado tanto a invasão da Ucrânia como o crescendo do militarismo chinês na região.

Ainda na semana passada, aviões de guerra chineses e russos entraram repetidamente na zona de defesa aérea da Coreia do Sul, levando à mobilização de vários caças sul-coreanos. As manobras envolveram dois bombardeiros chineses H-6 e seis aeronaves russas, incluindo bombardeiros TU-95 e caças SU-35. A Força Aérea de Autodefesa do Japão também mobilizou caças depois de bombardeiros chineses terem voado do Mar da China Oriental para o Mar do Japão, onde se juntaram a dois drones russos, conforme informou o Ministério da Defesa japonês.

Em setembro, nos maiores exercícios militares do ano por parte da Rússia, tropas russas e chinesas fizeram manobras conjuntas de fogo real nas Curilas, o que provocou um protesto formal do governo japonês.

O eventual surgimento de um eixo militar Moscovo-Pequim tem sido apontado pelas autoridades japonesas como um dos maiores riscos decorrentes do atual conflito no Leste da Europa, provocado pela invasão russa da Ucrânia. Esse risco está identificado no Livro Branco de Defesa do Japão, publicado este ano. Significaria, na prática, um nível acrescido de ameaça, para além da beligerância da Rússia e da cada vez maior assertividade militar da China em relação aos seus vizinhos.

Putin aproveitou Ucrânia para reforçar presença

Segundo o Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais, sediado em Washington, a invasão da Ucrânia permitiu á Rússia reforçar a militarização das Ilhas Curilas, aproveitando que todas as atenções internacionais estavam focadas na sua frente ocidental. O reforço militar de Moscovo nas Curilas "voou em grande parte debaixo do radar", escreveu o think tank, num relatório publicado em setembro.

"Os passos dados pela Rússia para reforçar a sua presença sugerem que as ilhas continuarão a desempenhar um papel pernicioso no futuro das relações russo-japonesas, e que o Japão e os Estados Unidos deveriam aprofundar as consultas sobre as actividades da Rússia na região", alertou o CEEI.

Para além do reforço da capacidade militar russa no terreno, no início da invasão da Ucrânia Vladimir Putin lançou um pacote de incentivos fiscais para empresas que invistam nas Ilhas Curilas ou transfiram negócios para este território, como forma de reafirmar a soberania russa. Por outro lado, os cidadãos japoneses com ligação às ilhas, que antes podiam visitá-las sem necessidade de visto, viram essa possibilidade revogada, ficando completamente afastados do território onde têm raízes e, em muitos casos, ainda vivem os seus familiares.

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