Distribuição dos lucros pelos colaboradores até cinco salários mínimos ou 4.100 euros está sujeito a englobamento e, por isso, poderá fazer subir a taxa a aplicar no momento da liquidação, em 2025
O pagamento, este ano, de um salário extra aos trabalhadores até cinco ordenados mínimos ou 4.100 euros, sob a forma de distribuição de lucros, está isento de IRS e contribuições sociais, mas o valor terá de ser obrigatoriamente englobado, isto é, terá de ser somado aos outros rendimentos, o que irá agravar a taxa do imposto a aplicar, no momento da liquidação, em 2025.
A norma está prevista no artigo 236.º da Lei do Orçamento do Estado (OE) para 2024, mas passou pelos pingos da chuva durante a discussão das alterações ao plano orçamental. “Os rendimentos isentos […] são englobados para efeitos de determinação da taxa aplicável aos restantes rendimentos”, segundo o diploma da Assembleia da República.
Esta espécie de prémio salarial isento de IRS foi proposto pelo PS, mas, no documento apresentado durante o debate orçamental, não havia menção alguma ao englobamento obrigatório. A Autoridade Tributária (AT) decidiu agora destacar esse ponto num ofício circulado, divulgado esta quinta-feira, com esclarecimentos sobre o preenchimento da declaração mensal de remunerações (DMR) que deve ser entregue pela entidade empregadora até ao dia 10 do mês seguinte àquele em que foram pagos os rendimentos em causa.
Os montantes atribuídos aos trabalhadores a título de participação nos lucros da empresa, por via da gratificação de balanço, só estão isentos se houver uma “valorização nominal das remunerações fixas do universo dos trabalhadores em 2024 que seja igual ou superior a 5%” acima do patamar do salário mínimo, de 820 euros, e se o prémio em questão não ultrapassar cinco ordenados mínimos ou 4.100 euros, lembra a AT na nota assinada pela subdiretora-geral Helena Pegado Martins.
Na mesma instrução, o Fisco lembra que “esta disposição é transitória” e que apenas se aplica ao ano de 2024, com efeitos na declaração de IRS de 2025. Na declaração mensal de remunerações (DMR), a entidade empregadora deve indicar os valores distribuídos pelos trabalhadores no código A82, indica a AT.
“O englobamento deste valor isento a outros rendimentos do trabalhador poderá efetivamente agravar o imposto a pagar, porque conta para o apuramento da taxa”, explica ao ECO o fiscalista Luís Nascimento.
E dá um exemplo: “Um colaborador tem um rendimento anual de trabalho de 12 mil euros e recebe uma gratificação de 4.000 euros. O valor total para apuramento da taxa vai subir para 16 mil euros, ou seja, a porção de rendimento sujeita a imposto será sujeita a uma taxa mais alta”.
Curiosamente, o programa eleitoral do Livre para as legislativas de 10 março defende a eliminação deste englobamento, para não penalizar os trabalhadores e a atribuição de um incentivo fiscal em sede IRC às empresas.
“Estes rendimentos não estão sujeitos a englobamento para determinação da taxa aplicável aos restantes rendimentos”, lê-se no programa eleitoral do partido de Rui Tavares. Para além disso, defende que a empresa deve ter direito a uma majoração da dedução em sede de IRC relativa às gratificações de balanço.
De salientar que a tributação sobre o rendimento coletável anual, já depois da dedução específica, de 4.104 euros, ou do abate do valor das contribuições sociais se este valor for maior, é feita por parcelas, ou seja, escalões. Montantes até 7.703 euros pagam uma taxa de 13,5%, valores acima e até 11.623 euros estão sujeitos a um imposto de 18% e assim sucessivamente.
O fiscalista alerta que, apesar deste salário extra estar livre de descontos para a Segurança Social, “o Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social determina que a distribuição de lucros pelos trabalhadores deve pagar contribuições sociais”. “Contudo, esta norma nunca foi aplicada, porque nunca foi regulamentada”, acrescenta.
Necessidade de aumentar todos os salários, em média 5%
Em relação à necessidade de aumentar em 5% o universo dos trabalhadores, acima do salário mínimo, para poder beneficiar da isenção fiscal na distribuição dos lucros pelos colaboradores, muitas dúvidas ficaram depois de o PS ter corrigido a sua proposta de alteração ao Orçamento do Estado para 2024. O texto de substituição, em vez de exigir apenas um aumento médio dos salários de pelo menos 5%, como estava na iniciativa inicial, passou a determinar que o aumento salarial deve ser aplicado ao “universo dos trabalhadores”.
Com esta redação, o PS abriu a porta a futuras clarificações em sede de concertação social sobre o conceito de “universo de trabalhadores” caso a Autoridade Tributária suscite dúvidas na aplicação do conceito, isto é, se os aumentos têm de ser de pelo menos 5% para todos ou é a média do crescimento salarial que conta.
No entanto, para Luís Nascimento, da consultora Ilya, “não há dúvidas de que a norma quer dizer que todos os trabalhadores têm de ser aumentados e que a média do incremento salarial terá de ser igual ou superior a 5%.
Empresas têm de declarar pagamentos em rendas de habitação e criptoativos
O pagamento de rendas de habitação própria e permanente dos trabalhadores, efetuado pela entidade empregadora, também está isento de IRS e contribuições sociais. E, ao contrário da distribuição de lucros, não está sujeito a englobamento, pelo que este tipo de rendimento não terá impacto na taxa do imposto a aplicar no momento da liquidação, em 2025.
“Os rendimentos de trabalho em espécie que resultem da utilização de casa de habitação permanente localizada em território nacional, fornecida pela entidade patronal, referentes ao período compreendido entre 1 de janeiro de 2024 e 31 de dezembro de 2026, estão isentos de IRS e de contribuições sociais” e não têm de ser englobados, de acordo com o artigo 234.º da Lei do Orçamento do Estado para 2024.
Mas este benefício só é atribuído se as rendas não excederem o limite previsto no programa de apoio ao arrendamento acessível.
No ofício circulado da AT, é indicado que as empresas devem colocar o valor destes rendimentos no novo código A40 da declaração mensal de remunerações.
A partir deste ano, também os rendimentos do trabalho dependente pagos em criptoativos terão de ser declarados mensalmente pelos patrões ao Fisco a partir da DMR. Para isso, foi criado o código A69 na respetivo formulário.