Fugir dos russos implica deixar maridos, filhos e irmãos para trás

CNN , Tamara Qiblawi, Mohammed Tawfeeq e Sofiya Harbuziuk
26 fev 2022, 16:04
Ucranianos em fuga. Foto: Mark Philips

Na estação ferroviária de Lviv, na zona mais ocidental da Ucrânia, perto da fronteira polaca, centenas de pessoas saem dos comboios, desembarcando ao ressoar das sirenes.

O terminal, uma das estruturas Art Noveau mais históricas da Europa, é agora um ponto de passagem para os deslocados da guerra, que tentam afastar-se ao máximo da invasora Rússia e aproximar-se da linha da frente da NATO.

Para muitos, era impensável que o centro cultural histórico pudesse ser um alvo para Moscovo, incluindo diplomatas e organizações internacionais que fugiram da capital da Ucrânia, Kiev, para Lviv nas últimas semanas.

Mas quando as sirenes soaram, fizeram lembrar que lugar algum na Ucrânia está a salvo do ataque de Moscovo ao país.

As pessoas estavam com um olhar distante. A maioria deslocava-se apaticamente no exterior da estação, mesmo estando as sirenes a soar.

Foto: Mark Philips

Uma família colocou cobertores sobre o bebé que estava num carrinho. Duas mulheres vestiam um bulldog francês, a tremer de frio, com uma camisola de malha cor-de-rosa. Várias famílias estavam sentadas juntas, barricadas por malas grandes e sacos de plástico. Disseram que não dormiam há dias devido aos bombardeamentos que assolaram as regiões que eles abandonaram.

Eles viajaram até Lviv, vindo de cidades e vilas de todo o país. Encheram mochilas rapidamente e levaram alguns pertences antes de fugirem das suas casas.

Ainda abalados com a violência, muitos dizem que não sabem para onde ir. É uma questão complicada devido à nova lei marcial imposta pela Ucrânia. Entre outras restrições, os homens entre os 18 e os 60 estão proibidos de sair do país.

As famílias que ponderam atravessar a fronteira da Ucrânia não têm de lidar apenas com o trauma de se tornarem refugiados, como também com a possibilidade de se separarem dos filhos, irmãos, maridos e companheiros.

Artem Zonenko acabou de chegar a Lviv, vindo de Kiev, com a sogra e a filha pequena. Dormiram a noite passada no chão de uma estação de metro, para se abrigarem dos bombardeamentos e explosões à capital ucraniana. A mulher já se encontrava em Lviv há alguns dias. A família pretende passar um dia juntos antes de decidirem se a avó, mãe e filha continuam o caminho até à Polónia, deixando Zonenko para trás.

Questionado sobre o que sentia quanto a isso, ele sorriu com um certo desespero. “Nem sei o que lhe dizer. As coisas são como são”, disse ele, encaminhando a família para um táxi.

O ACNUR, o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados, disse que pelo menos 100 mil pessoas abandonaram as suas casas nas primeiras 24 horas do ataque militar na quinta-feira. Os meios de comunicação estatais e uma testemunha ocular disseram que mais de sete mil carros faziam fila em cruzamentos junto à fronteira polaca, havendo já uma fila de mais de 30 quilómetros.

Andrei, 45 anos, olhou para longe enquanto fumava o cigarro. Acabou de chegar de Odessa, no sudeste, e estava a engendrar um plano para se encontrar com a sua mulher bielorrussa na Polónia.

“Ela está grávida. Tenho de ir ter com ela”, disse ele, recusando dar o nome completo por razões de segurança. “Esta lei não faz sentido.”

Foto: Mark Philips

O Governo anunciou a ordem de mobilização geral - que incluía a proibição de viajar para os homens – quando ele estava no comboio. Ele disse que é uma situação que pode mudar o futuro da família. “E quando saímos do comboio, as sirenes começaram a soar”, disse ele. “Fiquei chocado, porque nem sequer nos disseram onde nos poderíamos abrigar. Fiquei chocado porque este local deveria ser seguro.”

"E agora disseram-nos que nem podemos sair do país, mas os migrantes podem”, e apontou para um grupo de estrangeiros que estava ali ao lado. “Pergunto-lhe. Isto é justo?”

Para os migrantes que chegam a Lviv, o seu destino é certo: a Polónia ou qualquer estado vizinho que os receba.

“Não sei onde me hei de abrigar, porque nenhum lugar é seguro”, disse Mehmet, um residente turco na Ucrânia, que arrastava duas malas grandes pelo chão enquanto as sirenes soavam. “Vamos sair do país.”

Foto: Mark Philips

Um grupo de estudantes argelinos, que vieram de Odessa, discutia freneticamente os seus planos. “Vamos para a Polónia”, disse Takieddine, que não quis dar o nome completo por razões de segurança. “Não ficaremos de forma alguma na Ucrânia.”

“Nunca pensámos que isto fosse acontecer na Europa. Nunca. Nunca na vida.”

Ihor Nakonechyi, 52 anos, está na cidade fronteiriça de Mostyska a tratar de tudo para enviar a ex-mulher e a filha para a Polónia. Ele pretende deixá-las no cruzamento mais próximo e voltar para trás, não só por causa da lei que o proíbe de deixar o país, disse ele, como pelo facto de estar ansioso por pegar numa arma e se juntar ao combate contra as forças russas.

“É difícil, mas a lei não me afeta. Na verdade, acho que é a coisa certa a fazer.”

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