Contenção ou retaliação? Eis o dilema que Israel enfrenta após o ataque do Irão

CNN , Nadeen Ebrahim e Jeremy Diamond
16 abr, 08:00
Esta fotografia mostra o gabinete de guerra israelita, presidido pelo primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, numa reunião em Telavive, Israel, no domingo. Algumas partes da fotografia foram esbatidas pela fonte (Ariel Hermoni/Ministério da Defesa de Israel)

Israel ainda não chegou a acordo sobre a forma de responder ao ataque iraniano do fim de semana, em que foram disparados mais de 300 projéteis contra o seu território, no primeiro confronto militar direto entre a República Islâmica e o Estado judaico.

Israel tem de equilibrar a pressão internacional para mostrar contenção, por um lado, e, por outro, procurar uma resposta adequada a um ataque sem precedentes. O primeiro-ministro Benjamin Netanyahu tem agora de ponderar o apelo da sua coligação de direita para uma reação forte contra o risco de um maior isolamento internacional de Israel, alargando a guerra sem apoio internacional.

O gabinete de guerra de Israel manteve-se determinado, na segunda-feira, a responder ao ataque do Irão, que diz ter sido uma retaliação a um suposto ataque israelita a um edifício diplomático iraniano em Damasco, a 1 de abril. Apesar da pressão dos aliados para que não haja uma escalada, o gabinete está agora a debater o momento e o âmbito da resposta, disseram à CNN dois funcionários israelitas familiarizados com as deliberações.

Os analistas afirmam que Israel tem poucas opções e que cada uma delas tem um preço, especialmente porque já está envolvido numa guerra brutal de seis meses com o Hamas na Faixa de Gaza e enfrenta vários militantes apoiados pelo Irão na região.

Um ataque direto ao Irão criaria mais um precedente. Embora se acredite que Israel tenha conduzido operações secretas no Irão ao longo dos anos, muitas vezes visando indivíduos ou instalações consideradas uma ameaça à sua segurança, nunca lançou um ataque militar direto em território iraniano.

"Estamos definitivamente numa nova fase, e numa fase muito perigosa, do confronto israelo-iraniano", refere Raz Zimmt, um especialista em Irão do Instituto de Estudos de Segurança Nacional (INSS) em Telavive. "O Irão tentou certamente mudar as regras do jogo com Israel... podemos esperar mais rondas de ataques diretos no futuro."

Embora Israel possa ter dificuldade em não retaliar, não poderá conduzir imediatamente um "ataque militar em grande escala contra alvos dentro do Irão", uma vez que Teerão prometeu retaliar com uma resposta ainda maior do que o ataque lançado no fim de semana.

"A preferência em Israel tem sido continuar e concentrar-se em alcançar os nossos principais objetivos em Gaza, e não abrir novas frentes", acrescenta Zimmt à CNN.

Alon Pinkas, um antigo diplomata israelita, afirma que é improvável que Israel retalie atacando diretamente o Irão. Mas se o fizer, diz, as consequências dependerão dos alvos. Os alvos podem incluir bens militares ou o programa nuclear da República Islâmica. "Cada um deles representa um nível diferente de escalada".

Um funcionário israelita disse à CNN na segunda-feira que entre as opções militares que estão a ser consideradas está um ataque a uma instalação iraniana que enviaria uma mensagem a Teerão, mas evitaria causar vítimas. As autoridades israelitas reconhecem que essa será uma agulha difícil de enfiar, acrescentou o funcionário.

Limitada pelos aliados

A resposta de Israel pode, no entanto, ser condicionada pelo facto de ter agido como parte de uma coligação informal ao defender-se do ataque de mísseis e drones do Irão, diz Tamir Hayman, antigo chefe dos serviços secretos militares de Israel.

Os ataques foram impedidos com a ajuda de aliados como os EUA, o Reino Unido e a França, bem como a Jordânia.

"Isto é eficaz e importante, mas limitará a liberdade de ação em resposta", prossegue Hayman, que agora dirige o Instituto de Estudos de Segurança Nacional (INSS) em Telavive, no domingo. Os aliados ocidentais e árabes de Israel têm vindo a desencorajá-lo de responder ao ataque do Irão.

O presidente dos EUA, Joe Biden, e os membros superiores da sua equipa de segurança nacional disseram aos seus homólogos israelitas que os EUA não participarão em qualquer ação ofensiva contra o Irão, de acordo com funcionários norte-americanos familiarizados com o assunto. Biden procurou enquadrar a interceção bem-sucedida da ofensiva iraniana por Israel como uma grande vitória, sugerindo que a resposta israelita seria desnecessária.

O presidente dos EUA, Joe Biden, reúne-se com membros da equipa de Segurança Nacional sobre os ataques a Israel, no sábado, na Sala de Crise da Casa Branca (Adam Schultz/Casa Branca)

Considerações de política interna

É provável que Israel também tenha em conta considerações de política interna. O primeiro-ministro Benjamin Netanyahu lidera a coligação mais à direita da história do país, e para evitar o colapso do governo seria necessário apaziguar a linha dura.

Netanyahu tem sido alvo de críticas intensas no seu país por não ter conseguido impedir o ataque de 7 de outubro a Israel, liderado pelo Hamas, e pela sua incapacidade de garantir a libertação dos mais de 100 reféns que permanecem em Gaza.

Pinkas espera que qualquer decisão de retaliação por parte de Israel seja fortemente influenciada pela coligação de extrema-direita de Netanyahu e pelas necessidades de sobrevivência política do próprio primeiro-ministro.

"Para Netanyahu, tudo se resume à política e à sua própria sobrevivência, à manutenção da sua coligação e ao seu desejo de alargar a guerra para se distanciar do 7 de outubro e do ataque do Hamas", diz Pinkas.

"Por isso, na sua mente, um conflito regional ou um conflito direto com o Irão é consistente com a narrativa fabricada, de que este (7 de outubro) não é apenas um ataque terrorista mas parte de um confronto e de uma campanha muito maiores", acrescenta o especialista.

Em Israel, vinca Pinkas, o público não quer abrir outra frente, com as tropas ainda a combater em Gaza.

"As pessoas ainda estão devastadas e chocadas com o que aconteceu em outubro, por isso não creio que haja um desejo público de escalar e abrir um conflito totalmente direto com o Irão", reitera.

Equipas de salvamento procuram nos escombros de um edifício anexo à embaixada iraniana, um dia depois de um ataque aéreo israelita em Damasco, na Síria, a 2 de abril (Louai Beshara/AFP/Getty Images)

Crédito internacional

Antes dos ataques do fim de semana, Israel estava cada vez mais isolado na cena mundial devido à sua conduta na guerra de Gaza, onde mais de 33 mil palestinianos foram mortos. No entanto, desde o ataque do Irão, os seus aliados uniram-se em torno do Estado e do seu direito de se proteger.

Alguns políticos israelitas apelaram a que o Estado aproveitasse o apoio obtido após o ataque para ripostar.

Outros apelaram a Israel para que utilizasse o "crédito internacional" para atacar Teerão ou invadir a cidade de Rafah, em Gaza, onde mais de um milhão de palestinianos estão abrigados naquele que Israel diz ser o último reduto do Hamas. A operação planeada para a cidade foi adiada devido a um consenso global contra a mesma.

"Precisamos de reagir - e há duas boas opções: Ou aproveitamos o ataque de ontem para atacar o Irão, ou chegamos a um acordo com os Estados Unidos para entrar em Rafah e eliminar o Hamas", disse Yaakov Amidror, antigo conselheiro de segurança nacional de Netanyahu, ao Jerusalem Post, na segunda-feira.

O governo de Israel está consciente do apoio internacional e da boa vontade dos seus aliados e não quer desperdiçá-los. Ao mesmo tempo, reconhece que não pode permitir que o primeiro ataque do Irão em solo israelita fique sem resposta.

Benny Gantz, um dos principais membros do Gabinete de Guerra, tem insistido numa resposta mais rápida ao ataque do Irão, disseram dois funcionários israelitas à CNN. O responsável acredita que quanto mais Israel adiar a sua resposta ao ataque iraniano, mais difícil será obter apoio internacional.

Outros discordam, afirmando que uma ação de retaliação por parte de Israel que faça escalar as tensões só iria isolar ainda mais o Estado judaico, especialmente dos Estados árabes do Golfo, com os quais Israel procura normalizar os laços.

Arriscar os laços árabes

Os Estados árabes, incluindo os que são amigos de Israel, manifestaram a sua preocupação com uma potencial escalada do ataque iraniano, mas não o condenaram abertamente. Israel afirmou que a maioria dos drones disparados pelo Irão foram interceptados fora do seu espaço aéreo. A Jordânia abateu alguns desses drones e foi criticada no mundo árabe por essa ação. A Jordânia argumentou que o fez para proteger os seus cidadãos e em resposta a violações do seu espaço aéreo.

No entanto, apesar do seu papel na proteção de Israel, a Jordânia não se coibiu de criticar o governo de Netanyahu. Numa entrevista a Becky Anderson, da CNN, o Ministro dos Negócios Estrangeiros da Jordânia, Ayman Safadi, pareceu apoiar a posição do Irão de que o ataque foi uma retaliação ao bombardeamento por Israel do edifício diplomático iraniano em Damasco.

"Agora, penso que Israel está sob pressão para não escalar e trabalhar para o objetivo que todos partilhamos, que é desescalar o conflito", disse Safadi na segunda-feira, avisando que Netanyahu procura uma escalada para desviar o foco da guerra em Gaza.

Israel tem também a missão de restabelecer as relações com os Estados árabes, alguns dos quais se situam do outro lado do Golfo Pérsico, em frente ao Irão, albergam bases militares norte-americanas e foram alvo de ataques de grupos aliados do Irão no passado. Estes países têm mantido um delicado equilíbrio entre os laços com Teerão e com Israel e receiam o impacto de uma guerra iraniano-israelita na sua própria estabilidade e nas suas exportações de petróleo.

"A última coisa que eles (os Estados do Golfo) querem neste momento é uma conflagração que faça subir os preços do petróleo, que bloqueie o Estreito de Ormuz", comclui Pinkas à CNN, referindo-se ao ponto de trânsito de petróleo mais importante do mundo. As relações com esses países podem ser afetadas se Israel for visto como responsável por essa escalada, termina.

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