Quem são e qual o papel das 13 figuras determinantes para o conflito entre Israel e a Palestina

28 out 2023, 09:00
Israel retalia ataques do Hamas (AP Photo)

O passado dia 7 ficou marcado por um atentado terrorista sem precedentes do Hamas contra civis e militares no Sul de Israel. Esta ação de comandos do movimento islamita, que controla a Faixa de Gaza desde 2007, insere-se no conflito mais vasto entre o Estado hebreu e os palestinianos e países árabes e muçulmanos. São, por isso, vários os intervenientes, ou atores, do mesmo. Uns fazem-no de forma direta – no caso atual, entre Israel e o Hamas e também a Jihad Islâmica Palestiniana -, outros fazem-no de forma indireta, procurando agudizar o conflito e levá-lo até outras fronteiras e ainda outros tentam contê-lo e apaziguar as partes em confronto

Abbas, Mahmud

A história de Mahmud Abbas confunde-se com a do povo palestiniano: Safed, cidade na alta Galileia, viu-o nascer a 15 de novembro de 1935 e fugir, com a família, durante a guerra de 1948 para a Síria, onde se licenciou em direito na Universidade de Damasco; seguiu-se o Egipto e, depois, Moscovo onde se doutorou na universidade Patrice Lumumba. Em 1961, então no Qatar, o hoje presidente da Autoridade Palestiniana (AP) aderiu à Fatah, grupo criado por Yasser Arafat e outros palestinianos refugiados no Koweit. Pragmático, Abbas ou Abu Mazen (porque é pai de Mazen, o seu filho mais velho), foi dos primeiros membros da Fatah a defender em 1977 o diálogo com os moderados israelitas.

Embora sendo companheiros de luta, a sua relação com Arafat nem sempre foi fácil, até pela maneira de ser de cada um, o que não impediu o líder da Organização de Libertação da Palestina (OLP) de enviar Abu Mazen a missões diplomáticas sensíveis, até mesmo a negociações com Israel. Hoje, Abu Mazen, que não reconhece o poder do Hamas na Faixa de Gaza, mantém-se na sede da AP em Ramallah (Cisjordânia), onde procura evitar uma nova Intifada contra Israel e continua a ser o rosto do povo palestiniano … até novas eleições.


Al-Assad, Bashar 

O médico que preferiu a oftalmologia porque não gostava de ver sangue é um dos ditadores sanguinários do Médio Oriente. Chefe de Estado da Síria desde 17 de julho de 2000, na sequência da morte do seu pai, o presidente Hafez al-Assad, Bashar não estava destinado a governar, não fosse a morte – num inexplicado acidente rodoviário – do seu irmão mais velho, Basel, que o pai preparara para lhe suceder. O primeiro ano de Bashar foi marcado pela “primavera de Damasco”, o movimento de reforma liderado por escritores, dissidentes, intelectuais; centenas de prisioneiros da Irmandade Muçulmana e opositores políticos foram libertados e a prisão Mezzeh foi encerrada. Mas a “velha guarda” alawita não desapareceu com a chegada do jovem Assad e, em menos de um ano, aconteceu o “inverno de Damasco” com o seu rol de detenções, desaparecimentos e exílio. O reino de terror dos Mukhabarat [serviços secretos] impôs-se.

Biden, Joe

O 46º Presidente dos EUA procura evitar que o atual conflito entre Israel e o Hamas ultrapasse as fronteiras do Estado hebreu e da Faixa de Gaza. E tenta ainda que as ações militares de Telavive sobre o território palestiniano tenham o mínimo de efeitos colaterais, o que é difícil dada a densidade populacional do mesmo.

O político democrata, que nasceu há 80 anos na Pensylvania, tem consciência do quão frágeis são os esforços para manter sob controlo um conflito numa área tão volátil como é o Médio Oriente. Basta uma faúlha e o incêndio alastra. Biden, cujo país é um aliado incondicional de Israel, reiterou a amizade entre Washington a Telavive e enviou a ajuda que lhe foi pedida, mas fez questão de aconselhar Netanyahu a “não se deixar dominar pela raiva” e advogou a necessidade de fazer chegar ajuda humanitária à Faixa de Gaza. “Líder do mundo livre”, como se dizia no tempo da guerra fria, Biden procurou fazer o equilíbrio entre os dois lados, enquanto reforça a presença militar na região num sinal óbvio, ao Irão e ao Hezbollah, de que não deseja um alastrar do conflito.

Gallant, Yoav

“Não haverá eletricidade, comida, água, combustível. Está tudo fechado. Estamos a lutar com animais humanos”, anunciou Gallant. Ministro da Defesa de Israel e elemento do Gabinete de Guerra. Este filho de imigrantes polacos nasceu em Jaffa em 1958 e optou pela vida militar, exceto nos seis anos que viveu no Alasca como lenhador. Consciente das consequências da reforma judicial exigiu a sua suspensão e Benjamin Netanyahu ameaçou demiti-lo, mas recuou face aos protestos, o que reforçou a posição de Gallant. Não fosse o ataque do Hamas e a sorte do ministro da Defesa provavelmente iria mudar. Comandante do Comando Sul (2005-2010), liderou a Operação Ferro Fundido contra o Hamas na Faixa de Gaza. A sua atuação foi significativa para o sucesso da mesma embora a ONG israelita Yesh Gvul tenha obstado a sua nomeação para chefe do exército alegando que, durante a referida operação, foi suspeito de “violação grave da lei internacional”.

Gantz, Benny

“Príncipe” é alcunha do general que escolheu a política para continuar a servir o seu país. E aos 64 anos, Benny Gantz, ministro da Defesa entre 2020 e 2022, vê-se de novo envolvido em questões militares ao integrar o Gabinete de Guerra de Israel. O que não deixa de ser curioso: o general garantiu que o seu partido não entraria num governo com Bibi dado os problemas legais de que este é alvo. Aliás, a relação entre os dois políticos é tudo menos pacífica. O Likud (direita) de Netanyahu chegou a afirmar que Gantz é “mentalmente instável”, logo, incapacitado para governar. E o ‘Príncipe’ terá afirmado que Bibi gostaria de o ver morto.

Equilibrado, cauteloso e pragmático, o fundador do Partido Resiliência de Israel, em 2018, que se aliou com o Telem e Yesh Atid para formar o Azul e Branco (centro), defendeu em campanha um limite para o número dos mandatos do primeiro-ministro e anunciou recusar a entrada no Knesset [parlamento] de políticos indiciados, o que levou Netanyahu a sentir-se como alvo privilegiado do general.

Halevi, Herzl

“Gaza nunca mais será a mesma”, garantiu o chefe do estado maior general das Forças de Defesa de Israel (IDF). O major-general Halevi, que assumiu o cargo em janeiro último, é um elemento importante na equação das decisões da guerra contra o Hamas por várias razões: serviu como comandante no Comando Sul, que inclui a Faixa de Gaza, e foi chefe do Diretorado da Inteligência Militar (Aman, serviços secretos militares), aliás trata-se do primeiro judeu observante a chefiar os serviços em causa.  A 91ª Divisão territorial e a 35ª Brigada de Paraquedistas estiveram também sob o seu comando.

Referindo-se à situação atual entre Israel e o Hamas, Halevi reconheceu que o exército falhou no seu objetivo primeiro, ou seja, a defesa e proteção dos cidadãos de Israel, mas garantiu que irá haver uma investigação e que aprenderão com ela. De momento, porém, “é tempo para a guerra” que irá destruir o Hamas, cujos líderes e atacantes são já “homens mortos”.

Haniyeh, Ismail 

Atual líder político e rosto do Hamas, Haniyeh nasceu a 29 de janeiro de 1962 no campo de refugiados de Shati, na Faixa de Gaza. O seu contacto com o movimento ocorreu na Universidade Islâmica de Gaza, onde liderava o conselho de estudantes dos Irmãos Muçulmanos. Preso por Israel durante a primeira Intifada, foi libertado em 1992 e deportado para o sul do Líbano com responsáveis do Hamas, como Abdel Rantissi e Mahmoud Zahar, e outros 400 ativistas, onde ficou durante um ano. Em 1997, após a libertação do fundador do Hamas, xeque Yassin, foi escolhido para chefiar o seu gabinete. Em 2005 é escolhido para liderar a lista do Hamas às legislativas de 2006 e chefiar o governo. A 14 de junho de 2007, no auge do conflito entre a Fatah e o Hamas em Gaza, o presidente Mahmud Abbas declarou o estado de emergência e demitiu o executivo de Gaza; Haniyeh ignorou-o e manteve-se no ativo. Em maio de 2016, é eleito chefe político do Hamas, substituindo Khaled Meshal. Em setembro, parte para o Qatar onde reside. 

Hussein, Abdullah bin 

Subiu ao trono aos 37 anos após a morte do seu pai o rei Hussein, em 1999. Descendente direto do profeta Maomé, representa a monarquia hashemita, no poder desde 1921 na Jordânia, que tem a custódia dos lugares santos muçulmanos em Jerusalém desde 1924, e foi o segundo país a fazer a paz com Israel em 1994.

Abdullah II, que em 1993 casou com Rania al-Yassin, palestiniana, só nas últimas semanas de vida do pai foi escolhido como príncipe herdeiro. Até então, e como acontece com frequência nas monarquias árabes, era o irmão do rei, o príncipe Hassan, o escolhido para o trono. A educação de Abdullah, que recebeu o nome do avô paterno - o rei que foi morto por um palestiniano em Jerusalém –, foi feita em Amã, Reino Unido e EUA e orientada para uma carreira militar. Hussein, porém, integrou o filho em muitas das suas missões e deu-lhe a responsabilidade de muitas outras.

Monarca constitucional, Abdullah II disfarçou-se muitas vezes para conhecer o país; procurou liberalizar a economia, melhorar a situação da população, que ultrapassa os 11 milhões, e realizar reformas políticas. Em novembro de 1999, expulsou o Hamas do país que conta com mais de dois milhões de refugiados palestinianos.

Nasrallah, Hassan

O secretário-geral do Hezbollah desde 1992, após Israel ter assassinado o seu antecessor al-Musawi em fevereiro desse ano, nasceu em 1960 numa família xiita dos arredores de Beirute. Nasrallah cedo se interessou por questões teológicas, mas aos 15 anos, durante a guerra civil, aderiu ao grupo político xiita Amal. Um ano mais tarde, parte para o Iraque e estudou na escola do ayatollah al-Sadr, em Najaf. Em 1979 regressa ao Líbano quando Saddam expulsa xiitas, entre eles o ayatollah Khomeini. Após a invasão israelita do Líbano (1982), Nasrallah aderiu ao Hezbollah; em 1989 partiu para a cidade iraniana de Qom, a prosseguir os estudos religiosos, de onde regressou em 1991.

O Hezbollah (Partido de Deus, com assento no Parlamento) agregou grupos xiitas e adotou o modelo criado pelo ayatollah Khomeiny no Irão, o seu grande apoiante material e mentor. Teve na sua fundação a ajuda de instrutores dos Guardas da Revolução. Expulsar Israel do Sul do Líbano era o objetivo primeiro do Hezbollah, agora inimigo figadal de Israel cuja existência recusa. As suas operações contra Israel acabam por fazer das populações do Líbano, em especial do sul, vítimas da retaliação de Israel.

al-Nakhalah, Zyad

Oriundo de Khan Yunis, sul da Faixa de Gaza, onde nasceu a 6 de abril de 1953, é o atual líder da Jihad Islâmica Palestiniana (JIP) desde setembro de 2018 após o secretário-geral Ramadan Shalah ter sido vítima de AVC. Professor na Cidade de Gaza, foi detido por Israel em 1971 e condenado a prisão perpétua pelas suas atividades com a Frente de Libertação Árabe. Em maio de 1985, é um dos 1150 palestinianos libertados pelo Acordo Jibril. Então, Fathi Shikaki, um dos fundadores da JIP em 1981, encarrega-o de criar em Gaza a ala militar do grupo, Brigadas Al-Qods. A sua participação na I Intifada leva-o à prisão em Israel em 1988 e o exílio para o Líbano, país que alterna com a Síria para viver.

A JIP é a versão palestiniana da Irmandade Muçulmana, foi profundamente influenciada pelo Irão; é considerada uma das mais extremistas fações armadas e o segundo maior grupo em Gaza. Rejeita um acordo de paz com Israel e defende a criação de um Estado islâmico “do Jordão ao Mediterrâneo”. Rival do Hamas, colabora com ele consoante o momento ou a necessidade. Irão e Síria são os seus apoios económicos e militares.

Netanyahu, Benjamin (Bibi)

Nasceu em Telavive a 21 de outubro de 1949. É o primeiro chefe de governo a nascer no Estado de Israel, o mais jovem e o que mais tempo ocupou o cargo: seis mandatos, em 16 anos. O “senhor teflon” tem sobrevivido a escândalos e fracassos como o de 1997, quando autorizou uma operação da Mossad para assassinar o líder do Hamas na Jordânia. Disfarçados de turistas canadianos, dois agentes injetaram veneno nos ouvidos de Khaled Meshal numa rua de Amã; foram presos. O rei Hussein, que assinara a paz com Israel três anos antes, exigiu a Israel o antídoto do veneno e ameaçou romper o tratado de paz, do que deu conta ao presidente Clinton. Netanyahu cedeu: forneceu o antídoto e ordenou a libertação de 61 jordanos e palestinianos, entre eles o xeque Yassin. Vaticinaram a sua queda … falharam.

Netanyahu parece confiar ainda na sua “boa estrela” e ignora os alertas internos e externos sobre as consequências da política da sua coligação de extrema-direita super belicista que tem enfraquecido a democracia e polarizado a sociedade. Após o ataque de dia 7, o “senhor Segurança” garantiu “acabar com o Hamas”, única forma de Israel ter paz e segurança. E de Bibi “escapar ao julgamento” dos israelitas que pedem a sua demissão.

Khamenei, Ali

Supremo Líder do Irão desde 1989, o ayatollah Ali Khamenei é, por isso, o homem forte da República Islâmica: toda e qualquer decisão passa pelas suas mãos; é o comandante em chefe das forças armadas e controla, de forma direta ou indireta, o governo, o parlamento e os tribunais. A política externa está também sob a sua alçada.

Khamenei, de 84 anos, foi presidente do Irão de 1981 a 1989, cargo que aproveitou para estreitar os laços com os poderosos Guardas da Revolução. Manter uma posição que evite o confronto ou adaptação com o Ocidente, é a palavra de ordem na gestão da sua política externa. O que não o impede de fazer declarações como a que compara a Arábia Saudita a Israel pela sua intervenção no Iémen; rejeita as relações com os EUA e responsabiliza o Ocidente por todos os males. A sua retórica contra Israel ultrapassa tudo: em 2000 classificou-o como “um cancro” que “tem de ser removido da região”, e em 2015 deu-lhe “25 anos” de existência. O Irão dos ayatollahs, em oposição à Pérsia do Xá, apoia todos os inimigos de Israel e não terá sido alheio ao massacre perpetrado no passado dia 7.

Al-Thani, Tamim

Emir do Qatar desde 2013, ao suceder a seu pai que decidiu abandonar o poder aos 61 anos – situação inédita nos países árabes -, o xeque Tamim Hamad al Thani é, aos 43 anos, o mais jovem dirigente árabe. O seu pequeno país, rico em gás natural e que apoiou as Primaveras Árabes, foi escolhido pelos líderes do Hamas como terra de exílio, daí que as negociações para a libertação de reféns israelitas passem por Doha.

Como muitos elementos de famílias reais árabes, Tamim fez parte da sua educação no Reino Unido, primeiro na Escola Sherborne em Dorset, depois na Real Academia Militar em Sandhurst. De personalidade forte, o tempo que viveu no Reino Unido reforçou o seu lado de desportista – empenhou-se para conseguir que o Qatar fosse palco do último campeonato mundial de futebol -, mas isso não pôs em causa a sua relação especial com a Irmandade Muçulmana. Em 2022 foi mesmo escolhido pelo Real Centro de Estudos Estratégicos Islâmicos como o muçulmano mais influente do mundo. Entretanto, muitos qataris ainda acreditam que o seu jovem emir irá suavizar o regime e autorizar partidos políticos e eleições livres.

 

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