Grávida foi seis vezes às urgências em duas semanas. Bebé nasce sem sinais vitais, teve de ser reanimada e luta agora pela vida

11 set 2022, 20:26

Eduarda queixa-se de negligência por parte do Hospital de Cascais e assegura que, por ser brasileira, foi alvo de xenofobia por parte de uma médica.

Maria Eduarda, de 20 anos, folheia ecografias e relatórios de exames, numa tentativa de encontrar explicação para a volta de 180 graus que a vida deu há uma semana. A filha, Helena, nasceu a 4 de setembro, numa cesariana de emergência, sem sinais vitais e teve de ser reanimada.

Contava agora ter a filha nos braços e passar as noites sem dormir por causa do choro da bebé. Mas, em vez disso, passa as noites em claro a passar em revista os acontecimentos das duas últimas semanas de gestação.

Entre as 38 e as 40 semanas, deslocou-se ao hospital seis vezes. A gravidez que até aí correra com normalidade, era agora vivida com muita ansiedade.

Tinha acabado de completar as 38 semanas quando procurou as urgências pela primeira vez. Queixou-se de um corrimento que considerou anormal. Após observação, teve alta e foi-lhe garantido que tudo estava bem.

Voltou ao hospital de Cascais a 31 de agosto e a 2 de setembro: os mesmos sintomas e o mesmo desfecho.

Na madrugada de 2 para 3 de setembro, já com contrações, volta ao Hospital de Cascais e começa o verdadeiro pesadelo:

“Estava eu em pé e outra mulher sentada. A enfermeira veio e disse: ‘olha, vou falar uma coisa para vocês: se por acaso a bolsa de vocês estourar não voltem cá, porque aqui só vai ter vaga amanhã depois das quatro horas’. Eu estava esperando a vaga para fazer um CTG. Porque realmente tinha muitas grávidas. Aí fui para fazer o CTG e do CTG eles me mandaram [embora]. (…) Veio a médica e uma enfermeira e mandaram-me embora e me falaram que se continuasse era para eu tomar um ben-u-ron e esperar.”

Por iniciativa própria e porque as dores se tinham tornado insuportáveis, Eduarda saiu do Hospital de Cascais e dirigiu-se ao Hospital Fernando da Fonseca (HFF) – o Amadora-Sintra. Foi-lhe dito que estaria a iniciar o trabalho de parto: estaria já com dois dedos de dilatação e o colo do útero “maduro”. “ Quem fez a triagem comigo, foi uma brasileira. Ela colocou-me para fazer o CTG e aplicou-me um remédio. Um remédio para a dor”, recorda.

Pedimos explicações ao Hospital Fernando da Fonseca, que confirmou ter recebido a doente, às 40 semanas de gestação. “Foi transferida para o HFF na madrugada do dia 3 de setembro desde o Hospital de Cascais por falta de vagas nessa instituição. À data da admissão e triagem no SUOG do HFF encontrava-se com contrações, mas não se apresentava em trabalho de parto. Foi realizada observação obstétrica à grávida e avaliado o bebé mediante ecografia e CTG, que não mostraram sinais de sofrimento fetal ou da mãe. Foi prescrito paracetamol para as dores da mãe”, resume o hospital, em comunicado enviado à CNN Portugal.

Após reavaliação e, de acordo com o HFF, já sem dores, Eduarda teve alta. Garante que as contrações que sentira até aí desapareceram. Não sentiu dores durante todo o dia 3 e durante o dia 4, até ao fim da noite, altura em que sentiu uma cólica e rebentaram as águas. Mas em vez de um líquido transparente, libertou um líquido que descreve como “marrom, meio para o verde”.

Eduarda voltou às urgências do Hospital de Cascais e, na triagem, já não conseguiram detetar movimentos fetais e batimentos cardíacos da bebé. Enquanto era submetida ao CTG (Cardiotocografia), garante que, por ser brasileira, foi alvo de xenofobia por parte de uma médica.

“Eu estava a explica-lhe o que eu estava a sentir e o que tinha acontecido. O que me travou foi na hora, que eu achei incrível, foi a senhora estar a perdi-me para eu falar português. (…) Eu falei ‘olhe, eu tive um corrimento marrom’. Quando eu falei isso, ela disse: ‘olha, desculpa, mas cá falamos português. Isso não é marrom. É castanho’. E disse um monte de coisas. Perguntou a minha nacionalidade. (…) A pessoa está num momento difícil (porque ela sabia que era um momento difícil) e vem falar para eu falar português? Porquê isso? Porquê vir procurar da minha nacionalidade? O que é que isso ia mudar?”, questiona.

Eduarda foi submetida a uma cesariana de emergência, com anestesia geral. Desconhece o que aconteceu durante o parto. Sabe apenas que Helena nasceu com um pouco mais de quatro quilos e sem sinais vitais. Foi reanimada e internada nos cuidados intensivos neonatais do Hospital de Cascais, de onde foi transferida para Santa Maria.

Questionado pela CNN Portugal, o Hospital de Cascais que, alegando o regime de proteção de dados, recusou divulgar informações concretas sobre o caso. Em comunicado enviado à redação, através de WhatsApp, o hospital garante apenas que “cumpriu estrita e integralmente todos os procedimentos clínicos previstos para a situação em causa”. Assegura ainda estar disponível para prestar todos os esclarecimentos à própria doente.

Eduarda não sabe quanto tempo a bebé esteve a ser reanimada e quanto tempo o cérebro esteve sem oxigenação. A pequena Helena luta agora pela vida. Esta segunda-feira, deve ser submetida a uma ressonância magnética para avaliar as lesões cerebrais e ser traçado um prognóstico.

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