Ricardo Nascimento: «Éramos bons»

12 out 2000, 17:36

Agarrado a um joelho em Montpellier

Ricardo era o cérebro. Os membros, que pareciam atados por extensões nervosas, contraíam-se e alongavam-se ao sabor de uma simulação, ao ritmo de um drible, aguardavam desesperadamente o passe, para se distenderem num repente. À direita ou à esquerda, conforme o génio do multiplicador de estímulos, que os desferia ao pontapé, em movimentos estranhamente subtis. 

Era estrela, finalmente, apreciado por uma técnica de requintes, por movimentos súbitos e elegantes. O Gil Vicente tornara-se demasiado pequeno e assustadoramente pobre para o reter em Barcelos, quando ao seu empresário já sobrava pouco espaço na carteira para arrumar propostas. A renovação estava condenada. 

Foi para Montpellier, de onde chegara Gouveia para o Boavista. Não era I Liga, mas o tilintar dos francos convenceu-o. Bastava-lhe o atraso, ter perdido a pré-temporada, para perceber que teria de se apressar. Lesionou-se aos primeiros dias. Recompôs-se e lesionou-se outra vez. E outra vez ainda. «Nunca vi nada assim!», comenta, intrigado, a meio de um suspiro que não carrega alívio consigo. Nunca jogou, mas espera fazê-lo no domingo. «Com um pouco de sorte», graceja, e se a entorse no joelho deixar. 

Mesmo em França, não perde pitada da Liga portuguesa. «Estou a par de tudo», ri. Quando a televisão não basta, socorre-se do telefone. A questão não podia apanhá-lo de surpresa. Quando muito, deixava-o mudo por segundos, procurando encaixe para o penúltimo lugar do Gil Vicente. «Entrosamento» era a resposta. «Não há do meio-campo para a frente». Essa, reconhece, era a principal virtude da equipa que conduzia quase de olhos fechados. «Tínhamos uma rotina de jogo, eramos bons...». Não havia como o negar. 

Só viu um jogo do Gil Vicente do princípio ao fim, numa transmissão televisiva que quase agradeceu aos céus. Torceu em vão. O Gil, que nem lhe pareceu mal, perdeu aos pés do Sporting. «Está muito bem a nível defensivo». A aprovação ficava-se pelo sector que só perdeu Auri. Sobre os outros deixa que seja o tempo a pronunciar-se. «Eles vão conseguir», arrisca. «Trabalha-se bem naquela casa». Mas suspeita, com algum orgulho implícito na dúvida, de que nenhuma carga ou dose de aperfeiçoamento poderá aproximar Álvaro do quinto lugar da época passada: «Isso vai ser difícil. Afinal, nós ficámos na história». 
 

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