Vale e Azevedo: auto-retrato de um homem por trás do «monstro»

18 jan 2002, 19:05

Ex-presidente emociona-se ao descrever o que tem vivido O ex-presidente do Benfica explicou como este processo destruiu a sua família e apresentou o homem que diz ser tratado como «um monstro».

Vale e Azevedo resolveu apresentar-se... Confuso? O ex-presidente resolveu revelar em tribunal o homem que se esconde atrás de uma imagem que acusa ter sido construída. Entre lágrimas, lamentou que a situação de que se diz vítima tenha destruído a sua família e contou o seu trajecto pessoal e profissional. «Desde 1997, foi vendida a imagem de um monstro, de uma pessoa sem escrúpulos e a minha história de vida nada tem a ver com essa imagem», disse. 

A sala de audiências parou para escutar Vale e Azevedo e houve quem não conseguisse conter uma lágrima ao ouvir o discurso do ex-presidente do Benfica. «Servi de bode expiatório» e «fizeram da minha vida um inferno» foram algumas das queixas de João Vale e Azevedo, que conseguiu emocionar algumas das pessoas que assistiam à sessão quando explicou as contrariedades que este processo trouxe para a sua família e, nomeadamente, para os seus filhos. «Gostava de ser uma pessoa normal», disse o advogado lavado em lágrimas. 

Vale e Azevedo recordou que os filhos têm sido as maiores vítimas de toda a situação, já que são discriminados e insultados consecutivamente. O antigo homem máximo do Benfica queixou-se de não poder partilhar determinados momentos com os filhos e recordou, entre soluços, que o filho mais novo está revoltado e o demonstrou pintando o cabelo de verde... Esta foi a forma de o jovem mostrar que nada quer ter a ver com os encarnados. 

O ex-responsável pelos destinos da Luz deu grande ênfase à sua vida em família, descrevendo o seu ambiente familiar e explicando que é uma pessoa que leva uma vida regrada: «Sou um homem de família. Estou casado há 21 anos e ninguém me conhece uma amante. Fui convidado para ir ao Elefante Branco (casa nocturna) e nunca aceitei. No mundo do futebol, gosta-se muito do Elefante Branco, mas não está na minha natureza.» 

«Não ligo nada ao dinheiro» 

«A minha vida sempre foi virada para aspectos sociais», disse João Vale e Azevedo e, para exemplificar o que dizia, recordou os tempos em que deu aulas num bairro problemático, o Bairro da Musgueira, a forma como criou uma rapariga que sempre foi tratada como sua filha e enumerou as instituições que ajudou e visitou. «Sou uma pessoa que não liga nada ao dinheiro», referiu Vale e Azevedo, acrescentando ser «uma pessoa de acção, mas sempre em benefício dos outros», querendo que «sejam mais felizes». 

O ex-presidente contou como começou a trabalhar aos 17 anos, quando não tinha necessidade disso. O desejo de independência, afirmou, falou mais alto e desde recortar jornais e trabalhar como motorista, Vale e Azevedo fez de tudo um pouco. O ex-dirigente queixou-se de durante muito tempo não ter tido férias «senão agora», referindo-se aos 11 meses em que se encontra detido como umas «férias». 

Mas não se pense que Vale e Azevedo tem estado parado. Muito pelo contrário. Segundo o advogado, desde que entrou na prisão, desenvolveu uma série de actividades: organizou campeonatos desportivos, criou um boletim informativo, desenvolveu hábitos de leitura e reestruturou a biblioteca. 

«Sempre tive uma vida monástica» 

Vale e Azevedo recordou o início de toda a sua estrutura empresarial e contou como construiu um império do nada. Vincando que o valor que sempre deu ao dinheiro foi de um meio de investimento e gerador de emprego. «Nunca fui pessoa de gastar dinheiro estupidamente», disse o ex-presidente. 

Os exemplos e demonstrações de que Vale e Azevedo levava uma vida sem excessos sucederam-se. Soubemos que o ex-dirigente encarnado não possui carro próprio desde 1976, mas sempre usou os carros da empresa, que duravam sete a oito anos... até «griparem», como contou Vale e Azevedo, recordando um episódio em que ficou parado na zona de Cascais, mesmo depois de o motorista o ter aconselhado a desfazer-se do automóvel. A ideia forte nesta fase do depoimento resumiu-se à tentativa de demonstração de que o desperdício está fora do vocabulário de João Vale e Azevedo. 

«Sempre tive uma vida monástica», referiu o advogado. Falando dos seus hábitos, Vale e Azevedo revelou que é uma pessoa caseira. Raras foram as vezes em que se deslocou a um restaurante e as suas «extravagâncias foram alugar barcos e passar umas férias na neve». 

João Vale e Azevedo queixou-se de a actual direcção nunca ter dialogado consigo. «Nunca mostrou interesse em discutir verbas», lamentou o ex-presidente, acrescentando que «era preciso bom senso, mas não houve.»

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