Que modelo para a França?

28 jun 2000, 00:24

Adversário de Portugal visto à lupa Um ou dois avançados? Vieira ou Petit? E do lado português, João Pinto ou Sérgio Conceição? Aposta nos flancos ou no meio? Saiba o que esperar no jogo de logo, em Bruxelas.

BRUXELAS-Embora todas as atenções mediáticas estejam centradas no duelo Figo-Zidane - um duelo só justificável no plano do talento, não das respectivas funções, já que o equivalente português a Zidane é Rui Costa-o «puzzle» táctico em redor do Portugal-França passa por outras interrogações. 

Um ou dois avançados diante de Portugal? Esta é a grande incógnita que a selecção francesa reserva para a meia-final do Heysel. Roger Lemerre, que aceitou o desafio de completar, pela primeira vez na história, a dobradinha Mundial-Europeu, parece ter voltado atrás na sua fórmula predilecta, que marca a única diferença significativa entre a «sua» França e a de Aimé Jacquet. 

Robert Pires, o talentoso médio de ascendência portuguesa que continua a viver na sombra de Zidane e Djorkaeff, recorda os passos da mudança: «O nosso título mundial é suficiente para que todos os adversários nos encarem como a equipa a abater. Sabíamos que para conseguir um feito inédito, conquistando os dois títulos, tínhamos de acrescentar qualquer coisa à equipa de 1998 e surpreender os nossos opositores». Essa «qualquer coisa» traduz-se numa ligeira mudança táctica, que não põe em causa a solidez do bloco mais homogéneo e com mais tempo de trabalho conjunto de entre os dezasseis participantes no Europeu: 18 dos 22 convocados de Lemerre estavam já no grupo de Jacquet. 
 

Mais ofensiva, igualmente sólida 

A era-Lemerre coincidiu com a «explosão» do fenómeno Anelka, e com o crescimento das potencialidades de Thierry Henry a partir do momento em que deixou o Mónaco. A necessidade de inovar para surpreender traduziu-se, então, na aposta constante numa dupla de avançados, que modificava a estrutura habitual de Jacquet, um 4-2-3-1 muito semelhante ao utilizado pela selecção portuguesa.  

Com Lemerre, a França manteve a invejável solidez do seu bloco defensivo (Thuram-Blanc-Desailly-Lizarazu levam, em conjunto, 23 jogos e mais de quatro anos sem derrotas), ganhando em capacidade explosiva na frente e na libertação de Zidane (que chega a este Europeu em muito melhor forma do que em 1998) para um papel ainda mais ofensivo, como pensador de serviço.  

Com Djorkaeff como complemento criativo e goleador (dois golos no torneio, tantos quantos conseguiu Henry), com Petit e Deschamps, ou o impressionante Vieira como âncoras do meio-campo, a França tornou-se mais ousada e só aparentemente mais vulnerável na defesa. É verdade que chega às meias-finais com cinco golos sofridos (contra apenas um no Mundial), mas desses, três foram consentidos pela equipa B, diante da Holanda, e os outros dois de «penalty», um deles inexistente. 

O exemplo espanhol 

Estavam as coisas nesse pé quando o jogo dos quartos-de-final contra a Espanha fez com que tudo regressasse à primeira forma. As actuações decepcionantes de Anelka e o receio de que a Espanha aproveitasse as subidas de Thuram e Lizarazu para carregar pelas laterais fez com que Lemerre regressasse à fórmula-1 (Henry), pedindo a Dugarry e Djorkaeff que efectuassem nos flancos o trabalho defensivo de que Anelka não é capaz. 

Esta é a prova de que mesmo as equipas mais personalizadas não hesitam em adaptar-se ao adversário. Mas estará Lemerre disposto a repetir a dose diante de Portugal? Não é certo, tanto mais que, pelas suas declarações, o seleccionador francês parece recear mais a circulação ofensiva da selecção portuguesa pelo centro do terreno do que propriamente a capacidade de Figo e Sérgio Conceição para desequilibrar pelas linhas. Se assim for, é provável que Anelka regresse à titularidade, por troca com o fragilizado Dugarry, que partiu o nariz diante dos espanhóis. Isto vai obrigar Fernando Couto e Jorge Costa a lidar com um futebol assente em arrancadas velozes, de dois dos mais rápidos avançados da actualidade. 

Um dia a mais para Portugal 

Em resposta, dando como provável o regresso de Abel Xavier ao «onze», para solidificar a capacidade defensiva no lado direito, Humberto Coelho terá de optar entre João Pinto e Sérgio Conceição para completar o triângulo de criativos com Figo e Rui Costa. Mais do que os nomes, são os estilos que estão em causa. Sérgio Conceição, mais eficaz quando actua colado à linha, pode ser um argumento importante para travar as subidas de Lizarazu. Figo faria o mesmo a Thuram, seguindo o exemplo da Espanha, com Mendieta e Munitis. E viu-se como os espanhóis conseguiram, em largos períodos do jogo, fazer oscilar o bloco defensivo da França, à custa de um futebol aberto. A manutenção de João Pinto no «onze», lógica, atendendo às boas exibições neste Europeu, teria como contrapartida um estreitamento do jogo ofensivo português, que passaria a visar directamente a dupla Deschamps-Vieira (embora Petit, já recuperado da lesão, possa também regressar ao seu posto).  

Humberto começará, com essa opção, a definir o tipo de armadilha que pretende montar aos franceses. Não esquecendo que Portugal teve mais 26 horas de descanso do que o seu adversário e que, em condições normais, poderá tirar partido disso mesmo nos últimos minutos, se o jogo estiver equilibrado. Nesse caso, seria mais eficaz guardar Sérgio Conceição no «banco» e injectar velocidade com a sua entrada na segunda parte? A resposta segue dentro de momentos...

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