Porque está a NASA a lançar foguetes para o percurso do eclipse solar

CNN , Ashley Strickland
7 abr, 17:00
Eclipse solar

Nos Estados Unidos da América, 8 de abril espera-se um dia muito agitado para os cientistas

Os eclipses alimentam o espanto e juntam muitos curiosos para observar este impressionante fenómeno celeste. Contudo, eventos cósmicos como estes também permitem aos cientistas desvendar mistérios do sistema solar.

Em Portugal, o eclipse do sol de 8 de abril será parcial, chegando apenas aos Açores. Mas nos locais onde ele o eclipse do sol será total, quando a lua tapar temporariamente o sol para milhões de pessoas no México, Estados Unidos da América e Canadá, várias experiências estarão em andamento para compreender melhor algumas das perguntas sem resposta sobre a órbita solar.

A Agência Espacial Norte-Americana (NASA) irá lançar foguetes-sonda e aviões de grande altitude WB-57 para levar a cabo pesquisas sobre a aparência do Sol e da Terra que apenas são possíveis durante um eclipse. Estes esforços fazem parte de uma longa história de tentativas de recolher observações e dados de enorme valor quando a Lua bloqueia temporariamente a luz do Sol.

Cada avião de alta altitude WB-57 da NASA é pilotado por um único piloto, enquanto um especialista em instrumentos fica no banco de trás. (Bill Stafford/NASA)

Um dos marcos científicos mais famosos ligados a um eclipse terá acontecido a 29 de maio de 1919, quando um eclipse solar total forneceu evidências para a teoria da relatividade geral de Albert Einstein, que o cientista descreveu de forma sistémica pela primeira vez em 1916, segundo a NASA

Einstein sugeriu que a gravidade é o resultado da deformação do tempo e do espaço, distorcendo a própria estrutura do universo. Como exemplo, Einstein propôs que a influência gravitacional de um objeto grande como o Sol poderia desviar a luz emitida por outro objeto, como uma estrela virtualmente atrás dele. Isto faria com que o objeto parecesse um pouco mais distante da perspetiva da Terra. Uma expedição científica para observar estrelas no Brasil e na África Ocidental, liderada pelo astrónomo inglês Arthur Eddington durante o eclipse de 1919, revelou que algumas estrelas pareciam de facto estar no lugar errado, validando a teoria de Einstein.

Esta descoberta é apenas uma das muitas lições científicas retiradas em contexto de eclipses.

Durante o eclipse de 2017 que atravessou os EUA, a NASA e outras agências espaciais levaram a cabo observações usando 11 naves espaciais diferentes e dois aviões de alta altitude.

Os dados recolhidos durante esse eclipse ajudaram os cientistas a prever, com precisão, como seria a coroa, ou a atmosfera externa do Sol, durante os eclipses de 2019 e 2021. Apesar das temperaturas escaldantes, a coroa tem uma aparência mais enfraquecida do que a superfície brilhante do Sol, mas surge como um halo à volta do Sol durante um eclipse, quando a maior parte da luz do Sol é bloqueada pela Lua, facilitando o estudo deste astro.

Por que razão a coroa é milhões de graus mais quente do que a superfície do Sol? Esse é um dos mistérios mais desafiadores sobre a nossa estrela. Um estudo de 2021 revelou algumas pistas, mostrando que a coroa mantém uma temperatura constante, apesar de o Sol passar por ciclos de 11 anos de atividade decrescente e crescente. Estas descobertas foram possíveis graças a mais de uma década de observações de eclipses, de acordo com a NASA.

O Sol está agora a atingindo o seu pico de atividade, conhecido como máximo solar, este ano, o que proporciona aos cientistas uma rara oportunidade para as suas investigações.

E agora, durante o eclipse de 8 de abril, cientistas e investigadores poderão fazer novas descobertas, com o poder de fazer avançar o nosso entendimento sobre este pedaço do nosso universo.

Mandar foguetes para um eclipse

Observar o Sol durante os eclipses também ajuda os cientistas a compreender melhor como flui o material solar. Partículas carregadas, conhecidas como plasma, criam um clima espacial que interage com uma camada superior da atmosfera da Terra, a chamada ionosfera. Esta região atua como uma fronteira entre a baixa atmosfera da Terra e o espaço.

Três foguetes-sonda serão lançados pela NASA, a partir da Wallops Flight Facility, a 8 de abril para estudar o eclipse (Allison Stancil/NASA)

A atividade energética libertada pelo Sol durante o máximo solar pode interferir com a Estação Espacial Internacional bem como com a infraestrutura de comunicação. Muitos satélites da órbita terrestre baixa e ondas de rádio operam na ionosfera, o que significa que um clima espacial dinâmico tem impacto no sistema GPS e nas comunicações de rádio de longa distância.

As experiências para estudar a ionosfera durante o eclipse incluem balões de alta altitude bem como um convite aos cidadãos, através da participação de operadores de rádio amador. Assim, os operadores em diferentes locais irão registar a força dos seus sinais e a distância percorrida durante o eclipse, para ver como as mudanças na ionosfera afetam os sinais. Os investigadores também conduziram esta experiência durante o eclipse anular de outubro de 2023, quando a Lua não bloqueou completamente a luz do Sol - os dados ainda estão a ser analisados.

Noutra experiência, também repetida, três foguetes-sonda vão ser lançados pela NASA na Wallops Flight Facility, na Virgínia. Serão lançados antes, durante e depois do eclipse, para medir como o súbito desaparecimento da luz solar tem impacto na atmosfera superior da Terra.

Aroh Barjatya, professor de engenharia física na Embry-Riddle Aeronautical University, em Daytona Beach, Flórida, está a liderar uma das experiências, chamada Perturbações Atmosféricas à Volta do Percurso do Eclipse, que foi realizada pela primeira vez durante o eclipse solar anular de outubro.

Cada foguete irá ejetar quatro instrumentos científicos do tamanho de uma garrafa de refrigerante para medir as mudanças na temperatura da ionosfera, na densidade das partículas e nos campos elétricos e magnéticos a cerca de 90 a 500 quilómetros acima do solo.

“Compreender a ionosfera e desenvolver modelos que nos ajudem a prever perturbações é fundamental para garantir que o nosso mundo, cada vez mais dependente da comunicação, funciona sem problemas”, disse Barjatya em comunicado.

Os foguetes-sonda atingirão uma altitude máxima de 420 quilómetros durante o voo.

Durante o eclipse anular de 2023, os instrumentos dos foguetes conseguiram medir mudanças bruscas e imediatas na ionosfera.

“Assistimos a perturbações capazes de afetar as comunicações de rádio no segundo e no terceiro foguete, mas não durante o primeiro foguete, teve lugar antes do pico do eclipse local”, contou Barjatya. “Estamos muito entusiasmados por lançá-los novamente durante o eclipse total, para ver se as perturbações começam na mesma altitude e se a sua magnitude e escala permanecem as mesmas”.

Ir para acima das nuvens

Três experiências diferentes vão ser realizadas a bordo dos aviões de pesquisa a alta altitude da NASA, conhecidos como WB-57.

Os WB-57 podem transportar quase 4.082 quilos de instrumentos científicos até 60 a 65 mil pés (entre 18.300 e 19.800 metros) acima da superfície da Terra, tornando-os uma peça fundamental do Programa de Ciências Aerotransportadas da NASA, explicou Peter Layshock, responsável pelo Programa de Pesquisa em Alta Altitude WB-57 da NASA no Johnson Space Center em Houston.

 Os aviões WB-57 conseguem transportar instrumentos acima da maior parte da atmosfera terrestre, reduzindo a turbulência e melhorando a qualidade das imagens que serão capturadas durante o eclipse. (Amir Caspi/Courtesy NASA)

Entre as vantagens de usar os WB-57 está o facto de o piloto e o operador de equipamentos poderem voar, bem acima das nuvens, durante cerca de seis horas e meia sem necessidade de reabastecer, percorrendo assim todo o percurso do eclipse no México e Estados Unidos da América, o que fornece uma visão contínua e desobstruída. A trajetória de voo dos aviões significa também que os instrumentos ficarão na sombra da Lua durante mais tempo do que se estivessem no solo. Quatro minutos de totalidade no solo equivalem a cerca de seis minutos de totalidade no avião, explicou Layshock.

Uma das experiências irá também concentrar-se na ionosfera, ao utilizar um instrumento chamado ionossonda, que atua como um radar. Este enviará sinais de rádio de alta frequência e ouvirá os ecos à medida que eles fazem ricochete na ionosfera, para assim medir o número de partículas carregadas que ela contém.

As outras duas experiências vão concentrar-se na coroa. Um projeto irá utilizar câmaras e espectrómetros para apurar mais detalhes sobre a temperatura e a composição química da coroa, bem como capturar dados sobre grandes explosões de material solar, conhecidas como ejeções de massa coronal.

Os jatos possuem “narizes” especiais para transportar instrumentos científicos especializados. (Amir Caspi/Courtesy NASA)

O outro projeto, liderado por Amir Caspi, cientista-principal do Southwest Research Institute em Boulder, Colorado, tem como objetivo capturar imagens do eclipse a 15.240 metros acima da superfície da Terra, na esperança de observar estruturas e detalhes dentro da coroa média e inferior. Utilizando câmaras de alta velocidade e de alta resolução, capazes de captar imagens em luz infravermelha, irá também procurará asteroides que orbitam por baixo do brilho do Sol.

“No infravermelho, não sabemos mesmo o que vamos ver. E isso faz parte do mistério destas observações tão raras”, reagiu Caspi. “Cada eclipse oferece-nos uma nova oportunidade de expandir as coisas. Pega-se no que se aprendeu no último eclipse e resolve-se uma nova peça do puzzle”.

Ciência

Mais Ciência

Patrocinados