Portaria que fixa valor de despesas isentas com teletrabalho em vigor a partir de outubro

Agência Lusa , BCE
29 set 2023, 14:45
Getty Images

A portaria define um euro por dia para as despesas adicionais com teletrabalho, e a majoração em 50% resultará em 1,5 euros por dia

A portaria que fixa o valor limite isento de impostos e contribuições da compensação paga pelas empresas aos trabalhadores pelas despesas adicionais com teletrabalho foi publicada esta sexta-feira em Diário da República e entra em vigor em outubro.

"A presente portaria entra em vigor no dia 1 de outubro de 2023", pode ler-se no diploma.

A ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Ana Mendes Godinho, já tinha anunciado a aprovação da portaria, há 10 dias, indicando o valor de 22 euros por mês (correspondente a 22 dias de trabalho) como limite de isenção, valor que poderá ser majorado em 50% se for definido na negociação coletiva.

A portaria define um valor diário de 10 cêntimos para compensar custos adicionais com eletricidade, de 40 cêntimos para compensar custos de internet pessoal e de 50 cêntimos pelo uso de computadores e equipamentos próprios.

Na prática, estes valores resultam em um euro por dia para as despesas adicionais com teletrabalho (22 euros por mês, tendo em conta 22 dias de trabalho) e a majoração em 50% resultará em 1,5 euros por dia (33 euros por mês).

O valor limite "é apenas aplicável à compensação pela utilização profissional em teletrabalho daqueles bens ou serviços que não sejam disponibilizados direta ou indiretamente ao trabalhador pela entidade empregadora", define a portaria.

Segundo o diploma, "considera-se disponibilização para efeitos do número anterior a oferta, a cedência, a colocação à disposição, a venda a um preço inferior ao valor de mercado ou qualquer outro ato que permita o uso e fruição da eletricidade, da Internet e do computador ou equivalente sem que o trabalhador suporte financeiramente os respetivos encargos em condições normais de mercado".

O valor limite "é apenas aplicável aos dias completos de teletrabalho, efetivamente prestado e que resultem de acordo escrito entre a entidade empregadora e o trabalhador", pode ler-se na portaria.

"Considera-se dia completo de trabalho aquele em que a prestação de trabalho tenha sido efetuada à distância, através do recurso a tecnologias de informação e comunicação, em local não determinado pelo empregador, em períodos não inferiores a um sexto das horas de trabalho semanal".

A portaria do Governo, assinada pelos secretários de Estado dos Assuntos Fiscais, Nuno Félix, e da Segurança Social, Gabriel Bastos, estava prevista nas alterações laborais aprovadas no âmbito da Agenda do Trabalho Digno.

A Agenda do Trabalho Digno está em vigor desde 1 de maio e a lei passou a prever que o contrato individual de trabalho e o contrato coletivo devem fixar, na celebração do acordo para prestação de teletrabalho, o valor da compensação ao trabalhador pelas despesas adicionais.

Advogados alertam para difícil aplicação da portaria

Advogados de Direito do Trabalho alertam para as dificuldades práticas da portaria que fixa em 22 euros por mês o valor limite isento de impostos e contribuições da compensação paga pelas despesas adicionais com teletrabalho.

"Uma vez que a portaria apenas produz efeitos a partir de 1 de outubro de 2023, só a partir da referida data é que os valores pagos a este título e dentro dos limites aí previstos beneficiarão da isenção", afirma à Lusa Tiago de Magalhães, advogado de Direito do Trabalho da CMS.

Segundo o especialista, os valores que já tenham sido pagos até outubro, mesmo que dentro do limite previsto, "não poderão beneficiar da isenção, desde logo porque não é feita nenhuma salvaguarda nesse sentido nem a portaria prevê qualquer efeito retroativo".

Tiago de Magalhães considera ainda que as normas previstas na portaria podem revelar-se de difícil execução.

"À semelhança do que tem acontecido com as disposições legais que regulam o teletrabalho, também esta portaria vem dificultar a aplicação prática da modalidade de teletrabalho", realça o advogado.

A portaria apenas prevê o limite de isenção para "dias completos de teletrabalho", mas imaginando uma situação em que o trabalhador apenas está em teletrabalho no período da manhã, ou só no da tarde "serão estes períodos somados até que seja totalizado o referido limite ou deverá ser entendido dia completo por referência a um dia de calendário?", questiona.

Outra dúvida, diz, pode ocorrer com o limite de isenção em 50 cêntimos por dia das despesas relacionadas com o uso de computador pessoal. "Significa isto então que nos casos em que a empresa disponibiliza o computador, o limite de isenção é reduzido em 50 cêntimos por dia?".

Para o advogado da CMS "significa que o limite isento irá variar de trabalhador para trabalhador, podendo, no limite, não estar sequer isento".

Já o advogado Pedro da Quitéria Faria, da sociedade Antas da Cunha Ecija, que considera o valor isento "baixo face àquilo que podem ser os consumos" do trabalhador, aconselha as empresas a atualizarem os acordos de teletrabalho "através de aditamentos ou adendas".

Pedro da Quitéria Faria alerta para problemas "de ordem prática" que poderão surgir nos recursos humanos das empresas, como por exemplo "comparar faturas, titularidade das faturas, dimensão do agregado, casas ou equipamentos mais eficientes energeticamente do que outros, consumos diferenciados".

"Não havendo acordo, mantêm-se os problemas da prova através de faturas, comparando os valores dos gastos correntes com os anteriores à passagem a teletrabalho", acrescentou o advogado da Antas da Cunha Ecija.

Em termos práticos e operacionais, "levanta-se ainda a problemática das despesas acima deste valor e, bem assim, a prova diabólica do valor excedente através das faturas e do método comparativo", referiu.

No entanto, Pedro da Quitéria Faria afirma que, "ainda que pecando por tardia, revela-se muito positiva a publicação da portaria, a qual vem resolver um conjunto de dificuldades que o tema levantava, já mesmo depois da entrada em vigor da Agenda do Trabalho Digno".

"Essas dificuldades redundaram, em alguns casos, em empresas que não pagaram qualquer valor por não saberem o que pagar, por desconhecimento do valor máximo isento e, bem assim, por não quererem ou não poderem arriscar pagar acima do valor que viesse a ser considerado como isento e tal indefinição, consequentemente também prejudicou os trabalhadores", concluiu.

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