Do desarmamento negociado às constelações de satélites: o que querem os partidos para a Defesa?

6 mar, 07:00
Dois F-16 da Lituânia em missão de patrulhamento (AP Images)

Com uma guerra na Europa a entrar no seu terceiro ano, Portugal vai a eleições e as propostas dos principais partidos para a Defesa não podiam ser mais diferentes

Na Europa, já não são só as palavras que são cada vez mais fortes. A Comissão Europeia vai apresentar uma estratégia industrial para a Defesa, com o objetivo de criar “uma economia de guerra”, numa altura que a União Europeia tem demonstrado ser incapaz de cumprir o compromisso de fornecer um milhão de munições à Ucrânia.

Os valores sugeridos demonstram bem a urgência com que os diplomatas europeus estão a encarar a situação. Thierry Breton, comissário europeu do Mercado Interno, defende que são necessários 100 mil milhões de euros, nos próximos meses, "para mudar o paradigma" e ter "uma defesa europeia credível”. A estratégia que a Comissão apresenta assenta em compras conjuntas e financiamento comum, abrindo a possibilidade de emissão de dívida comum e apoio do Banco Europeu de Investimento.

Portugal, que se mantém abaixo do grupo de países que cumpre o compromisso da NATO de gastar 2% do PIB em Defesa, vai às urnas no próximo domingo e há propostas dos mais variados géneros. Em 2023, Portugal investiu 1,48% do seu PIB em defesa e o compromisso do Governo de António Costa é de que os 2% sejam atingidos em 2030. Este é um prazo que ninguém propõe alterar, mas há medidas para todos os gostos.

Partido Socialista

Para ler as intenções do Partido Socialista para a Defesa Nacional é preciso ir até à página 138 de 144. A campanha de Pedro Nuno Santos admite que se multiplicam “os riscos e as ameaças no flanco-leste da Europa, no Médio Oriente e no Mediterrâneo” e que, por isso, Portugal deve “antecipar o cumprimento” da meta de 2% de gastos em Defesa, embora não especifique se se refere à meta de 2030, traçada por António Costa.

Esse dinheiro, sublinham os socialistas, deve ser utilizado na “valorização e dignificação” dos militares e antigos combatentes dos vários ramos, mas também no investimento de forças e na base industrial militar portuguesa. À semelhança do plano proposto pela Comissão Europeia, o PS quer utilizar a indústria da Defesa para dinamizar o crescimento da economia portuguesa.

Para isso, propõe “envolver o tecido empresarial” do setor no processo de reequipamento das forças armadas, mas também “participar em consórcios europeus de produção de equipamento militar”, tornando Portugal “num parceiro interveniente na produção de sistemas de defesa” na Europa.

Além disso, o PS quer promover a componente tecnológica da indústria militar, com uma ligação entre empresas privadas e “entidades de investigação”, para capacitar os setores marítimos e aeronáuticos. Foi proposta também uma medida especifica para o apoio à construção de drones “multifuncionais”, que possam ser utilizados para fins militares, científicos, de proteção civil ou de segurança interna.  

No entanto, o programa eleitoral de Pedro Nuno Santos apresenta uma medida ainda mais ambiciosa com a criação de competências para desenvolver “constelações de satélites preparados para fornecer serviços de vigilância terrestre e marítima com diferentes capacidades”.

Aliança Democrática

Para a Aliança Democrática, apesar de atingir a meta dos 2% do PIB estabelecido pela NATO ser uma das metas definidas, este “não deve ser um fim em si mesmo”, sublinhando que “mais do que gastar mais” é necessário “gastar melhor” e investir em “investigação e tecnologia” com uma preocupação a médio prazo. A coligação liderada por Luís Montenegro também não especifica se pretende manter o prazo traçado pelo Governo do Partido Socialista para atingir o investimento de 2% do PIB na Defesa em 2030.

A AD sugere “manter e desenvolver” as capacidades inerentes a um conflito convencional. Isso significaria a aquisição de capacidades das quais Portugal não dispõe, como a defesa antiaérea, embora o partido não especifique se o vai fazer. À semelhança do PS, a AD quer reforçar a cibersegurança e “promover a participação de empresas portuguesas em consórcios de investigação, desenvolvimento e produção” na área da Defesa.

No entanto, a coligação liderada por Luís Montenegro propõe também avançar com “uma indústria de defesa competitiva a nível europeu e internacional”, com o fortalecimento do investimento nesta área. O objetivo é “reforçar a capacidade de exportação da indústria” militar e de tecnologias de duplo uso.

Chega

O partido de André Ventura quer utilizar o compromisso do investimento de 2% do PIB na Defesa para “combater o desinvestimento crónico” associado ao setor e uma “insuficiência de verbas para a sua operação e manutenção”. Este aumento, diz o partido, seria suficiente para conseguir a aquisição e renovação de meios em diversas áreas.

A renovação e manutenção das unidades Oceânicas de Superfície e Submarinas, o reforço da capacidade de “proteção e sobrevivência” da força terrestre, a passar por meios defensivos e ofensivos da força aérea, pela capacidade de ciberdefesa e pela reposição de reservas de guerra. Além disso, o partido propõe aumentar o número de efetivos nos três ramos das Forças Armadas, passando os atuais 23.425 para os 32.122 aprovados pelo Governo de António Costa.  

Mas há também uma palavra para a indústria militar. O Chega quer implementar benefícios fiscais para permitir a “criação de um ecossistema amigo das empresas” do setor da Defesa, para que sejam dotados “de pólos de excelência e inovação, atraindo desta forma os melhores talentos”.

Iniciativa Liberal

Os liberais definem a Federação Russa como “a principal ameaça à integridade territorial europeia” e defendem a entrada da Ucrânia na União Europeia, bem como uma estratégia de redução de exposição ao risco em relação à China. Defendem  também que a Europa deve ser capaz de alavancar o seu poder diplomático através de “uma forte capacidade dissuasora”. Por isso, sugerem “apostar na recuperação da capacidade e prestígio das Forças Armadas portuguesas”.  

O partido de Rui Rocha propõe tornar as carreiras militares “mais especializadas e mais atrativas” e “limpar a Defesa Nacional dos incompetentes boys&girls”. Ao mesmo tempo, a Iniciativa Liberal afasta o regresso do Serviço Militar Obrigatório, porque diz que tal seria um “conflito à liberdade individual de cada um” e não responderia às necessidades das forças armadas modernas, que precisam formar “militares qualificados, preparados e bem equipados”. “Recursos humanos são o melhor investimento”, insistem.

A IL sugere “lançar as bases” para “uma revolução tecnológica” nas formas armadas, fazendo da ciberdefesa uma das suas bandeiras, apostando na formação e no reforço das “capacidades reais de ciberdefesa”. Os liberais querem utilizar a indústria militar para potenciar a economia nacional, captando investimento privado e garantindo “independência política” à idD Portugal Defence para que se torne “uma verdadeira plataforma de lançamento da base tecnológica e industrial”.

Bloco de Esquerda

As posições do Bloco de Esquerda para a Defesa são reduzidas em número e é preciso mesmo ir à penúltima das 275 páginas do seu programa eleitoral para perceber o que o partido pensa sobre esta área de soberania. O partido liderado por Mariana Mortágua propõe um fim negociado da invasão russa à Ucrânia “em alternativa à escalada armamentista”. Ao mesmo tempo, o partido propõe a saída de Portugal da NATO e “defesa do desarmamento negociado e multilateral”.

Além disso, o Bloco de Esquerda quer a conversão da Base das Lajes num aeroporto plenamente civil, “exigindo aos EUA as indemnizações devidas pelos danos ambientais e sociais causados”.

PAN

No seu programa eleitoral para as eleições legislativas de 2024, o PAN delineou aquelas que, para si, são as principais prioridades para área da Defesa, numa altura em que começa o terceiro ano de guerra na Ucrânia. O partido de Inês de Sousa Real, que se define como defensor dos direitos humanos, dos animais e da natureza, estabelece como prioridade a “fixação de metas anuais de redução de emissões de gases de carbono e uma meta para atingir a neutralidade carbónica da defesa nacional e das infraestruturas militares”.

O partido quer também que seja feito o mapeamento dos riscos e ameaças à resiliência das infraestruturas militares existentes no momento da elaboração da estratégia e projetadas para o futuro, devido a alterações climáticas e a eventos climáticos extremos, bem como a supressão da “complexidade e morosidade” de produtos de apoio a pessoas deficientes nas Forças Armadas.

Partido Comunista Português

Os comunistas querem sobrepor as exigências nacionais aos compromissos assumidos internacionalmente. Para isso, insistem que Portugal precisa de uma política de Defesa Nacional e de umas Forças Armadas orientadas para o objectivo principal do cumprimento da sua missão constitucional.

No seu programa, o Partido Comunista Português critica as “opções erradas” do PS de colaborar e apoiar “a criminosa e belicista política dos EUA, EU e da NATO” na guerra da Ucrânia.

O PCP quer também aprofundar a articulação entre o investimento em material e a dinamização do sector público das indústrias de defesa, “invertendo o seu processo de estrangulamento e de gestão desastrosa”. Além disso, defende que as tabelas salariais e o regime de incentivos devem ser revistos, de forma a garantir carreiras atrativas.

Livre

O Livre, de Rui Tavares, defende o apoio à Ucrânia na defesa contra a invasão russa, considerando a ação russa como “ilegítima e ilegal”. Nesse sentido, o partido quer prosseguir a condenação pública à agressão russa, promovendo a política de sanções da UE e apoiando todas as diligências da justiça internacional. No entanto, defendem que é necessário o resumo de negociações que levem à resolução do conflito e à retirada das tropas russas da Ucrânia.

O partido de Rui Tavares parece ir ao encontro da estratégia europeia, “promovendo a unidade da UE na política externa e desenvolvendo a sua autonomia estratégica ao nível das relações internacionais”, incluindo na área da defesa e segurança.

Para isso, defende que é necessária uma “mudança progressiva da arquitectura de segurança” na Europa para “uma autonomia estratégica ao serviço das e dos cidadãos europeus”, que fomente a interoperabilidade entre forças armadas dos Estados-Membros em parcerias reforçadas sujeitas ao controlo democrático.

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