Tribunal Arbitral obrigou o Estado a compensar os CTT pela prorrogação unilateral do contrato de concessão em 2021 e pelo impacto da pandemia. Governo recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo
O Governo está a contestar no Supremo Tribunal Administrativo (STA) a decisão do Tribunal Arbitral que determina que o Estado tem de pagar 16,8 milhões de euros aos CTT pela “prorrogação unilateral” do contrato de concessão em 2021, mais 6,8 milhões pelo impacto da pandemia, disse ao ECO fonte governamental. Ao montante, de 23,6 milhões de euros no total, acrescem juros de mora a pagar pelo Estado em caso de decisão favorável aos CTT.
As negociações e posterior renovação, já em 2022, do contrato de concessão do serviço postal regressaram à atualidade por causa da decisão do Governo de avançar, em 2021, para a compra de uma participação acionista nos CTT de até 13%, através da Parpública, que acabou por ficar limitada a 0,24%. O primeiro-ministro António Costa veio, depois, justificar a decisão com o facto de não haver um acordo entre o Estado e os CTT. Evitar que “o Estado estivesse numa situação negocial em que pudesse estar contra a parede, sem nenhuma alternativa”, caso o contrato de de concessão do serviço postal universal não fosse renovado, justificou Costa esta quinta-feira. Mas a decisão de prorrogação unilateral do contrato em 2021 tem, para já, um impacto financeiro de 16,8 milhões.
Em causa está um processo que surgiu no tempo em que Pedro Nuno Santos, atual líder do PS e candidato a primeiro-ministro nas próximas eleições, era ministro das Infraestruturas e tinha a tutela da área postal. Atualmente, com o Governo em gestão e com António Costa a assumir a pasta das Infraestruturas, na sequência da demissão de João Galamba, a tutela das comunicações está com o secretário de Estado da Digitalização e da Modernização Administrativa, Mário Campolargo.
Em outubro, os CTT anunciaram ao mercado que o Tribunal Arbitral constituído para dirimir este litígio decidiu, “por unanimidade, que a prorrogação perturbou o equilíbrio financeiro do contrato de concessão (em desfavor dos CTT)”. “Como tal, condenou o Estado na reposição desse equilíbrio, relativo ao ano de 2021, mediante o pagamento” de quase 16,8 milhões de euros, confirmou, à data, a empresa em comunicado oficial.
Esse não era, porém, o único litígio entre os CTT e o Estado. Os Correios exigiam também serem compensados pelo impacto da pandemia no serviço postal universal. Assim, também “por unanimidade”, foi decidido que o Estado tem de compensar os CTT em 6,8 milhões de euros para “cobrir os ‘prejuízos efetivamente sofridos pelos CTT’ no ano de 2020, por entender que a pandemia configura uma alteração anormal de circunstâncias que teve impacto negativo na execução do contrato de concessão”, anunciaram também os Correios na mesma ocasião.
Juros estão a contar
Tudo somado, são 23,6 milhões de euros que o Estado foi obrigado a pagar aos CTT, a que acrescem ainda “juros de mora, cujo montante será apurado pelo Tribunal Arbitral, na sequência de pronúncia das partes”, acrescentava o comunicado da empresa datado de 1 de outubro de 2023.
Esse montante, no entanto, ainda não foi pago, apurou o ECO. Do lado do Governo, o dossiê ainda não está encerrado, depositando-se a última esperança numa decisão favorável do STA, enquanto os CTT acreditam que o Administrativo vai manter uma decisão do Arbitral que foi tomada por unanimidade.
Contactada, fonte oficial da tutela não respondeu sobre o recurso para o STA e os CTT também não fizeram comentários às perguntas do ECO até à hora de publicação deste artigo. Mas o ECO sabe que o Governo invocou o Artigo 185.º-A do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), introduzido em 2019, que lhe permite “recorrer” para o STA no que aos dois processos diz respeito.
Governo quis harmonizar concessão dos CTT com outros contratos
O contrato de concessão do serviço postal universal aos CTT estava em vias de terminar no final de 2020 quando foi conhecida a decisão do Conselho de Ministros de o prorrogar até setembro de 2021, depois de o surgimento da pandemia ter atrasado a conclusão das negociações com a empresa liderada por João Bento. Mas o Executivo decidiu, depois, estender ainda mais a concessão, até ao final de 2021, para garantir a “harmonização do prazo de prorrogação do contrato de concessão entre o Estado e os CTT com outros contratos de concessão que também findavam a 31 de dezembro de 2020″, explicou fonte oficial do gabinete de Pedro Nuno Santos na altura.
“Os CTT reservam-se o direito de mobilizar todas as iniciativas de natureza económica e legal que venham a entender como adequadas para a defesa dos seus direitos e de um contrato de concessão equilibrado e sustentável”, reagiu a empresa postal no rescaldo da prorrogação, no último comunicado ao mercado do ano de 2020, divulgado a 31 de dezembro.
Poucos meses depois, em março, os CTT vieram dar conta de que tinham iniciado os procedimentos para exigirem compensações ao Estado, não só pela prorrogação que dizem ser “unilateral”, como pelos impactos da pandemia no negócio do serviço postal universal, que, como a empresa sempre recorda, é financiado pelos próprios clientes e não pelo Orçamento do Estado (e, por isso, tem de ser financeiramente sustentável, argumenta). Os CTT admitiam uma compensação através de um pagamento total em dinheiro ou parte dela por um aumento dos preços do correio, o que acabou por não ser o caso.
Só em outubro de 2023 é que a empresa deu conhecimento de que a decisão do Tribunal Arbitral tinha sido tomada, a 27 de setembro desse ano. E, com a notícia, sabe-se agora que o Governo ainda não se deu por vencido.