Pouco importa o novo porta-aviões da China, estes são os navios com que os EUA se devem preocupar

CNN , Análise de Brad Lendon
2 jul 2022, 22:00
O terceiro porta-aviões da China, o Fujian (Getty Images)

A China fez uma forte demonstração das suas ambições navais com o recente lançamento do seu terceiro e mais avançado porta-aviões.

O Fujian, - de longe o maior, mais moderno e mais poderoso porta-aviões da China até ao momento - com as suas 80.000 toneladas, é a joia da coroa de uma expansão militar que tem levado Pequim a fazer crescer a sua marinha para se tornar a maior do mundo.

Os seus novos sistemas de combate - como um sistema de lançamento eletromagnético assistido por catapulta - revelam que a China está rapidamente a recuperar o atraso face os Estados Unidos, segundo os especialistas, e irão conferir-lhe a capacidade de lançar mais aeronaves, de forma mais rápida e com mais munições.

Isso deverá ser suficiente para levar qualquer possível oponente a fazer uma pausa para refletir, especialmente dada a crescente hostilidade da China nas suas disputas territoriais com o Japão no Mar da China Oriental e com uma série de nações do Sudeste Asiático no Mar da China Meridional, e o assédio constante da ilha autónoma de Taiwan - onde uma invasão não está posta de lado.

O terceiro porta-aviões da China, o Fujian, no Estaleiro de Jiangnan em 17 de junho.

 

Apesar do grande alarde no lançamento do Fujian ter sido claramente uma mensagem para os rivais de Pequim, os analistas advertem para não nos deixarmos enredar demasiado cedo na propaganda.

Em primeiro lugar, o Fujian provavelmente só estará operacional daqui a três a quatro anos, disse Carl Schuster, ex-capitão da Marinha dos EUA e ex-diretor de operações do Centro de Inteligência Conjunta do Comando do Pacífico dos EUA. E mesmo quando estiver operacional, o seu tamanho fará de si um alvo óbvio - qualquer inimigo terá a perfeita noção de que afundar um navio tão emblemático como este será um duro golpe no moral da China, assim como um desastre militar.

A cerimónia de lançamento do terceiro porta-aviões da China, o Fujian, no Estaleiro de Jiangnan, em Xangai, em 17 de junho.

 

Em segundo lugar, temos o simples facto de, por muito impressionantes que sejam, os porta-aviões serem pouco adequados aos cenários de conflito que os especialistas veem como os mais plausíveis no futuro próximo - incluindo os confrontos nos Mares da China Oriental e Meridional e uma invasão de Taiwan.

No fundo, e de acordo com os especialistas, o Fujian pode ser o maior navio da China, mas provavelmente não é atualmente o maior problema na mente dos comandantes navais dos EUA.

Eis quatro tipos de navios à disposição da China que, indiscutivelmente, representam uma ameaça muito maior ao domínio naval dos EUA.

O contratorpedeiro Nanchang de mísseis teleguiados do tipo 055 da China no Pacífico Ocidental, em 19 de outubro de 2021.

 

Contratorpedeiro tipo 055

Estes contratorpedeiros furtivos de 13 000 toneladas com mísseis teleguiados, lançados em 2017, são considerados por muitos os mais poderosos combatentes à superfície do mundo.

O Tipo 055, suficientemente grande para ser considerado um cruzador de acordo com os padrões da NATO, está equipado com 112 tubos de lançamento verticais que podem ser usados para disparar tudo, desde mísseis antinavio a mísseis de ataque terrestre de longo alcance.

“Este navio, em particular, tem um design sofisticado, características de furtividade, radares e um vasto inventário de mísseis. É maior e mais poderoso do que a maioria dos contratorpedeiros americanos, japoneses e sul-coreanos”, disse o analista sénior da RAND Corp., Timothy Heath, à CNN em 2018, numa altura em que Pequim lançou dois navios de guerra num único dia - prova das impressionantes capacidades de construção naval da China.

Um relatório do Serviço de Investigação do Congresso dos EUA em março revelou que pelo menos 10 navios Tipo 055 terão sido lançados ou estão em construção.

A mobilização do Lhasa, o segundo dos cinco Tipo 055 chineses em atividade, para exercícios no Mar do Japão perante um cenário de crescente tensão em relação a Taiwan, foi defendida pelo tabloide Global Times, controlado pelo estado chinês, na semana passada.

“O navio atingiu plena capacidade operacional e demonstrou a sua capacidade de dissuadir possíveis interferências militares estrangeiras no Estreito de Taiwan, numa altura em que os EUA e o Japão têm vindo a provocar repetidamente a China acerca da questão de Taiwan”, informou o Global Times.

A potência do Tipo 055 foi destacada em filmagens que surgiram nas redes sociais em abril. Estas mostravam o lançamento daquilo que o analista naval H. I. Sutton referiu ser um míssil balístico hipersónico antinavio YJ-21 - uma arma muitas vezes considerada como um “assassino de porta-aviões”.

O Global Times reproduziu as imagens, descrevendo os mísseis como parte da estratégia defensiva do país.

“Se os EUA não fizerem provocações militares contra a China, inclusive acerca da questão de Taiwan, não precisam de se preocupar com os mísseis.”

O porta-aviões chinês Liaoning é acompanhado por fragatas e submarinos da marinha durante um exercício no Mar da China Meridional.

 

Submarino Tipo 039 

Estes submarinos da classe Yuan são barcos quase silenciosos movidos a diesel e eletricidade com funcionalidades com as quais poderá ser difícil de lidar por parte dos estrategas militares dos EUA.

Pequim construiu 17 submarinos do Tipo 39A/B, com planos para aumentar o total para 25 nos próximos três anos, de acordo com o relatório de 2021 do Departamento de Defesa dos EUA apresentado ao Congresso relativamente ao poder militar da China.

“Os submarinos Tipo 039 oferecem uma formidável 'defesa em profundidade'“ em águas próximas da China, “e parecem estar a desenvolver capacidades para atacar” forças americanas a uma maior distância no mar, segundo Schuster.

Os submarinos estão equipados com propulsão independente de ar (PIA), o que significa que não têm de emergir com tanta frequência para obter o ar necessário para a combustão do diesel, o que pode alimentar as suas baterias.

“Ao funcionar com baterias, os submarinos equipados com PIA são quase silenciosos, com o único ruído a surgir dos rolamentos do eixo, da hélice e do fluxo em redor do casco”, escreveram os oficiais da Marinha dos EUA Michael Walker e Austin Krusz num relatório de 2018 para a revista Proceedings do Instituto Naval dos EUA.

Segundo o relatório do Departamento de Defesa, a China está a fazer pressão para lançar mais submarinos super-silenciosos armados com mísseis de cruzeiro antinavio.

Um método potente de ataque usado pelo Tipo 039 é o disparo de um torpedo teleguiado “wake-homing” através da popa ou proa de um navio-alvo. O torpedo segue o rasto do navio-alvo antes de explodir perto dos seus sistemas de propulsão e direção.

Uma vez que os navios de superfície detetam os submarinos e torpedos através de ondas sonoras, a defesa contra os torpedos “wake-homing” é particularmente difícil.

O progresso nos submarinos chineses surgem numa altura em que a Marinha dos EUA enfrenta problemas com as suas capacidades antissubmarinas.

O Almirante Michael Gilday, Chefe de Operações Navais, revelou ao Congresso no mês passado que a Marinha quer demolir nove dos seus navios de combate litoral, dos mais novos na frota dos EUA, porque os seus sistemas antissubmarino “tecnicamente não funcionam”.

Uma balsa mercante no porto de Yantai, na província de Shandong, na China.

Balsas mercantes

As balsas mercantes podem não ser a primeira coisa que vem à mente quando se pensa num recurso naval mortífero - mas é aí que reside o seu poder.

Para invadir Taiwan, a China teria provavelmente de transportar uma força invasora de centenas de milhares de homens - alguns analistas sugerem que seria necessário mais de um milhão.

Segundo vários analistas e relatórios do governo dos EUA, a frota naval do Exército de Libertação Popular (ELP) não está à altura desta missão.

Mas a China possui uma enorme frota de balsas civis que poderão ser rapidamente convertidas em navios militares - e de acordo com alguns analistas, podem ter sido projetadas precisamente com essa finalidade.

“O maior construtor naval de balsas da China declarou publicamente em 2015 que um dos seus maiores cargueiros com entrada e saída autónoma de veículos foi construído com fins militares e civis, e um dos maiores operadores de balsas da China foi também descrito como tendo uma filosofia de desenvolvimento dupla, civil e militar”, escreveu Thomas Shugart, um ex-comandante de submarinos da Marinha dos EUA e atual membro do Centro para uma Nova Segurança Americana, num ensaio de 2021 para a War on the Rocks.

Acrescentou ainda que as empresas civis de balsas que operam no Mar Amarelo e no Mar da China Meridional já estão organizadas para funcionarem como unidades auxiliares do ELP.

A análise dos números foi surpreendente, disse Shugart. Estima-se que o uso de navios civis daria à China uma movimentação extra na ordem das 1,1 milhões de toneladas. Esse número é três vezes superior à tonelagem de movimentação total de todos os navios de assalto anfíbios da China. E se a China usasse os cargueiros de entrada e saída autónoma de Hong Kong conseguiria mais 370 mil toneladas de transporte marítimo, de acordo com Shugart.

Será suficiente para tomar Taiwan à força?

É difícil de saber. Mas Shugart disse que isso permitia responder a uma pergunta.

“Quantos navios de transporte é que as forças armadas chinesas têm? Muito provavelmente, mais do que se imagina.”

Navios chineses atracados no Recife de Whitsun no Mar da China Meridional em 2021.

 

Milícia marítima

As balsas não são as únicas embarcações supostamente civis que os estrategas militares têm nos seus radares.

Alguns especialistas também acusam a China de ter criado uma milícia marítima composta por mais de uma centena de navios, supostamente envolvidos em pesca comercial, para fazer valer os seus interesses em mares disputados.

A milícia - que Pequim nega existir - é composta por um mínimo de 122 navios e um máximo provável de 174, de acordo com o Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais.

Mas o número real pode ser ainda maior. Quando mais de 200 barcos de pesca chineses se aglomeraram à volta do Recife de Whitsun no Mar da China Meridional no início de 2021, vários especialistas suspeitaram do envolvimento da milícia. O recife é reivindicado tanto pela China como pelas Filipinas, que descreveram a presença dos barcos como uma “clara ação provocatória“.

“A Milícia Marítima das Forças Armadas Populares não pesca”, disse Schuster à CNN no ano passado. “Eles têm armas automáticas a bordo e cascos reforçados, tornando-os muito perigosos em curtas distâncias. Para além disso, têm uma velocidade máxima de cerca de 18-22 nós, ou seja, são mais rápidos do que 90% dos barcos de pesca do mundo.”

A milícia é composta por dois componentes principais: barcos profissionais de milícia e barcos de pesca usados pelos militares chineses num regime de subvenção, de acordo com um relatório de novembro da Iniciativa para a Transparência Marítima na Ásia do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais (CSIS).

Os navios profissionais levam a cabo atividades como perseguir navios de perfuração estrangeiros ou bloquear barcos de pesca estrangeiros, com o elevado número de barcos de pesca subsidiados a funcionar como agente de pressão, segundo o relatório do CSIS.

E com a maior frota pesqueira do mundo, a China tem muitos reservistas a quem recorrer.

Ainda sobre aquele porta-aviões

Ainda assim, nada disto significa que o lançamento do Fujian não seja um momento importante.

Tal como nos EUA, os porta-aviões irão, com o tempo, tornar-se a peça central da marinha do ELP - e um símbolo daquilo que as forças armadas modernas chinesas são capazes de fazer, disse Schuster.

“O lançamento do Fujian deve ser avaliado por aquilo que anuncia e não pelo seu impacto imediato limitado”, disse Schuster.

“A China já lançou três porta-aviões e colocou dois em plenas condições operacionais durante um período em que a Marinha dos EUA tem revelado problemas em colocar uma nova unidade em plenas condições operacionais “, disse.

Schuster estava a referir-se ao USS Gerald Ford, um super-porta-aviões que tem sido assolado por problemas desde o seu comissionamento em 2017 (quando já estava três anos atrasado).

O super-porta-aviões ainda aguarda a sua primeira mobilização operacional, algo que está previsto para o próximo outono.

Enquanto isso, a China avança.

“Eles estão a desenvolver a sua marinha a um ritmo mais rápido do que os EUA e todos os seus aliados”, disse Schuster.

“Imperfeita, mas com bons alicerces.”

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