"Em todas as lutas e guerras, os artistas arranjaram formas de colaborar". Venha ver os artistas a trabalhar, venha pensar o mundo

11 nov 2023, 12:00
Abstract (Cão Solteiro e Vasco Araújo)

“Abstract” está em cena no São Luiz Teatro Municipal, em Lisboa, até sábado

“Abstract” é a sétima colaboração entre a companhia Cão Solteiro e o artista plástico Vasco Araújo. O tempo tem esse poder de aprofundar relações, afinidades e interesses comuns. E eles sabem bem o que, enquanto coletivo, lhes interessa na hora de subir a um palco: “testar os limites do trabalho artístico e a própria resistência do espectador”.

O processo de criação desmonta-se em frente do olhar do público. Aquele lugar inacessível do ateliê ou da sala de ensaios - e que, por isso mesmo, gera muita curiosidade ou ideias pré-concebidas - está ali mesmo. Os artistas estão a trabalhar à nossa frente.

“Se pudesse definir sobre que é o espetáculo, é sobre o processo artístico. O que estamos a fazer, literalmente, é a trabalhar. Até para contrariar a ideia de que os artistas não trabalham”, resume Vasco Araújo.

“Acreditamos que a arte é política. E estamos a refletir sobre o modo como cada sociedade vê os seus artistas, os valoriza ou desvaloriza. Para mostrar que é uma atividade contínua, de enorme esforço”, completa Mariana Sá Nogueira.

O esforço de pensar, tantas vezes posto em segundo plano com a correria do dia-a-dia. E o esforço de pensar para lá dos compartimentos em que se procura encaixar a arte. Não há um espaço próprio para cada uma. As artes plásticas não são apenas uma coisa de museu ou galeria. “Aproveitamos para desmontar alguns clichés tanto do teatro como das artes plásticas”, confirma Mariana.

“Abstract”, assim se chama, porque se procura levar o espectador para uma “zona obscura” que não é de arte, para um território que “não está definido”. Mas não para nos abstrairmos do que se passa lá fora, no mundo, à nossa volta.

“Não abordamos a cena como ficção ou fantasia. Não queremos fantasia. O que está em cena é real, ainda que, de algum modo, utópico”, descreve Mariana Sá Nogueira.

A arte que lhes interessa, dizem os criadores, está sempre “contaminada” com as coisas de todos os dias. É, aliás, “fundamental para essa reflexão sobre o estado do mundo”. Vasco Araújo acaba por referir a palavra que marca agora o quotidiano: guerra. Ela muda tudo, incluindo a produção artística.

“Historicamente, quando existiram guerras, os artistas sempre arranjaram forma de colaborar. Em todas as lutas, como as raciais, por exemplo, foram criados cartazes feitos por artistas. A arte não se desvincula do que se passa no mundo. A arte é reflexão sobre o que se passa no mundo”, argumenta.

“Abstract” vai cumprir esse papel ao convocar os espectadores para se colocarem no “lugar do outro”, ao sentarem-se na plateia para ver os artistas a trabalhar. Sem encenador, sem um texto no centro do trabalho. O trabalho que nunca se executa da mesma maneira, por mais repetitivo que ele seja.

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