Foi você que tirou a bola a este senhor no recreio da escola?

31 out 2018, 10:44
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Quatro meses.

O Real Madrid teve mais de sessenta dias para avaliar, pensar, refletir, pensar novamente e escolher o treinador certo para o projeto da equipa principal. Depois de ter feito tudo isso, acredita-se, optou por Julen Lopetegui e não perdeu tempo em segurá-lo: assinou até poucos dias antes do início de um Mundial. O que colocou em cheque o carácter do treinador e agitou a seleção espanhola.

No fim de contas, o resultado de tanta avaliação, pensamento, reflexão e mais pensamento, durou quatro meses. Um dos quais nem sequer teve competição.

Bastaram pouco mais de noventa dias para o Real Madrid rasgar um acordo que devia ter sido feito em consciência. Com ponderação, equilíbrio e sensatez.

Num comunicado que lava as mãos e tapa os olhos, Florentino Perez pôs aquela cara do não olhem para mim, só estava a passar por aqui, eu nem sequer sou o responsável por isto e tão pouco estou de acordo, mas sou uma pessoa educada e não posso permitir esta traição.

Pôs enfim uma cara de anjo e vestiu um par de asas.

A verdade é que a esmagadora maioria dos dirigentes de futebol parece ter sido excluída dos jogos quando era criança e tenta recuperar o tempo perdido em adulto. Não é bem uma vingança, é um acerto de contas com algum tipo de caso mal resolvido na personalidade.

Comportam-se, enfim, como se estivessem no recreio da escola e desta vez fossem eles a mandar.

Põem e dispõem, mandam entrar e sair, proíbem, castigam, promovem e despromovem, contratam e dispensam. Sem um critério, sem uma ideia, sem um fundamento.

No fundo para nós, simples mortais que tivemos uma infância normal, que brincámos ao pisa o pé e à macaca, à apanhada e ao bota fora, que jogámos à bola até ser hora de jantar, dirigir um clube devia ser uma coisa feita com método e preceito, seguindo princípios bem definidos e um conceito superior de caminho para o sucesso. Uma coisa séria, portanto, que não se regesse por impulsos.

O Real Madrid acabou de nos mostrar que muitas vezes não é assim.

Mas quem fala em Real Madrid pode falar de qualquer outro clube. Em Portugal, por exemplo, as chicotadas psicológicas tornaram-se rotineiras, por vezes um clube tem até três treinadores numa época. Neste preciso momento, aliás, José Peseiro já foi despedido.

Um dia qualquer haverá mais um treinador demitido e um dirigente a lavar as mãos.

Como se também ele não fosse culpado, como se também ele não tivesse falhado, como se também ele não fosse responsável pelo fracasso que a equipa poderá estar a viver.

Gil y Gil dizia que, para ele, despedir um treinador era como beber uma cerveja. «Posso despedir vinte. Posso até despedir cem treinadores, se for preciso.»

O que no fundo é lapidar. É assim que funciona um dirigente num país latino.

Sem um critério, sem um desígnio, sem um projeto. Será assim tão difícil fazer as coisas bem feitas?

Quatro meses, meus senhores...

«Box-to-box» é um espaço de opinião da autoria de Sérgio Pereira, editor do Maisfutebol, que escreve aqui às terças-feiras de quinze em quinze dias.

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