BCE sem pressa para baixar taxas de juro

ECO - Parceiro CNN Portugal , Nuno Carregueiro
25 jan, 07:56
Lagarde (AP)

O BCE deverá continuar a protelar os sinais de redução iminente dos juros. O ritmo de descida da inflação e da atividade económica vai ditar se o primeiro corte surge em abril, junho, ou só depois

O Conselho do Banco Central Europeu (BCE) vai anunciar esta quinta-feira a terceira manutenção consecutiva nas taxas de juro da Zona Euro, aguardando por indicações mais seguras de que a inflação está a caminho dos 2% antes de aliviar a política monetária. Apesar de a economia estar provavelmente em recessão e a trajetória descendente dos preços ser evidente, o banco central deverá continuar a afastar cortes de juros no curto prazo.

O PIB da Zona Euro contraiu 0,1% no terceiro trimestre e, na próxima terça-feira (30 de janeiro), o Eurostat deverá anunciar uma nova evolução negativa no quarto trimestre, validando uma recessão técnica na Zona Euro. Apesar desta evolução, os últimos indicadores sugerem que a atividade económica já bateu no fundo e a recessão será ligeira e de curta duração.

Depois de sete meses em queda, a inflação da Zona Euro aumentou em dezembro para 2,9%, evidenciando que o alívio dos preços terá percalços pelo caminho. Contudo, este agravamento ficou a dever-se sobretudo a efeitos de base e a inflação subjacente (exclui alimentos e energia) manteve a trajetória descendente. Recuou duas décimas para 3,4%, o que representa um mínimo desde março de 2022 e já distante do pico de 5,7% fixado em março do ano passado.

 

Apesar de reconhecer estes desenvolvimentos favoráveis, os responsáveis do BCE têm carregado na mensagem de que é precipitado discutir corte de juros. Esta narrativa foi evidente na reunião do Fórum Económico Mundial que decorreu na semana passada em Davos, onde Christine Lagarde e os seus colegas do Conselho do BCE afastaram as perspetivas agressivas dos investidores para a evolução da política monetária em 2024.

Na reunião desta quinta-feira, o BCE vai assim manter a taxa dos depósitos em 4%, o nível mais elevado de sempre após dez aumentos ao longo de 15 meses, num total de 450 pontos base (4,5 pontos percentuais). As taxas de juro aplicáveis às operações de refinanciamento (4,5%) e de cedência de liquidez (4,75%) também vão ficar estáveis.

É também altamente expectável que o BCE não efetue alterações significativas ao seu discurso, reiterando que o combate à inflação elevada ainda não terminou e será necessário manter os juros em níveis restritivos por mais tempo para garantir a manutenção das expectativas para a evolução da inflação com tendência descendente.

Primeiro corte em junho?

A questão está agora em saber quando vai o BCE iniciar o ciclo de descidas de juros. Apesar da autoridade monetária mostrar que não tem pressa em dar (ou sinalizar) o tiro de partida, o discurso dos responsáveis do banco central evoluiu para que tal possa acontecer no verão. Lagarde classificou este cenário como provável e não foi descartado por Joachim Nagel, o presidente do banco central alemão que é o rosto principal da ala dura do Conselho do BCE. Ambos reconheceram que já não serão necessárias mais subidas de juros, o que não era dado como certo no final de 2023.

6 de junho começa a surgir como a data mais consensual para o primeiro corte de juros. Na reunião de 7 de março o BCE vai atualizar as projeções económicas, que podem abrir caminho para uma discussão efetiva sobre corte de juros. Mas na reunião de 11 de abril o banco central ainda não terá na sua posse os dados das atualizações salariais do primeiro trimestre.

Este calendário foi vincado recentemente pelo economista-chefe do BCE, Philip Lane. Em junho também já serão conhecidas as leituras de cinco meses de inflação, pelo que o BCE terá uma visibilidade mais clara sobre se a evolução dos preços continua a ser uma ameaça.

Assumimos que o BCE vai continuar a ser surpreendido pelo sentido negativo da atividade económica e da inflação, pelo que esperamos que o BCE corte os juros rapidamente para evitar o efeito de um aperto excessivo da política monetária

Economistas do Deutsche Bank

Quatro descidas em 2024?

Os discursos recentes dos responsáveis do BCE levaram os investidores a deixar de contar com a primeira descida de juros em março, apontando agora para abril e um total de cinco/seis descidas em 2024. Os economistas têm uma visão mais contida. Segundo uma sondagem da Reuters, a maioria aponta ao segundo trimestre e quase metade (45%) a junho.

O inquérito da Bloomberg mostra conclusões semelhantes, com o consenso dos economistas a apontar para quatro cortes de juros este ano. Caso se confirme a primeira descida a 6 de junho, restam mais quatro reuniões em 2024, pelo que a um ritmo de 25 pontos base por reunião, há margem para uma descida acumulada de 125 pontos base este ano. Segundo a sondagem da Bloomberg, o BCE optará por uma pausa em julho, retomando o movimento descendente a partir de setembro.

Mesmo neste cenário de quatro cortes em 2024, a taxa dos depósitos fecha o ano em 3%, o que é considerado um nível que ainda restringe a atividade económica. Daí que muitos economistas considerem que é elevada a probabilidade de o BCE adotar um ritmo mais intenso, sobretudo se a economia continuar frágil.

O Deutsche Bank é dos mais agressivos nas expectativas, aguardando uma redução acumulada de 150 pontos base em 2024, com o primeiro corte de 50 pontos base a surgir já em abril. “Assumimos que o BCE vai continuar a ser surpreendido pelo sentido negativo da atividade económica e da inflação, pelo que esperamos que o BCE corte os juros rapidamente para evitar o efeito de um aperto excessivo da política monetária”, explicam os economistas do banco alemão. Mesmo que o banco central opte por reagir mais tarde, não significa que a dimensão dos cortes seja menor, assinalam.

A Capital Economics estima que o BCE vai começar a reduzir os juros no segundo trimestre, apontando a abril, mas admitindo que é mais provável que só surja em junho tendo em conta que os “responsáveis do banco central insistem que necessitam primeiro de avaliar a evolução do crescimento dos salários antes de aliviarem a política monetária”.

O ING salienta que o “Conselho do BCE não está tão obcecado com as perspetivas agressivas dos mercados como muito pensam, pelo que prefere manter uma postura totalmente dependente da evolução dos dados, em vez de concentrar esforços a combater a ideia de que os juros vão descer rapidamente”. Desta forma, os economistas do banco dos Países Baixos não esperam alterações significativas no discurso do BCE na reunião desta quinta-feira.

O Goldman Sachs também aguarda que o BCE reitere a mensagem oficial de que as taxas de juro “vão continuar num nível restritivo pelo tempo que for necessário”, ao mesmo tempo que enaltece os desenvolvimentos positivos no rumo da inflação. Espera que o BCE repita que antes de ser apropriado normalizar a política monetária, são necessários mais dados para validar que a inflação está a baixar a um ritmo sustentável rumo à meta dos 2%.

Ao estimar que inflação subjacente continue a recuar, o Goldman Sachs acredita que esta narrativa vai mudar nos próximos meses, pelo que permanece confortável com a previsão de o primeiro corte de juros surgir em abril, com reduções posteriores de 25 pontos base em cada uma das reuniões seguintes, até a taxa dos depósitos atingir 2,25% no início de 2025.

O BCE vai comunicar a sua decisão de política monetária às 13:15 (hora de Lisboa) e Christine Lagarde dá a habitual conferência de imprensa 30 minutos depois.

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