Ele está a liderar o maior negócio bancário da história. Fracassar não é opção

CNN , Hanna Ziady
13 nov 2023, 18:19
Sergio Ermotti UBS Getty Images

Banqueiro é tão conhecido na Suíça como Roger Federer. A pressão sobre Ermotti tal que é frequentemente abordado por desconhecidos para lhe desejarem boa sorte, lhe agradecerem - ou para se pronunciarem sobre a fusão entre o UBS e a o Credit Suisse.

Genebra, Suíça (CNN) - Na manhã seguinte ao anúncio bombástico, em março, de que a UBS ia comprar o seu rival Credit Suisse, que estava a falir, para evitar uma crise bancária global, Sergio Ermotti viu um nome surpreendente aparecer no seu telefone.

O interlocutor era o "chairman" do UBS, Colm Kelleher. Ermotti tinha deixado o banco apenas três anos antes e era, na altura, presidente de uma companhia de seguros suíça.

"Não estava mesmo nada à espera do telefonema", disse Ermotti à CNN, à margem de uma conferência em Genebra, no mês passado. "Quando ele me telefonou e disse que nos devíamos ver... percebi que devia ser algo muito sério".

O UBS queria Ermotti de volta como CEO para dirigir a aquisição de emergência do Credit Suisse - um negócio que o seu antigo empregador tinha concordado relutantemente a mando das autoridades suíças, apesar da forte oposição de alguns accionistas e deputados locais.

Ermotti concordou em regressar, inscrevendo-se num empreendimento de alto risco sem precedentes históricos: combinar dois bancos ditos de importância sistémica global. Uma lista de apenas 30 credores inclui o Bank of America, o JPMorgan e o HSBC, e denota bancos cuja falência poderia despoletar uma crise financeira mundial.

Se a fusão não for bem sucedida, a confiança no UBS pode ser afetada, o que tem o potencial de desencadear instabilidade no sistema financeiro em geral, disse Anke Reingen, analista bancário da RBC Capital Markets.

Há várias razões para a dificuldade de execução, disse ela à CNN, desde a migração de sistemas de Tecnologias de Informação e diferenças culturais entre os dois bancos até o perigo de que a integração absorva muito do foco da administração em detrimento do crescimento do negócio. Ainda assim, a perspetiva de Reingen sobre o negócio é positiva e o RBC espera que o UBS apresente melhores resultados do que os seus pares.

Os investidores estão igualmente optimistas, tendo as acções subido quase 30% desde que o negócio foi anunciado.

Independentemente dos seus méritos, no entanto, a fusão causou controvérsia na Suíça, onde o Credit Suisse teve uma longa e ilustre história até que uma série de escândalos e perdas afastaram clientes e investidores. Há muita coisa em jogo para o país, que agora tem um banco com activos duas vezes superiores à sua produção económica anual.

A pressão sobre Ermotti para que seja bem sucedido é tal que, na Suíça, é frequentemente abordado por desconhecidos para lhe desejarem boa sorte, lhe agradecerem - ou para se pronunciarem sobre a fusão.

Se o negócio correr mal, não só manchará a carreira de Ermotti nas finanças, como também significará um fracasso pessoal muito público. O banqueiro que costuma falar curto e grosso é tão conhecido na Suíça como o grande tenista Roger Federer, e talvez agora seja alvo de ainda mais atenção.

O negócio de uma vida

Ermotti demorou um ou dois dias a refletir sobre a possibilidade de assumir uma responsabilidade tão pesada. O sentido de dever para com a Suíça e a lealdade para com o banco foram factores determinantes para a sua decisão de regressar. Mas também a sua veia competitiva e a oportunidade de realizar um negócio que ele tinha em vista há muito tempo, durante o seu primeiro mandato como diretor executivo do banco.

"Sempre senti que o próximo capítulo que queria escrever na altura era o de fazer uma transação como esta", disse Ermotti na conferência de imprensa que anunciou o seu regresso. "Seria um pouco contraditório da minha parte não aceitar o cargo (...) para basicamente executar o que eu acreditava ser o próximo passo certo para o UBS."

O apelo é compreensível. O negócio transformou o UBS, de um dia para o outro, na segunda maior gestora de patrimónios do mundo - atrás apenas do Morgan Stanley - entregando, segundo Ermotti, sete anos de dinheiro novo de clientes de uma só vez.

Em alguns aspectos, foi uma pechincha. O UBS pagou menos 60% do que o valor das acções do Credit Suisse, pouco antes da sua última tentativa de salvamento durante um fim de semana.

Mas há condições. O UBS está a assumir um banco que Ermotti descreveu recentemente como "estruturalmente deficitário". Além disso, tem uma montanha de processos judiciais pendentes, na sequência de anos de escândalos e falhas de conformidade. Em setembro, o UBS tinha reservado mais de quatro mil milhões de dólares (3,74 mil milhões de euros) para litígios e questões regulamentares - 50% mais do que o montante reservado na mesma altura do ano passado.

Mesmo que o Credit Suisse não tivesse nenhuma dessas dificuldades, a dimensão dos dois bancos faz com que a fusão seja uma tarefa enorme.

"Não posso enfatizar (o suficiente) o quão grande é este negócio em termos de história financeira e engenharia financeira que é necessária", disse Kelleher, o presidente do UBS, em março. "Há um enorme risco na integração destas empresas".

As sedes do UBS e do Credit Suisse em Zurique, o centro financeiro da Suíça, não poderiam estar mais próximas. Michael Buholzer/EPA-EFE/Shutterstock

Se há alguém capaz de o fazer, é Ermotti, afirmam vários ex-colegas. Em conversas com a CNN, descreveram um líder confiante com um intelecto formidável, muitas vezes guiado por uma intuição aguçada que o ajuda a tomar as decisões correctas.

"O que realmente o distingue é a clareza com que lidera", disse Katrin Koch, que foi chefe de gabinete de Ermotti durante o seu primeiro mandato no UBS. Ermotti não se coíbe de tomar decisões difíceis e assume toda a responsabilidade pelos seus actos, acrescentou. Ele "não dá desculpas... acho que isso é raro hoje em dia".

Igualmente valiosa para o trabalho em causa é a sua capacidade de inspirar os outros a enfrentar tarefas difíceis. Ermotti é "capaz de fazer sobressair o que há de melhor nas pessoas", segundo Tom Naratil, que foi diretor financeiro da UBS durante o anterior mandato de Ermotti.

"Se tivéssemos de escrever a descrição do cargo, só apareceria uma pessoa... Ele é a pessoa perfeita para esse cargo", disse à CNN.

Um percurso pouco convencional

Ermotti decidiu enveredar por uma carreira no sector financeiro desde muito cedo. Deixou a escola aos 15 anos com o sonho de se tornar um jogador de futebol profissional e começou um estágio num banco na sua cidade natal, Lugano, na parte italiana da Suíça.

A ideia era ganhar alguma experiência de trabalho enquanto estudava para se tornar professor de desporto - o seu "plano B" caso o sonho do futebol não desse certo. Mas, uma vez no banco, Ermotti interessou-se rapidamente pelos mercados financeiros.

"Decidi que o meu plano B já não era ser professor de desporto... o plano B era ser trader", disse à CNN. "Não era suficientemente bom para ser jogador de futebol, por isso optei pelo plano B".

Do Cornèr Banca, em Lugano, onde acabou por passar mais de uma década, Ermotti passou para o Citi antes de entrar para o Merrill Lynch, aos 27 anos. Passou 16 anos no banco de investimento americano, incluindo como codiretor do seu negócio de acções globais, aperfeiçoando competências analíticas e de tomada de decisões críticas.

Mais tarde, essas competências viriam a revelar-se inestimáveis, tanto no banco italiano UniCredit, que ajudou a conduzir durante a crise financeira global como diretor executivo adjunto, como durante a sua primeira passagem pelo UBS - um período de nove anos que apresenta semelhanças notáveis com o que enfrenta agora.

Sergio Ermotti deixou a escola aos 15 anos com o sonho de se tornar um jogador de futebol profissional. Stefan Wermuth/Bloomberg/Getty Images

Na altura, tal como agora, a nomeação de Ermotti para o cargo máximo foi feita em cima da hora e no meio de uma crise. Estávamos em setembro de 2011 e Ermotti tinha-se juntado à cúpula do banco em Singapura para reuniões como diretor da divisão da Europa, Médio Oriente e África.

O UBS estava a esforçar-se por conter as consequências de uma perda de 2,3 mil milhões de dólares (2,15 mil milhões de euros) resultante de transacções não autorizadas por um funcionário, que tinha sido descoberta dias antes. No final dessa semana, o então diretor executivo Oswald Gruebel demitiu-se devido ao prejuízo e Ermotti substituiu-o - uma ascensão rápida para alguém que tinha entrado no banco apenas cinco meses antes.

Ermotti teve ainda menos tempo para se preparar para o que viria a seguir. Em novembro do mesmo ano, deveria enfrentar os accionistas em Nova Iorque, que o pressionariam sobre a estratégia do grupo, que continuava a debater-se com as perdas graves da crise de 2008.

Mesmo antes do escândalo das transacções desonestas, o UBS tinha decidido reduzir o tamanho do seu banco de investimento em resposta ao declínio das receitas de transacções e a uma regulamentação mais rigorosa após a crise. Em vez disso, iria concentrar-se no crescimento do seu braço mais lucrativo de gestão de património.

Ermotti estava muito concentrado nesse objetivo e estava preparado para tomar decisões impopulares e arriscadas para o alcançar - mesmo que isso significasse perder algumas receitas a curto prazo.

No início, os analistas e os accionistas mostraram-se cépticos em relação ao plano. "O que eles estão a tentar fazer nunca foi feito antes", disse Christopher Wheeler, na altura analista do Mediobanca, ao New York Times em outubro de 2011. "Querem encolher o banco de investimento por opção, o que significa desfazer as posições (de negociação) sem perdas e reduzir os seus livros, mantendo o moral do pessoal".

Uma enorme pressão

Na altura, a mudança, embora drástica, compensou e, no final dos nove anos de mandato de Ermotti, o UBS era um dos bancos mais rentáveis da Europa.

No entanto, na sua opinião, o seu maior feito veio muito depois de ter saído. "O facto de o UBS ter sido convidado a fazer parte da solução (para o Credit Suisse), foi o maior sucesso", disse Ermotti à CNN.

Como é que ele mede o sucesso desta vez? "Quando souber que os nossos colaboradores e os nossos clientes se orgulham de estar associados a nós, sei que, nesse caso, vamos ter sucesso".

 

A associação do UBS e do Credit Suisse causou polémica na Suíça e deixa o país exposto a um banco com activos duas vezes superiores ao seu PIB. Fabrice Coffrini/AFP/Getty Images

A pressão sobre Ermotti é imensa. Está entusiasmado com o desafio, mas reconhece que é "intenso". "Este é, sem dúvida, em toda a minha carreira, o momento mais exigente que já vivi, de longe", afirmou.

"Estamos a enfrentar uma enorme complexidade. A complexidade advém da integração, a complexidade advém do facto de termos de gerir o banco... servir os clientes".

E há a questão do que virá a seguir para o UBS, quando a tarefa de absorver o seu antigo rival estiver concluída, provavelmente no final de 2026. Sempre com um olho no horizonte, Ermotti já está a pensar no tipo de banco que quer que o UBS seja quando o seu trabalho principal estiver concluído. "Tem de ser um banco que não tenha acabado de concluir uma integração, (mas) um banco que já esteja a trabalhar no sentido do crescimento", afirmou.

"Podemos criar algo único. Esta geração pode fazer algo que ficará na história... não como um acontecimento, mas como uma base para o próximo capítulo do UBS."

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